Juiz Haywood (Spencer Tracy): a primeira infâmia abre caminho para todas as outras |
Há sempre uma desculpa ou atenuante qualquer para se
ultrapassar a fronteira entre a civilização e a barbárie, o justo e o injusto, o certo e o
errado, o digno e o indigno.
Então,
a regra de ouro foi expressa pelo velho juiz protagonizado por Spencer
Tracy, num filme memorável: Tribunal em Nuremberg
(d. Stanley Kramer, 1961).
Indagado sobre quando começou o
desvirtuamento da Justiça alemã sob o nazismo, ele responde: "Foi no
dia em que o primeiro juiz condenou o primeiro réu que ele sabia ser
inocente".
É imperativo para nós, os verdadeiros revolucionários, voltarmos a ser os que não
abrem o precedente dúbio, ao qual segue-se a banalização da dubiedade.
Por maior que seja o preço a pagar, cabe-nos personificar a
alternativa à geléia geral na qual conveniências amorais e imorais são
colocadas à frente dos princípios. Ou não haverá para o cidadão comum
nenhum símbolo visível de que outro mundo seja possível.
O PSOL pode agora abrir tal precedente, ao consentir que Clécio Luís, seu primeiro prefeito de capital, defenda posturas TOTALMENTE inaceitáveis (como a aceitação do financiamento de bancos e empreiteiras e as alianças indiscriminadas com reformistas) à luz dos valores socialistas e libertários aos quais aderiu até no nome. Com o agravante de já haver aceitado apoios repulsivos
para vencer a eleição --os quais, sabem-no os que não acreditam em Papai
Noel, certamente terão consequências nefastas na sua gestão.
Se
não reagir firmemente na defesa de sua identidade política, o PSOL
entrará no mesmo caminho sem volta que o PT começou a trilhar quando da
expulsão de Paulo de Tarso Venceslau, em 1998.
Ex-militante
do movimento universitário e antigo combatente da ALN, o economista
Venceslau foi a única voz no partido a protestar contra o PRIMEIRO
grande esquema de desvio de recursos públicos para financiamento
partidário, por meio de uma firma chamada CPEM - Consultoria para
Empresas e Municípios.
Tendo
sido secretário das finanças de duas prefeituras petistas no interior
paulista, em ambas ele resistira às pressões para contratar a CPEM ou
para pagar-lhe valores exorbitantes por serviços já prestados, acabando
por ser exonerado da última delas, a de São José dos Campos.
Depois
de dois anos de denúncias infrutíferas aos dirigentes máximos do PT,
Venceslau tornou público o favorecimento escuso à CEPM em entrevista ao Jornal da Tarde.
Como
resposta ao escândalo, o partido submeteu o assunto a Comissão de Ética
presidida por Hélio Bicudo, cuja salomônica decisão foi a de que
Venceslau deveria ser expulso por haver vazado um assunto interno para a
imprensa burguesa; idem o empresário Roberto Teixeira, da CPEM, por
pilotar um mais do que evidente (e evidenciado no relatório final da
Comissão) esquema de corrupção, bem ao estilo daquele que depois
celebrizaria Marcos Valério.
Luiz
Inácio Lula da Silva, que Venceslau aponta como responsável pela
montagem de tal esquema e maior beneficiário (graças ao dinheiro sujo, sua tendência teria mantido a supremacia no partido),
ameaçou sair do PT juntamente com Teixeira --que, além de tudo, era seu
compadre e lhe fornecia um apartamento de cobertura para morar de graça.
A direção estadual optou, então, por desconsiderar o parecer da Comissão de Ética, expulsando somente Venceslau. Foi o instante em que se assumiu como um partido igual aos outros, capaz até de sacrificar um militante honesto (e REVOLUCIONÁRIO!!!) para preservar uma maçã podre.
A direção estadual optou, então, por desconsiderar o parecer da Comissão de Ética, expulsando somente Venceslau. Foi o instante em que se assumiu como um partido igual aos outros, capaz até de sacrificar um militante honesto (e REVOLUCIONÁRIO!!!) para preservar uma maçã podre.
Teixeira, o compadre do Lula. |
Ao contrário do que os petistas querem nos fazer crer, no caso deles o ovo da serpente não foi o mensalão mineiro, mas sim as maracutaias da CPEM. Estão certíssimos ao alegarem que todos os grandes partidos do sistema incidem nas mesmíssimas práticas, mas devemos sempre lembrar-lhes que o PT tinha obrigação política e moral de não resvalar para tal vala comum.
Tudo
que de ruim aconteceria depois foi consequência desta terrível decisão.
Orgulho-me de haver me solidarizado a Venceslau, antecipando que o
partido tendia ao desvirtuamento, no artigo PT expulsa PT, que o Jornal da Tarde
publicou com destaque na sua página de Opinião, ao lado e como
contrapartida a uma crítica que João Paulo Cunha (logo quem...) fazia ao
correto trabalho jornalístico de Luiz Maklouf Carvalho.
Como,
face às mesmas circunstâncias, tendemos a desempenhar novamente os
mesmos papéis, devo ter sido o primeiro a pedir agora a expulsão de
Clécio Luís (vide aqui). É provável que nem desta vez meu alerta leve ao esmagamento do ovo da serpente, mas a minha parte eu sempre faço.
4 comentários:
Muito louvável a sua coerência, e para ser coerente novamente, deve pedir a expulsão do senador Randolfe que na CPMI do Cachoeira vem atuando - ao lado de Pedro Taques - na defesa da organização criminosa que vem atuando a partir do estado de Goias e de seus membros: Civitta e "Caneta", "Poli" ou "JR".
Galvão,
não sou o Catão do PSOL, até porque o partido jamais me incumbiu de julgar o comportamento de ninguém.
Ocorre que o caso do Venceslau x Teixeira repercutiu amplamente e o PT tomou a pior posição possível, dando sinal verde para os desvios de recursos públicos para financiamento partidário.
Percebi que daquela decisão adviriam consequências desastrosas e me posicionei (também pesou minha solidariedade ao Venceslau e aos companheiros que participaram da luta armada em geral, sempre que injustiçados).
O caso do Clécio Luís tem as mesmas características, pois abre as portas para o desvirtuamento do partido: promiscuidade com o DEM, defesa pública (numa entrevista ao jornal da ditabranda) da aceitação de doações podres, disposição de se atrelar ao reformismo, etc.
Eu intervenho nesses episódios emblemáticos, não em todos os episódios. E isto já me causa problemas e retaliações demais. Não dá para um franco atirador (o que, na verdade, continuo sendo) sustentar todas as brigas.
Abs.
Nada a ver essa história do Venceslau. O que ocorre é que naquele momento quem exercia cargo em comissão na administração petista era obrigado, por exigência do estatuto, a doar 30 por cento dos seus ganhos ao PT. Isso levou muitos, como Venceslau, a se revoltar, aqui em Goiás ocorreram algumas rebeldias por causa disso, muitos Venceslaus sairam atirando por esse motivo.
Lima,
basta você colocar os nomes do Venceslau e do Teixeira (ou CPEM) na busca do Google e aparecerá o que relatei, em muitos textos diferentes.
Venceslau foi expulso EXATAMENTE por tal motivo, e não por causa dessa tal doação compulsória --aliás, também uma ABERRAÇÃO, lembrando o dízimo dos católicos e o achaque que sofrem os cordeiros da Igreja Universal.
Abs.
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