Bacuri era um codinome já descartado, que ele usara antes de abril/1969, quando o conheci no Congresso de Mongaguá da VPR.
Deve tê-lo mudado porque era revelador em demasia, mais próximo de um apelido: um tanto gordo, ele lembrava mesmo um porquinho. E, claro, assim o nome de guerra descumpria a finalidade de dificultar a identificação do companheiro que o utilizava.
Eu era um secundarista de 18 anos, um tanto deslumbrado por ter sido repentinamente admitido no círculo dos revolucionários mais procurados do Brasil. Queria entrosar-me o quanto antes com os novos companheiros.
E, sem me dar conta, já era com olhar de jornalista que eu observava a tudo e a todos, fazendo minhas avaliações, tentando entender como haviam sido forjados combatentes daquela têmpera. Sentia-me, como o Repórter Esso, uma testemunha ocular da História...
E, sem me dar conta, já era com olhar de jornalista que eu observava a tudo e a todos, fazendo minhas avaliações, tentando entender como haviam sido forjados combatentes daquela têmpera. Sentia-me, como o Repórter Esso, uma testemunha ocular da História...
O Basílio não parecia o combatente da pesada que depois fiquei sabendo ser. Nem de longe. Fiquei surpreso quando o Moisés (José Raimundo da Costa) me contou algo de sua história.
Estava com o cabelo curto e um farto bigode, que o deixava com um jeitão de português, além de envelhecê-lo um pouco. Nunca adivinharia que ele, àquela altura, tinha tão somente 23 anos.
Notícia fraudulenta: ele foi, isto sim, executado a sangue frio! |
Era simples, afável, simpático. Quando se alterava, gaguejava um pouco. Foi o que aconteceu ao comunicar que deixaria a Organização.
Minhas recordações, quase meio século depois, são nebulosas. Lembro-me de que ficou muito emocionado, talvez tenha até chorado.
Desentendera-se com outros companheiros a respeito do encaminhamento dado a operação(ões) armada(s); devido às regras de segurança, fiquei sabendo disso muito superficialmente, então não pude (nem posso agora) estabelecer quem tinha razão.
Montou uma pequena organização, a Rede Democrática, que se manteve bem próxima da VPR, sendo nossa parceira em várias ações.
Quando o Moisés e eu vimo-nos ameaçados de expulsão da VAR-Palmares, no curso da luta interna que desembocaria na recriação da VPR, ele consultou o Basílio a respeito do nosso ingresso na Rede, recebendo sinal verde.
Bem ao seu estilo – conservava sempre uma carta escondida na manga –, o Moisés só me falou dessa sondagem quando o racha estava consumado e nós, os precursores, reabilitados.
Uma ótima biografia |
É minha última reminiscência envolvendo o Basílio, até ficar sabendo de sua prisão e martírio – um dos episódios mais chocantes dos anos de chumbo. "Nenhum tormento conseguiu arrancar qualquer informação do Bacuri", afirmou Jacob Gorander.
Até hoje não me passa pela garganta que a vítima de tão terríveis e prolongados suplícios tenha sido aquele gordinho boa gente que batia bola comigo na praia de Mongaguá, durante os intervalos do congresso da VPR. As duas imagens não casam.
O destino foi cruel demais com ele.
Obs. – ainda sobre o Bacuri, leia aqui (clique p/ abrir) a descrição do seu martírio no relatório final da Comissão Nacional da Verdade.
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