Esses novos bárbaros engendrados/mesmerizados pela sociedade de consumo crêem mais na tecnologia do que em Deus.
Estão sempre em busca de geringonças high-tech com uma evoluçãozinha (real ou ilusória) qualquer, pois o brinquedinho antigo de nada vale quando já existe uma nova geração.
Empenham-se obsessivamente em serem modernos na aparência, pois é só o que têm; sua essência é um vácuo.
E, mais do que nunca, desligaram-se da História: o passado absolutamente não lhes diz respeito. O mundo surgiu quando abriram os olhos e terminará quando baixarem à cova.
O suicídio de Getúlio Vargas, p. ex., é para eles um acontecimento tão distante e desinteressante quanto o de Sócrates (para o caso de algum deles estar me lendo, esclareço: refiro-me ao filósofo ateniense obrigado a ingerir cicuta lá por 400 a.C., não ao ex-jogador de futebol, que continua firme e forte).
Vai daí que o velho sempre lhes parece novo, pois ignoram as luzes que o passado fornece para iluminar o presente.
Nem pensariam em assistir a um filme que, vez por outra, passa na TV a cabo (já nem falo de cinematecas e cineclubes, pois é algo que para eles não existe): A Montanha dos Sete Abutres, do grande Billy Wilder.
O jeitão de um filme preto-e-branco de 1951 é suficiente para que imediatamente o qualifiquem de museu e troquem de canal, em busca dos videoclips da moda.
Mas, mesmo que tivesse as características formais de uma produção de 2008, creio que não conseguiria captar-lhes a atenção.
Infelizmente, o espectador brasileiro de hoje se tornou igual ao estadunidense de uns 20 anos atrás, tão bem definido por Paulo Francis: caso não ocorresse uma pancadaria, uma morte, uma perseguição de carros, uma grande explosão ou uma cena de sexo a cada três minutos, dormia na poltrona.
Enfim, o que eu quero dizer é que A Montanha dos Sete Abutres tem tudo a ver com o Caso Santo André.
Mostra um mineiro preso em velhas ruínas indigenas e um repórter ambicioso (Kirk Douglas) que o encontra, pode resgatá-lo de imediato, mas o convence a ficar lá, enquanto extrai todos os dividendos jornalísticos dessa situação.
Manipula a tudo e a todos: a esposa do mineiro, para posar de semiviúva; o xerife, que lhe concede o direito de controlar como lhe bem entender o acesso ao local; o empreiteiro responsável pela obra de salvamento, para que vá pelo caminho mais longo, esticando ao máximo a duração do espetáculo.
Na véspera do grand finale, entretanto, o mineiro morre de pneumonia. E o abutre responsável pelo desfecho trágico acaba também destruído, pelos remorsos.
O episódio de Santo André também tendia a ser resolvido muito antes, sem tragédia, caso a imprensa não montasse seu circo.
A partir do momento em que o tal Lindemberg virou atração de mídia, passou a representar um papel diferente; afinal, não é qualquer zé mané que tem essa raríssima chance de desfrutar não uns minutinhos ocasionais de fama, mas nada menos que 100 horas.
Deu no que deu. Agora a ex-namorada está enterrada no caixão e ele passará o melhor de sua vida enterrado numa prisão, se os outros detentos não o matarem antes.
O pior é que houve uma multiplicação dos abutres. No filme havia apenas um; o título brasileiro se refere ao nome indigena da montanha em que o mineiro ficou meio soterrado.
Em Santo André eram bem mais do que sete. E nenhum deles demonstrou o mínimo remorso, ao contrário do personagem cinematográfico.
A vida não apenas imitou a arte, mas também a retocou. Para pior.
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