domingo, 2 de outubro de 2011

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE ARTES MARCIAIS

Quando eu era menino, ficava atraído pelas encenações mambembes de lutas livres que as tevês transmitiam.

As  marmeladas  brasileiras eram de um ricículo atroz, piores ainda do que as mostradas no filme O Lutador (The westler, d. Darren Aronofsky, 2008) -- que, aliás, deveria ter valido um Oscar a Mickey Rourke.

Havia um mascarado que se apresentava como Fantomas e nocauteava os adversários com arremedos de cuteladas de caratê, que não machucariam nem uma moça.

Havia um enfaixado que se passava por múmia, anunciada como  centenária (!!!) e vingadora.

Havia galãs como Teddy Boy Marino, que apropriadamente acabou indo exercitar suas aptidões canastrônicas noutro circo eletrônico, o dos Trapalhões.

Meu avô, coitado, queria acreditar que uma ou outra luta fosse verdadeira. Não sobreviveu para ver o vale tudo levado a sério.

Foi na década retrasada que os eventos de artes marciais mistas começaram sua escalada nos EUA, a partir do lançamento do Ultimate Fighting Championship, em 1993. Antes, já eram grande atração no Japão.

O fato de as lutas serem reais e admitirem o uso das técnicas específicas de todas as modalidades de artes marciais lhes granjeou aceitação crescente, que hoje beira o fanatismo.

Mas, a inexistência de arranjos predeterminando o resultado final não significa lisura. O emparceiramento é decidido pelo organizador, seguindo critérios comerciais, não de mérito esportivo. Tudo é show, exceto o que se passa na arena, onde jorra sangue.

O boxe tinha lá suas máfias (vale lembrar outro clássico do cinema, Punhos de campeão, d. Robert Wise, 1949), mas era organizado por entidades, tinha rankings e seguia certas regras  neutras. Nos UFC's e Prides o que vale é a vontade do dono, e ponto final.

Golpes violentíssimos como chutes na cara são legais, mas os árbitros interrompem as lutas tão logo um contendor fica em situação vulnerável. Mortes atrapalhariam o negócio.

Não possuo estatísticas a respeito, mas presumo que tais refregas sejam bem menos letais que as do pugilismo.

Contudo, fico sempre com a impressão de que o esporte se perdeu nalgum ponto do caminho. Esses espetáculos de quem-tonteia-primeiro-o-rival-vence são, na verdade, apenas isto: espetáculos. Servem para satisfazer a compulsão dos videotas por enredos simples e emoções fortes.

A luta do século, como foi mostrada no documentário 
Quando éramos reis, com Norman Mailer comentando.

Posso apostar que nunca veremos épicos como o duelo Davi x Golias em que Muhammad Ali conseguiu o impossível, há 37 anos no Zaire, fazendo o gigantesco George Foreman desabar lentamente como uma torre do WTC...

No entanto, com o beneplácito da indústria cultural, essa atração mais empolgante pôs fim à era do boxe, hoje em franca decadência.

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