william waack
O FOSSO É MAIS PROFUNDO
O quadro geral da eleição presidencial mudou apenas em centímetros desde que o STF tirou Lula da cadeia e o tornou elegível.
Não houve qualquer abalo sísmico, e cabe se perguntar qual teria de ser o tamanho de um terremoto político para alterar um confronto que, a rigor, é bastante profundo e já escancarado na corrida para a eleição de 2018.
Lamentava-se então (e desde sempre) que o fenômeno da vassourada bolsonarista sobre o lulopetismo significava o esfacelamento de qualquer centrismo (entendido como posturas antagônicas a populismos de esquerda ou direita.
Como assinala o sociólogo Bolívar Lamounier, não estamos diante de polarização de período eleitoral. Mas, sim, diante de uma terceira onda de desavenças, só comparável a eventos históricos como o getulismo/antigetulismo ou o período 1961-1964, que levou ao golpe militar.
E muito perigosa: a atual desavença inclui religião, redes sociais que agravam o tribalismo, e o descrédito geral de instituições como a imprensa ou o Judiciário – numa economia de crescimento médio medíocre nos últimos 30 anos.
O descontentamento social amplo deu força, em parte, a uma vertente política profunda, o bolsonarismo, que desacreditou plataformas conservadoras e liberais e trouxe à tona uma mistura asquerosa de boçalidade e mediocridade (que sempre existiram).
Há, sim, elementos culturais (em sentido amplo) muito relevantes nessa clivagem – como o fato de regiões inteiras nas quais prosperou a produção de grãos e proteínas enxergarem em Lula e no que ele representa a antítese do empreendedorismo, dos valores da família e do esforço do indivíduo. E temerem pela sua propriedade e atividade.
Ou o fato de significativas camadas urbanas enxergarem em Bolsonaro a antítese de valores como solidariedade, compaixão, tolerância, defesa de direitos de minorias e do ambiente. E temerem pelo futuro do estado de direito e pela sobrevivência de regras básicas de convívio social.
Por enquanto, as eleições não parecem que resolverão essa desavença e conseguirão levar, qualquer que seja o resultado, a uma pacificação. Como em toda guerra cultural, não há termos de um armistício que se possa acordar (e fazer respeitar) entre inimigos dedicados ao combate ao horror.
Por necessidade ou por frio cálculo político, Lula está manobrando para parecer que é capaz de juntar forças para superar esse fosso. Bolsonaro parece ver vantagens em aprofundá-lo.
(por William Waack)
2 comentários:
Olá, CL
Somente a título de curiosidade. Outro dia estava passando na tv a cabo aquele filme "love story - uma história de amor", de 1970.
Eu já nem lembrava, mas há uma cena em que o casal quer o primeiro filho e pensam em dar o nome de Bozo, isso mesmo, para a criança. Ocorre que ela adoece e não poderá engravidar...
Infelizmente, o Brasil pariu o bozo.
Não vi o Love Story, mas o personagem em questão tem mais afinidade com a série de reportagens que o jornal Notícias Populares fez em 1975, sobre o nascimento do bebê diabo. As datas divergem, mas o espírito é o mesmo.
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