sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

A ÉPOCA DE OURO DA MPB (2ª parte)


DUELO DE GIGANTES: A BANDA x DISPARADA.
(continuação deste post)
Vandré se destaca também, à época, pela extraordinária trilha musical do filme A Hora e  Vez de Augusto Matraga, de Roberto Santos, na qual pontificam "Réquiem para Matraga", "Modinha" ("Rosa, Hortência e Margarida") e a vigorosa “Cantiga Brava”.

Confirma a boa fase com “Disparada”, dele e Théo de Barros, uma das ganhadoras do 2º Festival da Música Popular Brasileira que a TV Record promoveu em setembro/outubro de 1966.

Épico sertanejo, “Disparada” coroa as pesquisas de Vandré no sentido de definir um idioma musical comum ao Centro-Nordeste e às pessoas egressas dessas regiões que se estabeleceram no chamado  Sul Maravilha, mas ainda traziam as marcas do êxodo rural.

É a saga do peão que, após longo tempo cumprindo tarefas subalternas (“na boiada já fui boi”), ascende a boiadeiro, “por necessidade do dono de uma boiada/ cujo vaqueiro morreu”.

Contar com uma montaria é uma verdadeira realização para aquele homem simples (“mas, o mundo foi rodando/ nas patas do meu cavalo”), até que, de repente, ele acorda de sua euforia e se descobre “valente lugar-tenente/ de dono de gado e gente”.
Clique p/ assistir à obra-prima de Roberto Santos, com trilha antológica do Vandré
E recusa a condição de braço-direito do latifundiário, “porque gado a gente marca,/ tange, ferra, engorda e mata,/ mas, com gente é diferente”.

A interpretação foi de Jair Rodrigues, a simpatia em pessoa. Não percebia, contudo, que o público explodia em aplausos no trecho "mas, com gente é diferente" como um desabafo contra a ditadura; sua inadequada reação era abrir um largo sorriso.  

E chamou a atenção o uso, como instrumento musical, de uma queixada-de-burro, na verdade mais uma atração exótica do que qualquer outra coisa.

“Disparada” dividiu o primeiro lugar com “A Banda”, de Chico Buarque, interpretada pelo autor juntamente com a Nara Leão.

Carioca radicado em São Pulo, Chico em pouco tempo saltou da boêmia universitária para a consagração nacional, apontado como um novo Noel Rosa.
As letras de precoce desencanto faziam a delícia das mocinhas românticas, como também sua timidez e os paparicados olhos verdes.

Suas composições mais características eram do tipo “Meu Refrão”, “Olê Olá” e “A Banda”, com lirismo, tristeza e rimas certinhas.

Vez por outra incursionava no campo das preocupações sociais, mais por influência do ambiente político que frequentava. O exemplo mais conspícuo é “Pedro Pedreiro”.

Fãs menos atentos acabaram identificando-o também com os poemas (de João Cabral de Melo Neto) que musicou para a peça famosa do Tuca, Morte e Vida Severina.

O público teve participação intensa neste festival, praticamente se dividindo no apoio à “Disparada” e “A Banda”. Como se estivessem num estádio de futebol, os torcedores hostilizavam o time adversário, xingando uns aos outros de bandidos e disparatados...

Por estreita diferença, o júri concedeu o 1º lugar a Chico Buarque que... insurgiu-se contra sua vitória!
Dela cientificado pelos organizadores antes de ser chamado ao palco para o anúncio da decisão, dignamente se recusou a aceitar o prêmio, por não considerar "A Banda" melhor do que "Disparada". Impasse estabelecido, a saída foi proclamaram ambas como vencedoras.

No 2º lugar, “De amor ou Paz”, de Luís Carlos Paraná e Adauto Santos, por Elza Soares.

3º, “Canção para Maria”, de Paulinho da Viola e Capinan, por Jair Rodrigues.

4º, “Canção de Não Cantar”, de Sérgio Bittencourt, pelo MPB-4.

5º, “Ensaio Geral”, de Gilberto Gil, por Elis Regina (um erro de cálculo do Gil: pensando que a fase ainda fosse de marchas-ranchos, inscreveu uma espécie de Porta-Estandarte 2...).

Como melhor letra ficou a belíssima “Um Dia” ("Eu não estou indo embora/ 'tou só preparando a hora/ de voltar"), do saudoso Caetano Veloso de antes do endeusamento e da máscara   na definição lapidar de Paulo Francis, o Caetano que era um ser humano vulnerável, sensível, e um dia foi parar na PE do Rio, “mas isto foi em outro país e aquele rapaz morreu”.
Segundo os jornais da época, a péssima (Que exagero!) dicção de Maria Odette prejudicou acentuadamente a classificação de “Um Dia”. 

Para fechar um grande ano desses certames, houve ainda o 1º Festival Internacional da Canção, em outubro, no Maracanãzinho (RJ).

Vitória da pífia “Saveiros”, de Dori Caymmi e Nelson Motta, por Nana Caymmi. Convencional, com impacto zero.

Mesmo não sendo nenhum assombro, a vice merecia melhor sorte: “O Cavaleiro”, de Geraldo Vandré e Tuca, na voz da segunda. O compositor paraibano continuava seguindo as pegadas de Guimarães Rosa, mas com uma abordagem cada vez mais politizada.

A seguir, “Dia das Rosas”, de Luís Bonfá e Maria Helena Toledo, com Maysa.

As agradáveis “Beira Mar” (Gil/Caetano) e “Minha Senhora” (Gil/Torquato Neto) passaram despercebidas.

(continua neste post)

Um comentário:

Anônimo disse...

meia oito era um personagem do cartunista Angeli sobre um tipico contestador dos anos 60 que ficou com a cabeça presa no ano de 1968..e parece que não ficou sozinho.

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