Fizemos duas grandes revoluções marxista-leninistas e anticapitalistas - na Rússia em 1917 e na China em 1949 - em nome da busca - projeto de transição, grifamos - para uma sociedade comunista na qual não houvesse estado, partidos políticos, valor e extração de mais valia pelo trabalho abstrato, e nem trabalhador, e instituíssemos uma sociedade sem classes sociais.
Tais revoluções ocorreram em dois países gigantescos territorialmente, que puderam se fechar intramuros e sobreviver isolados da economia mundial de mercado graças à potencialidade de seus recursos naturais.
Se é verdade que tais revoluções, com seus isolamentos, conseguiram promover um resgate da miséria secular a que eram submetidos seus povos em regimes semifeudais, praticando um capitalismo de estado com mercado monopolista e propriedade estatal dos meios de produção, cumprida essa etapa, o uso do cachimbo entortou a boca, ou seja, desviaram-se dos objetivos iniciais para aprofundarem práticas capitalistas abrindo-se à economia de mercado agora pretendendo se constituir como bloco capitalista em disputa hegemônica com o ocidente, sob a forma política de regimes autocratas.
Como se pretender que a Rússia de hoje, com pouca densidade demográfica e governada por autocratas que privatizaram as empresas estatais e criaram alguns bilionários como seus donos, pretendendo ser um império através de guerras de conquistas - caso da invasão da Ucrânia, entre outras inciativas belicosas - seja um bom exemplo a ser seguido?!
A China tem uma história parecida com a da Rússia - com o diferencial de uma população 10 vezes maior que essa última - vez que em 1949 fez a revolução em nome do marxismo-leninismo sob Mao Tse Tung que se alinhou com o modelo de Josef Stalin seguindo o mesmo caminho do fechamento intramuros e saindo da miséria secular dos mandarins chineses.
Mas quem não rompe com as categorias capitalistas termina por se subordinar a elas. Depois da morte do seu condutor revolucionário, e pelo revisionismo de Deng Xiao Ping, seu sucessor em 1976, a China promoveu a grande virada para o capitalismo de mercado, tornando-se um país altamente industrializado e urbano, melhorando a renda per capita do seu povo - que ainda é baixa, pouco maior que a brasileira, num país que é o segundo maior PIB mundial (USD 12,9 mil) e a nossa em USD 8,9 mil -, e agora, por conta dessa opção, tem que lidar com os problemas próprios do capitalismo decadente de hoje cujo desfecho será turbulento.
A China se tornou um polo capitalista do qual tenta ser a locomotiva a partir dos BRICs e de uma moeda que desloque a centralidade do dólar estadunidense tentando cooptar países para seu eixo, a exemplo do Brasil de Lula, que a ela se alinha, tentando mudar de patrão. Com essa estratégia, ao invés de caminharmos para uma sociedade comunista, estamos a prenunciar um cataclisma econômico-financeiro mundial cuja antevéspera são os anúncios diários de terceira guerra mundial com potencial de aniquilamento da espécie humana. Uma lástima!
Ora, se após uma vitoriosa revolução em nome do marxismo-leninismo, que empoderada adotou uma nova e estatizante formação política, pretensamente anticapitalista e operária, mas conservando nas suas práticas de produção todas as categorias capitalistas tivemos o resultado que conhecemos, o que podemos dizer da perspectiva de uma administração pela esquerda do aparelho de estado eleito e gerenciado sob regras constitucionais burguesas, republicanas, e num momento de depressão econômico-financeira mundial?
Se a administração política do aparelho de estado sob o capitalismo fosse capaz de promover minimamente o bem-estar social do povo mundo afora, e não apenas nos países ilhas de hegemonia do capital, a direita, que conhece com experiência secular esse mister, jamais seria desapeada desse poder político serviçal do próprio capital; eles fracassam, apesar de todo o apoio nacional e internacional de mercado, porque a equação capitalista é irresolúvel.
Quando a esquerda administra os aparelhos burgueses de estado, e dentro da ordem constitucional burguesa, sejam eles municipais, dos estados membros, ou da união, não apenas se prestam a administrar a crise do capital mas, também, terminam sempre por se desgastar perante o povo, que passa a descrer no seu discurso de emancipação e atendimento eficaz de suas carências básicas.
Os acomodados adeptos da participação política da esquerda sob regras constitucionais burguesas, haverão de argumentar que se assim não atuarmos, tudo ficaria muito pior. Assim tem sido o caso da esquerda que se obriga a conviver com as constantes ameaças da direita no Brasil e no mundo, que tem recebido apoio popular ouvindo as suas falácias retrogradas como se representasse o novo desconhecido. A orientação e dedução passadas é de que se não entrarmos no jogo vamos perder por WO para o inimigo.
Ora, tal argumento conspira contra ele próprio porque como vamos poder superar o mal capitalista atuando sob seu modo de produção social e exploração humana e na administração política de sua crise, por pretendemos atuar de modo mais humanizado num regime desumano por natureza e por temermos uma administração política de direita sem a menor sensibilidade humanista?
Tal opção representa uma bem-intencionada alternativa fadada ao fracasso, e isso se não for apenas a resultante de um acomodado faz-de-conta de oposição capitalista para a obtenção das migalhas financeiras e de cargos na administração pública como forma de sustentação de um projeto político que quer mudar alguma coisa para que tudo permaneça da mesma forma como está.
odo governante, por mais autoritário que seja, se preocupa com o grau de sua aprovação e aceitação governamental, porque sabe, desde há muito, que há que se ter pão e circo numa quantidade mínima de sobrevivência dos súditos para a sua própria manutenção no poder, sem precisar da força das armas, que não hesitará em usar caso necessário.
Não se trata, portanto, de uma questão de boa ou má-intenção das partes envolvidas no processo político-administrativo do aparelho de estado burguês, mas da submissão implícita à lógica autotélica do valor que se transforma em capital e que necessita de acumulação contínua para fazer valer a sua credibilidade enquanto forma abstrata de controle da riqueza material por ele apropriada - instituto jurídico da propriedade das mercadorias - de modo a subjugar os que a administram, seja de modo privado ou estatal.
Para aqueles que querem transformar o status quo atual a pergunta que não quer calar é: como mudar esse jogo?A primeira coisa que se deve ter é consciência da causa do problema para se conjecturar a sua solução. Nenhum médico cura e erradica o mal do paciente sem analisar a doença e sua causa. Aqui a causa da doença social é o modo de produção capitalista que forma o modo político à sua semelhança e interesse. Não se desconstrói o segundo sem se desconstruir o primeiro.
Nada mais revolucionário do que o saber. Bastaria que os trabalhadores fossem conscientes das suas condições de artífices do capital que os subjugam e parassem os seus braços, para que em pouco tempo ruísse o majestoso e presumivelmente indestrutível edifício do capital e de suas instituições.
Que tal começar pela negação do voto enquanto canal de acesso às instituições burguesas, e a elas mesmas, que sustentam o capital? (por Dalton Rosado)
Um comentário:
Olá, Dalton
Acredito que a crítica marxista do Capital é uma bússola, um norte para todas as pessoas que querem entender como o mundo funciona (aspectos socio-econômicos).
Mas, infelizmente, essa não é a visão de nosso presidente:
"Em outro momento de sua fala, Lula disse que não é marxista, mas sim, capitalista."
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2024/09/lula-critica-concentracao-de-riqueza-ao-lado-de-bill-gates-nos-eua.shtml
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