domingo, 11 de dezembro de 2022

BRASIL DEVERIA TERMINAR A COPA NO 3º LUGAR E FICOU EM 7º. ISTO IMPORTA?

M
al Marquinhos mandou na trave a quarta cobrança brasileira na loteria dos pênaltis contra a Croácia, os brasileiros, eternamente imaturos, saíram atrás de culpados para o novo fracasso nas tentativas de conquista do hexa. 

O desabafo era vital para eles, já que não conseguem suportar derrotas nem manter um pingo de equilíbrio nos maus momentos.

Se fizessem uma comparação imparcial com a partida seguinte, na qual a Argentina também estava com a vitória nas mãos, também vacilou no finalzinho e também se defrontou com a possibilidade de perder a vaga para um selecionado nitidamente inferior, teriam chegado à conclusão de que:
— pela qualidade das seleções que permaneciam na disputa, se as melhores prevalecessem, o escrete canarinho teria passado por Croácia, mas não, de jeito nenhum, pela Argentina;
— então, alcançaria provavelmente  a terceira posição, ao invés de terminar na sétima, como acabou acontecendo. Isto realmente importa, se a nossa mentalidade, conforme bem definiu Nelson Piquet, sempre foi a de que o vice-campeão não passa do primeiro dentre os últimos?

Os argentinos, mesmo recebendo um banho de água fria no tempo normal, seguraram a onda no 1º tempo da prorrogação, terminaram o 2º criando sucessivas chances de gol e, finalmente, arrancaram a vaga nos pênaltis. Foram guerreiros. Fomos frouxos.
Era Menino Ney no início (2009) e continua sendo em 2022

Qual a maior diferença entre os dois escretes? Aquela que separa a liderança negativa de Neymar da liderança positiva de um Messi que, na sua última tentativa de vencer o Mundial Fifa de seleções, acrescentou aos seus predicados de melhor futebolista do século 21 uma combatividade digna do saudoso Maradona.

Culpa-se Tite, que realmente pecou em muitos detalhes, mas fato é que ele incorporou à seleção uma fornada de novos talentos que, bem lapidados, poderão render muito mais em 2026.

No entanto, esses jovens cresceram idolatrando o craque Neymar e até hoje o admiram incondicionalmente. Que sucesso teria Tite se os frustrasse afastando o ídolo de pés de barro ou, pelo menos, tentando diminuir sua ascendência sobre os fãs que viraram companheiros de seleção?

Não tenho como saber se Tite tanto fez para ter Neymar nesta Copa por mero erro de avaliação ou por haver concluído que se tratava de um mal menor. O certo é que, sem o adulto que se recusa a crescer (lembrando Peter Pan e Michael Jackson), o Brasil ficaria nitidamente inferiorizado numa decisão contra a França de Mbappé ou a Argentina de Messi.

Foi pior a emenda do que o soneto? Se o Tite dispusesse de uma bola de cristal, talvez fizesse outra escolha e se saísse melhor. Pois um escrete sem Neymar teria maior chance de disputar bem o 3º lugar ao invés de fracassar mal nas quartas-de-final. Mas, horóscopos quem fazia era o Olavo de Carvalho, aquele charlatão que serviu de Rasputin para o clã Bolsonaro...

Um aspecto óbvio da nocividade da liderança infanto-juvenil do Neymar foi ter-se reservado para cobrar o quinto pênalti, aquele que potencialmente lhe garantiria maior glória pessoal. 

Mas, deixar a primeira cobrança para Rodrygo foi atirar responsabilidade demais nos seus ombros jovens. Previsivelmente, ele falhou e isto acabou de desestabilizar o grupo em termos emocionais.

E a cobrança daquele que acabou sendo o último por parte de um beque foi uma reprise quase exata do ocorrido nas quartas-de-final de 1986, quando o Brasil empatou por 1x1 com a França e, nos pênaltis, o goleiro francês Bats defendeu nossa primeira cobrança e o zagueiro Júlio César disparou o derradeiro na trave, selando a desclassificação do nosso escrete.

Anos depois, quando o Zico fazia parte da seleção de veteranos do Luciano do Valle, entrevistei-o no hotel Transamérica (SP) sobre as lições que aquela Copa haviam deixado para a nova que estava prestes a começar. 

Perguntei-lhe o motivo de um defensor haver ficado com um pênalti tão importante. Ele respondeu:
"No tempo normal cobrei um [cavado por ele mesmo, vale acrescentar] e o Bats defendeu. Mas não fugi da responsabilidade  de cobrar o meu na decisão por pênaltis. Fui lá e converti. Já outros atacantes se omitiram e deu no que deu"
Dá para escrete sem cabeça tornar-se campeão mundial?
Por último, os cronistas esportivos da grande imprensa passaram batido por mais esta comprovação da falta que nos fazem grandes organizadores e cérebros dos times como Luka Modric (malgrado lhe tenha cabido a inglória tarefa de amiúde esfriar o jogo
, frustrando e irritando os apreciadores da arte futebolística no mundo inteiro)

Não tenho dúvidas de que com um Giorgian De Arrascaeta do nosso lado (ou, pelo menos, um Renato Augusto sem as limitações físicas atuais), poderíamos, sim, enfrentar os bichos papões desta Copa. Mas, não os formamos mais.

Por quê? Porque hoje nos resignamos a ser fornecedores de pé-de-obra para o exterior. E o que os europeus (os melhores fregueses) esperam de nós são malabarismos com a bola, dribles e gols de placa, não as funções pensantes, pois eles continuam intrinsecamente nos vendo como inferiores nesse quesito.

Enquanto formarmos jogadores priorizando seu valor de venda para o mercado internacional, continuaremos carentes em algumas posições. Mas, claro, você dificilmente lerá isto nos colunistas da grande imprensa aos quais não é permitido colocar o dedo nesta ferida fundamental: as distorções que o capitalismo ora nos impõe, inclusive no esporte. (por Celso Lungaretti)  

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