quarta-feira, 4 de setembro de 2024

PARLAMENTO NÃO E NUNCA SERÁ A CASA DO POVO!

 


C
ostuma-se dizer que o parlamento é a casa do povo. Tal denominação, que jamais foi assim entendida e considerada pelo povo, mas definida de modo astucioso pela constituição republicana, corresponde ao mais ignominioso embuste da democracia burguesa.  

Nunca, nem mesmo no início da revolução russa de 1917, o parlamento russo denominado como Duma, liderado inicialmente pelos mencheviques, teve representação que demonstrasse a equidade de participação das classes sociais. Foi necessário que Lenin, nas famosas teses de abril, denunciasse o seu caráter reformista burguês, apelando para que o poder legislativo fosse diretamente exercido pelos conselhos populares, formado por trabalhadores e revolucionários, também conhecido como sovietes. 

Uma lástima que desde a NEP – Nova Política Econômica – que admitiu concessões de práticas burguesas como forma de adaptação inicial à implementação do capitalismo de estado posterior, pós-revolucionária e proposta por Lenin, tenha provocado a continuidade de relações mercantis cada vez mais praticadas depois de sua morte precoce.  

Hoje a Rússia é o paraíso dos empresários bilionários, de lá e de fora, que adquiriram as estatais, e se tornou um país de governo militarista autocrata praticante de um capitalismo decadente. O capitalismo não perdoa: ajoelhou, tem que rezar, como dizia o velho Guerreiro, o Chacrinha. 

O parlamento é a casa das elites, que é onde se formulam leis em nome do povo e contra ele, de modo que se estabeleça a obediência isonômica por todos a estas regras feitas dentro do interesse do capital, algo assim como se um jogo entre Real Madrid com o Ibis, de Pernambuco, tivesse paridade de armas por jogarem sob regras iguais.          

No Brasil, portanto, não poderia ser diferente, fato que denuncia o caráter antidemocrático da democracia - tomando-se por termo o significado semântico que a palavra adquiriu sub-repticiamente. É por isso, entre outras razões, que nego meu voto, como protesto, e sem medo de ser feliz e tão pouco da direita.  

As eleições Parlamentares brasileiras de 2022 aprofundaram a tradicional predominância elitista de classes sociais no parlamento, e isto tem se transformado num tormento dentro do quadro de dificuldades de depressão capitalista mundo afora ao qual o Brasil não pode ficar imune, obviamente.  

Vejamos a composição das cadeiras na Câmara Federal, por partidos: 

Partido Liberal ....................................................... 92; 

Partido dos Trabalhadores .........................................  68; 

Partido União.......................................................... 58; 

PP – Partido Progressista ...........................................  51; 

MDB – Movimento Democrático Brasileiro......................... 44; 

Partido Republicano.................................................. 44; 

PSD – Partido Social Democrático................................... 44;  

PDT - Partido Democrático Trabalhista ........................... 18; 

PSDB - Partido da Social-Democracia Brasileira e Cidadania..  17; 

Partido Podemos....................................................... 15; 

Partido Socialista Brasileiro ......................................... 14; 

PSOL – Partido Socialismo e Liberdade ............................. 13; 

Partido Avante .........................................................   7; 

PC do B - Partido Comunista do Brasil..............................   7 

PRD - Partido Renovação Democrática .............................   5; 

Partido Solidariedade ................................................    5; 

Partido Verde...........................................................   5; 

Partido Novo ...........................................................   4; 

Partido da Rede Solidariedade ......................................   1; 

Sem partido ............................................................   1; 

Total de cadeiras ...................................................... 513  

Como se vê, há uma hegemonia de poder conservador configurado nas 326 cadeiras de partidos de direita, que equivalem a 63,5%; 61 partidos de centro, que equivalem a 11,8%, e 126 partidos de esquerda, que equivalem a 24,5% do total de cadeiras.  

Aí está a razão pela qual no Brasil, a direita, ao perder o controle do executivo, tenta reforçar o poder político do parlamento como forma de submeter as verbas orçamentárias discricionárias ao seu controle. Assim, o congresso nacional concede a ele mesmo o poder de derrubar decisões do supremo tribunal federal, ou seja, de eliminar do judiciário qualquer análise de descumprimento constitucional pelo parlamento.  

 Além de tentar aprovar, e de fato conseguir, leis absurdas como podemos citar a título de exemplos resumidos mais recentes: 

- Lei da privatização das praias; 

- criação e conservação da lei das desonerações fiscais previdenciárias das folhas de pagamento das empresas de 17 setores de grande empregabilidade, que abrange centenas de grandes empresas - substituiu a anterior CPP  - Contribuição Previdenciária Patronal -, e reduziu o pagamento de 20% sobre pagamentos de salários para 1% a 4,5% sobre a renda bruta de empreendimento - volume bem menor em valores -, a título de isenção fiscal empresarial previdenciária, fato que dificulta ainda mais as deficitárias contas previdenciárias e suas baixas pensões aos beneficiários - após uma grita geral contra tal benefício se formou o consenso de isenção total em 2024 e retomada gradual até 2027; 

- de liberação de áreas de proteção ambiental para o agronegócio;  

- análise e registro de agrotóxicos pelo Ministério da Agricultura tirando tal função do Ibama e da Anvisa, órgãos especializados (PL 6288/20)

- leilão de bens fora da esfera judicial, e que permite a ação administrativa para pagamento de dívida até de bens de família (PL 4188/21);  

- de constituir o parlamento como uma custosa rubrica orçamentária institucional em salários altamente discrepantes da realidade salarial dos trabalhadores e mordomias injustificáveis, tudo às custas da empobrecida bolsa popular que tudo sustenta através dos impostos que lhe são cobrados; 

- verba de R$ 4,9 bilhões para o fundo partidário das eleições e o perdão das multas partidárias;    

Isso tudo sem se falar nas tradicionais rachadinhas apropriação parcial dos salários de assessores por eles nomeados - e das comissões cobradas aos prefeitos nas obras superfaturadas resultantes das emendas parlamentares.    

O capitalismo é isso, a autotélica lógica de apropriação indébita da riqueza abstrata socialmente produzida - e que remunera seus agentes mais proeminentes, o grande empresariado - no seu desiderato de acumulação ad infinitum. Ora, se é assim, como poderia o parlamento ter natureza diferente da que tem, se sua função precípua é a elaboração de leis voltadas para a regulamentação e manutenção desse modo de relação social enquanto instituição do Estado burguês?!   

Há quem argumente, e com boas intenções, que os anticapitalistas de esquerda devem participar do parlamento como forma de se colocar uma cunha no conservadorismo parlamentar de sempre, e fazer proposições que estabelecem a diferença entre estes e aqueles; e este é um argumento que embute uma meia verdade que costuma ser um equívoco completo. 

Na verdade, ao participar de uma instituição que tem caráter burguês, e é eleita com o voto manipulado pelo poder político e econômico nos grotões mais distantes do centro de comando, e que sempre lhe concede maioria, os parlamentares de pretensa oposição sistêmica legitimam o jogo burguês parlamentar que se sabe de antemão vencido pelos seus adversários de classe. 

Uma vez investido como parte da casa, não podem denunciar o caráter parlamentar, porque se assim o fizessem, estariam ofendendo o famoso decoro parlamentar e, também, porque não se pode denunciar a prostituição dentro de um prostíbulo, se me permitem o exagero. Além do mais, os salários e verbas partidárias sustentam muita gente que por dependência econômica beija a mão de quem segura o chicote.  

São muitas as contradições que nos transformam em gado no corredor do matadouro. A primeira delas é a aceitação do trabalho abstrato, que se constitui como o artífice de todo o edifício capitalista e da forma valor; nossa presença no parlamento é apenas mais uma delas. 

Os sindicatos, por exemplo, ao invés de clamarem por mais empregos e salários, deveriam clamar pelo fim destas duas categorias capitalistas, e este é mais um comportamento dentro do espectro de boas e infrutíferas intenções.    

A luta política dentro da imanência capitalista sempre naufraga no vazio da sua inconsistência. Abaixo a casa das elites! (por Dalton Rosado) 

Um comentário:

Anônimo disse...

Grande Dalton!
Feliz em vê-lo incorporando a Teoria dos Jogos ao seu discurso:
*
"algo assim como se um jogo entre Real Madrid com o Ibis, de Pernambuco, tivesse paridade de armas por jogarem sob regras iguais".
***
É a paridade de possibilidades que determina q um jogo é honesto.
Não havendo paridade, o jogo é, logicamente, desonesto.
*
Nem precisa ser político para saber disso.
Avante!
***
SF.
*

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