quarta-feira, 8 de novembro de 2017

MULTA PARA PEDESTRES: SERIA APENAS UM TEATRINHO INÓCUO SE NÃO CONTRIBUÍSSE PARA A DESMORALIZAÇÃO DAS LEIS.

LEIS DESCOLADAS

"Fazer uma lei e não a mandar executar é autorizar a coisa que se quer proibir". A frase é de Armand-Jean du Plessis, mais conhecido como cardeal de Richelieu (1585-1642), que de mandar entendia alguma coisa. Foi ele quem, agindo em nome do rei Luís 13, introduziu o absolutismo na França.

Receio, porém, que a situação possa ser ainda pior do que sugere o cardeal. A edição de uma norma que não é seguida pelo menos de uma tentativa honesta de implementá-la não só acaba funcionando como uma autorização mas também contribui para o difuso descrédito da lei, isto é, da capacidade do poder público de impor regras à sociedade. Reside aí uma das razões para as famosas leis que não pegam.

Nesse contexto, não me parece especialmente feliz a decisão do Departamento Nacional de Trânsito de baixar a resolução 706/2017 que regulamenta os artigos 254 e 255 do Código de Trânsito e prevê multas para pedestres e ciclistas que infrinjam certas normas de trânsito. A crer no pessoal do Denatran, as cobranças começam dentro de seis meses.

Não discuto que pedestres e ciclistas cometam barbeiragens. Também me parece claro que o trânsito se tornaria mais seguro e fluido se eles estivessem, como os motoristas de carros, sujeitos a sanções. 

O problema é que agentes de trânsito não têm poder de polícia, o que significa que o cidadão não é obrigado a identificar-se para eles, tornando a autuação quase impossível (seria necessário colocar um PM ao lado de cada marronzinho, o que parece algo difícil de justificar).

Sem tomar os cuidados para que a cobrança seja efetiva —exigindo que bicicletas tenham placa, p. ex., ou concedendo poder de polícia aos agentes de trânsito, medidas que nada têm de trivial—, o Denatran faz só um teatrinho. Ele seria apenas inócuo se não contribuísse para a desmoralização das leis. 

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