sexta-feira, 12 de setembro de 2008

SUBORNO TAMBÉM VALE NA CAMPANHA PRÓ-PARTO NORMAL

Tenho tomado conhecimento de um sem-número de relatos de famílias indignadas com a imposição do parto normal às gestantes na rede pública, ignorando seus protestos e súplicas, com terríveis consequências (morte ou danos graves à saúde da parturiente e/ou da criança).

O que pensei inicialmente tratar-se de uma iniciativa isolada da Secretaria da Saúde de São Paulo - cujo Hospital da Vila Alpina foi palco de vários episódios escabrosos -, é, na verdade, fruto de um empenho das autoridades federais no sentido de evitar a proliferação das cesáreas, que representaram 43% dos partos brasileiros em 2007, enquanto a média mundial é de 15%.

Minha convicção foi revorçada pelo artigo do professor de Clínica Médica da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina, Antonio Carlos Lopes, publicado na edição de 12/09/2008 da Folha de S. Paulo: Parto normal ou cesárea?

Lopes, que também preside a Sociedade Brasileira de Clínica Médica, informa que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) "anunciou um pacote de supostos benefícios a vigorar a partir de dezembro na tentativa de incentivar o parto normal".

Assim, será oferecido às mães:
  • a presença do acompanhante antes, durante e após o parto;
  • quartos com até duas gestantes;
  • a possibilidade de o bebê ficar ao lado da mãe no quarto, se não houver impedimento clínico; e
  • a liberdade de escolha da mulher, também se não houver impedimento clínico, quanto à posição em que dará à luz (de cócoras ou deitada).
Sendo o Brasil como é, não me causa surpresa que, antes da tentativa de persuasão, já estivessem recorrendo à imposição pura e simples. O autoritarismo e o elitismo têm raízes profundas nestes tristes trópicos.

O respeitado especialista de 62 anos considera "nem sempre felizes" as propostas que estão sendo discutidas entre médicos, governo e sociedade para incentivar o parto normal, além de ressalvar que "a medicina determina algumas situações em que o médico tem, necessariamente, de optar pela cesárea".

E refuta veementemente que o projeto da Anvisa represente mesmo "uma tentativa de incentivar a humanização do parto":
- Humanização? Humanização tem origem na escola, no ensino médico de qualidade, na segurança e no conforto a todas as gestantes, independentemente da indicação clínica para o tipo de parto. A humanização deve contemplar maternidades e centros obstétricos e enfermagem obstétrica à altura do bem-estar materno-fetal. Também envolve extinguir as malfadadas casas de parto, que se prestam apenas aos menos favorecidos, enquanto os que as preconizam buscam para suas filhas e esposas as melhores maternidades e os melhores obstetras.

Minha posição é de que o Estado tem todo direito de fazer proselitismo em favor do parto normal, mas excede suas atribuições ao oferecer benefícios diferenciados às parturientes e comete um crime quando impõe o procedimento de sua preferência (coincidentemente, o de menor custo) àquelas que preferem a cesárea.

Afora os inúmeros casos denunciados em que o parto normal não parecia ser o mais indicado, foi imposto ARBITRARIAMENTE e acabou tendo resultados trágicos, eu defendo, inclusive, o direito da gestante de não querer passar pelas dores do parto.

Inexistindo impedimento clínico, cabe a elas - e a mais ninguém - decidir a intensidade de dor que estão dispostas a suportar.

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