"Marx também tem um nome para o mecanismo específico da divindade fetiche capitalista:
chama-lhe sujeito automático"
(Robert Kurz, em Ler Marx)
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Pela primeira vez na história da humanidade a produção de bens e serviços indispensáveis à vida é em maior parte paralisada por disfunção e incapacidade do sistema produtor de mercadorias em cumprir o seu objetivo vazio de sentido virtuoso, autotélico, ou sem qualquer finalidade para além de si mesmo, traduzida como a contínua e irracional reprodução aumentada e excludente da riqueza abstrata.
A paralisia da reprodução aumentada da riqueza abstrata por suas contradições internas, agora explicitadas, reduz a produção da riqueza material e, assim, grande parte da população mundial se vê precarizada na própria subsistência; o Estado entra em rota falimentar por falta de recursos; e instala-se uma situação de anomia social cujos resultados são imprevisíveis.
Paradoxalmente, este momento de ebulição social e incertezas não só propicia o surgimento de salvadores da pátria retrógrados, com suas bandeiras saudosistas de um passado que se tornou obsoleto, como também, paralelamente, das primeiras possibilidades de negação e compreensão crítica do que vem sendo historicamente desenvolvido: a negatividade intrínseca do capitalismo.
A paralisia da reprodução aumentada da riqueza abstrata por suas contradições internas, agora explicitadas, reduz a produção da riqueza material e, assim, grande parte da população mundial se vê precarizada na própria subsistência; o Estado entra em rota falimentar por falta de recursos; e instala-se uma situação de anomia social cujos resultados são imprevisíveis.
Paradoxalmente, este momento de ebulição social e incertezas não só propicia o surgimento de salvadores da pátria retrógrados, com suas bandeiras saudosistas de um passado que se tornou obsoleto, como também, paralelamente, das primeiras possibilidades de negação e compreensão crítica do que vem sendo historicamente desenvolvido: a negatividade intrínseca do capitalismo.
Mesmo lançado ao fogo por Moisés, o bezerro de ouro... |
Este é o impasse suicida do sujeito automático da forma-valor, razão de ser do capitalismo.
Entretanto, apesar evidenciarem-se as incongruências de um modo de ser social que entra em colapso por seus próprios fundamentos, todo o pensar ainda está envolto pelo invólucro capitalista; todas as ações ainda se dão dentro de sua imanência; e, exatamente por isto, reproduz-se o aparentemente interminável pêndulo da ineficácia governamental entre esquerda e direita.
Quando Marx, há quase 160 anos, afirmou que vivemos sob o comando do sujeito automático da forma-valor, ele quis dizer, acertadamente, que a criatura (a forma-valor, com seu dinheiro e mercadorias) ficou maior que o seu criador (os seres humanos) e passou a lhe ditar ordens ditatoriais e incongruentes.
...se tornou o monstro que estava fadado a ser... |
Assim, ele próprio (Marx) contrariou as suas teses iniciais do proletariado como sujeito da emancipação social, passando a considerar o trabalho abstrato e o trabalhador como categorias capitalistas imanentes e defendendo, implicitamente, a superação dessas categorias como única forma de emancipação social humana.
Antes, os críticos do capitalismo, situados dentro do marxismo tradicional, exotérico, entendiam que bastava que se eliminassem os capitalistas privados extratores de mais-valia e se colocassem os meios de produção de mercadorias sob o controle do Estado (pseudo-proletário), para que a "exploração do homem pelo homem” (Marx) fosse eliminada da face da terra.
Não compreenderam os marxistas exotéricos (ou não quiseram compreender, por comodismo) que se fazia necessário ir além da simples expropriação dos meios de produção de mercadorias das mãos dos capitalistas privados; tinha de ser superada a própria produção de mercadorias!
Tal conceito incompreendido pelos marxistas, está nas páginas iniciais de O capital, sempre considerado por seus próprios seguidores como um repositório de elucubrações filosóficas sem sentido prático e de difícil entendimento...
Marx começa O capital analisando a forma-mercadoria, justamente por considerar que ela é a célula germinal de todos os construtos que são imanentes ao capitalismo; disto, contudo, não se aperceberam os seus adeptos.
...mas logo a humanidade se libertará dele em definitivo. Que morra o capitalismo! |
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O QUE É ESSE SUJEITO
AUTOMÁTICO DA FORMA-VALOR?
.A riqueza abstrata — uma lógica teórica tornada real, concreta, consistente em frios números contabilizados — comanda as ações sociais, sejam elas de empresários, governantes e trabalhadores. Este é o sujeito automático da forma-valor capitalista.
Qualquer empresário, pequeno ou grande, obedece às ordens ditatórias do mercado.
Somente se produz o que o mercado aceita como economicamente viável.
Por mais afinidade que o pequeno empresário tenha com seus empregados, quando caem as vendas de mercadorias ou serviços, a lógica funcional do sujeito automático da forma-valor determina ao patrão que demita os funcionários tornados supérfluos, para seu negócio não ir à falência (há relatos até de suicídios de empresários forçados a tomar tal medida).
O grande empresário, que obviamente se beneficia do poder social a ele conferido pelo capital que lhe impõe obediente administração, não é o senhor das ações quando o tema é a reprodução aumentada do próprio capital. Ele sente que o volume de capital sob sua administração necessita de aumento contínuo, sob pena de encolhimento e falência diante da corrida concorrencial de mercado. Daí as constantes fusões empresariais como forma de sobrevivência.
Mesmo o grande capitalista vive sob a eterna pressão da necessidade de crescimento contínuo para conseguir manter seu poder econômico-político em relação à sociedade. Assim, não é o capital que está sob o controle empresarial, mas o empresário que está submisso às regras ditatoriais da lógica funcional da riqueza abstrata.
Ora, se assim é para o próprio capitalista, obrigado a assegurar a reprodução aumentada do capital, o que dizer do trabalhador? Este só tem para vender a sua força de trabalho, hoje cada vez mais desnecessária face à produção mecanizada de mercadorias. Resta-lhe o desespero e a completa impotência diante da impossibilidade de suprir satisfatoriamente as suas necessidades de consumo.
Tal é a fonte primária do aumento vertiginoso da criminalidade; nada há de mais exasperador para um homem são e apto à produção dos seus meios de subsistência, do que a constatação da impossibilidade de fazê-lo.
Para os sindicatos, por sua vez, sobra o triste papel de mendigar por mais empregos e melhores salários (leia-se: mais capitalismo) que não virão, uma vez que a corrida concorrencial de mercado obriga a migração da produção de mercadorias para locais onde o custo do trabalho abstrato é menor (casos da China e da Índia).
O capital entrou, agora, na fase final do seu ciclo de nascimento, vida e morte, como mecanismo social histórico (não ontológico) que é. E isto se deve ao desenvolvimento das suas próprias contradições, a principal delas sendo a mecanização da produção de mercadorias que tornou supérfluo, em maior parte, o trabalho abstrato, único produtor de valor.
Tal fato tem uma grave resultante política: a falência do estado que lhe dá suporte logístico, seja na emissão da moeda; seja na indução do desenvolvimento econômico e na criação e manutenção da infraestrutura de produção de mercadorias; seja na manutenção da ordem jurídico-institucional que mantém a coerção do seu modo social de ser.
Não há, hoje, um segmento social mais detestado pelo povo do que os políticos no exercício dos seus mandatos, forçados que estão à aprovação de medidas anti-povo ditadas pela necessidade do ajuste das contas públicas em rota falimentar, tudo isso para que seja mantido o equilíbrio econômico daquilo do qual dependem e fazem parte de modo submisso – o estado.
A desvalorização da política e a imposição de ajustes fiscais são, portanto, outros exemplos cristalinos do comando nefasto do sujeito automático da forma valor na vida social.
Já passa da hora de superarmos tal ditador abstrato que se torna real, o sujeito automático da forma-valor, e estabelecermos o domínio da consciência social sobre os nossos destinos. (por Dalton Rosado)
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