Com o ditador Médici, passeando. |
Delfim ocupou o cargo de ministro da fazenda entre os anos de 1967 e 1974, justamente os períodos de maior repressão do regime. Nessa época, ajudava a levantar fundos junto aos empresários brasileiros e estrangeiros para financiar a Operação Bandeirantes (OBAN) responsável por milhares de casos de tortura, assassinatos, estupros e desaparecimentos contra combatentes da resistência armada, militantes da esquerda, simpatizantes, sindicalistas e quaisquer outros que o regime militar viesse a perceber como ameaça.
É dessa época uma das mais famosas frases da história nacional e emblemática, ao mesmo tempo, do fiasco econômico brasileiro e de sua desigualdade intrínseca e que teve Delfim por autor. Diante do quadro de crescimento acelerado da economia brasileira na época, momento conhecido por "milagre brasileiro", crescimento, contudo, contrastante com a abissal condição de miséria da maioria esmagadora do povo, o então Czar da economia soltou a famosa pérola: "é preciso esperar o bolo crescer para dividi-lo".
Com a nata da ditadura em São Paulo. |
É esse o contexto do aparecimento das guerrilhas, impulsionadas pelo clima de crise. Para sobreviver, o regime ditatorial, com Delfim Netto à frente, abandona a liberalização estrita dos primeiros anos e embarca no processo expansionista, contraindo empréstimos no exterior, impulsionando titânicas obras públicas, expandindo a indústria e mesmo ensaiando a criação de estatais. A tática dá certo e um clima de euforia se instala no país com a economia aquecida, levando as guerrilhas e as oposições ao isolamento.
Sem nenhuma coincidência, o milagre malogra por volta de 1974, após o choque do petróleo, mas também no mesmo período em que o restante das guerrilhas é derrotado. A economia do país entra em parafuso, a dívida externa explode e emerge a hiperinflação, resultando em nova crise da ditadura, dessa vez irreversível. Inicia-se, então, longo período de transição política em que o regime vai se transmutar em democracia, mantendo, contudo, intocadas as estruturas econômicas, institucionais e políticas implementadas.
Era o conselheiro econômico de Lula. |
Em tudo isso, Delfim Netto teve papel central. Ele foi o articulador orgânico da relação intrínseca entre a repressão política e a política econômica que a sustentou. Não à toa, era ministro da fazenda, mas também um dos idealizadores do AI-5 e das operações repressivas.
Após a ditadura, foi marginalizado diante do desastre de seu legado, só saindo dessa situação graças a Lula e ao PT que viam nele um guru e consultor econômico. Chegou mesmo a ser um articulista da revista Carta Capital, supostamente uma revista inimiga do regime militar e da direita dali advinda.
Confirmou o dito que os perversos vivem mais, pois sobreviveu por 91 anos. Mas, enfim, finalmente está agora nas terras do inferno e passou a ser responsabilidade do capeta. (por David Coelho)
Um comentário:
Perfeito, David! Mas, lendo os necrológios louvaminhas de direitistas, quero acrescentar algo sobre o caráter (ou falta de) do Delfim Netto.
É falso que ele haja sido o pai do fugaz "milagre brasileiro", que só durou até 1973 mas cumpriu sua finalidade de consolidar o governo até então cambaleante dos generais ditadores.
Os verdadeiros pais foram o ministro do Planejamento Roberto Campos e o da Fazenda, Octávio Gouveia de Bulhões. O primeiro como estrategista e o segundo como gestor .Ambos modernizaram a economia brasileira no figurino capitalista, botando ordem na casa e criando condições para o crescimento do PIB.
Delfim Netto pegou o bonde andando e, embora fosse também um liberal em termos de economia, não teve escrúpulo nenhum em abrir os cofres da União para bancar grandes projetos perdulários e que, quase todos, fracassaram.
Quando Roberto Campos constatou que a ditadura guinava para a demagogia econômica ufanista, entregou o cargo. Já Delfim Netto serviu fielmente a quem estava no poder, chegando ao cúmulo de, depois de perder espaço nas Pastas para os quais estava qualificado (Fazenda e Planejamento), aceitar ser ministro da Agricultura, o que não tinha nada a ver com sua trajetória. Era do tipo que limparia até latrinas para se manter próximo ao poder.
Ambos foram igualmente inimigos dos nossos ideais, mas Roberto Campos teve a dignidade de não servir a governos que contrariavam suas crenças econômicas, preferindo continuar defendendo-as firmemente em livros e textos jornalísticos. Não era um pistoleiro de aluguel qualquer.
Já Delfim Netto sempre esteve à venda para o poderoso que pagasse mais. Inclusive o PT, pois foi ele o sujeito oculto da gestão econômica de Antônio Palocci, que sozinho não conseguiria administrar direito nem um brechó.
A parceria inconfessada entre Delfim Netto e o PT estava escrita nas estrelas.
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