terça-feira, 7 de outubro de 2008

REAÇÕES TÍMIDAS E TARDIAS A UMA HECATOMBE ANUNCIADA

A Segunda-Feira Negra comprova que estamos mesmo no olho do furacão. Então, é mais do que tempo de descartarmos as interpretações simplistas da crise, dadas pelos que estão acumpliciados com o verdadeiro vilão: o capitalismo.

Atribuir a convulsão atual a um mero desleixo das autoridades que deveriam evitar a transformação do mercado financeiro em cassino não passa de conversa para boi dormir. A alternância de fases de expansão e retração econômicas marca o capitalismo desde o seu início, não havendo base concreta nenhuma para apregoar-se o fim dessa História...

Segundo Marx, o pecado original do capitalismo é que, como os assalariados não recebem de volta o valor total dos bens que produzem, estão impedidos de adquiri-los todos, daí o descompasso entre o estoque de produtos oferecidos e o poder aquisitivo dos consumidores.

Até a metade do século passado, isto se reequilibrava de formas dramáticas: desde as queimas de café para evitar a queda do preço internacional do produto até as guerras, que geravam um mercado cativo para a produção excedente, na forma de armamentos.

Com o advento das armas nucleares, entretanto, os conflitos entre potências passaram a ter o pequeno inconveniente de poderem extinguir a espécie humana. Então, desde 1962, ano da crise dos mísseis cubanos, tais situações passaram a ser administradas com mais cautela.

Desigualdade obscena e descompasso entre oferta e procura continuaram, entretanto, caracterizando o capitalismo, que logrou represar suas crises cíclicas por mais tempo graças a dois expedientes:

· o incremento ad absurdum das atividades parasitárias, totalmente inúteis para o ser humano, cuja expressão mais conspícua, claro, são as bancárias;

· e a concessão ad absurdum de crédito, possibilitando que os consumidores transfiram para o futuro o pagamento dos bens que não têm como custear no presente.

Com isto, são atendidos por algum tempo requisitos básicos para o bom funcionamento do sistema: o giro cada vez mais rápido das mercadorias e a expansão contínua. E um edifício de especulações (fazendo a fortuna dos gananciosos mais argutos) se erige sobre a base falsa desse crédito concedido a quem não possuía o suficiente para adquirir tais bens no presente, nem conseguirá reequilibrar as contas no futuro.

Pois o conjunto dos beneficiários desses créditos continuará recebendo, por seu trabalho, menos do que o necessário para adquirir os itens oferecidos à sua cobiça pela sociedade de consumo. Então, a operação de pagar as dívidas do passado para poder contrair novas (com o agravante de que lhe são cobrados juros por esses créditos) não se sustenta indefinidamente. Um dia a casa cai.

A inadimplência é inevitável, gerando turbulências como a deste 6 de outubro (e outros dias de pânico nos mercados que ainda venham a ocorrer), com efeitos catastróficos para pessoas, instituições e países. E, como as pressões foram contidas por muito tempo, o estouro do dique poderá, desta vez, gerar conseqüências ainda mais dramáticas que as do passado.

Recessões que chegam a durar até uma década (como a que sobreveio após o crack de 1929) têm sido o terrível desfecho das crises cíclicas do capitalismo: a produção é drasticamente reduzida durante certo período, o que impõe rigores a quase todos e condena muitos à penúria e ao desespero.

No entanto, o necessário para continuarem-se produzindo os bens ainda existe: matérias-primas, máquinas, recursos humanos. Não houve guerra, catástrofes naturais ou pestes. Todo sofrimento imposto aos homens se deve a uma crise do que é artificial, o capital, mas tem o poder de provocar um colapso no que é real, a produção.

Marx estava certíssimo ao destacar a irracionalidade básica do capitalismo.

Norman O. Brown também estava certíssimo ao destacar o componente destrutivo do capitalismo e seu potencial de causar a própria destruição da espécie humana (vide as alterações climáticas).

E estarão certíssimos os homens que se mobilizarem para evitar o pior, enquanto ainda há tempo. A crise atual é um bom exemplo do que podemos esperar das corporações e governos: reações tímidas e tardias a uma hecatombe anunciada.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Com o advento das armas nucleares, entretanto, os conflitos entre potências passaram a ter o pequeno inconveniente de poderem extinguir a espécie humana" - rsrsrsrsrsrs!

Related Posts with Thumbnails