No dia 5 de
dezembro de 1955, o menino negro Emmett Till, de 14 anos, foi assassinado por
dois brancos, acusado de ter se insinuado a uma mulher branca. Foi surrado, levou um tiro de pistola .45, teve um olho arrancado e o pescoço amarrado com arame farpado a um peso para que
afundasse no rio Tallahatchie. O assassinato aconteceu em Money, no Mississippi,
onde mais de 500 casos de inchamento de negros haviam sido documentados desde
1882.
Naquele mesmo 5 de
dezembro, Martin Lugher King foi eleito presidente da Associação pelo Progresso
de Montgomery, uma pequena semente do movimento por direitos civis que varreria
os Estados Unidos e teria Luther King como a principal liderança até o seu
assassinato em Memphis, no ano de 1968.
Rosa
Louise Parks fez a introdução ao discurso de Luther King como presidente
da instituição. Antes, a atitude de Rose
Parks, de não ceder seu lugar a brancos
no ônibus, havia sido a semente de movimentos
por direitos civis por todo o país. Morreu no furacão Catrina.
Em 3 de maio de 1963, 6 mil crianças marcharam pela cidade de Birmingham, em lugar de
milhares de manifestantes que haviam sido presos. A resposta da polícia veio
com cassetetes, jatos de água e cachorros ferozes contra a turba infantil.
Em agosto desse ano mais de 200 mil
pessoas se reuniram em frente ao Memorial Lincoln, em homenagem a Abraham
Lincoln, o indeciso presidente norte-americano que, enfim, um dia levou à
frente a causa da abolição. Luther King disse então: Eu tenho um sonho. Eu
tenho um sonho de que um dia esta nação experimentará o verdadeiro significado
de sua crença, de que todos os homens são criados iguais.
Em 22 de setembro
de 1862, Abraham Lincoln assinou a lei que vigoraria a partir de 1º de janeiro de
1863, intitulada Proclamação da Emancipação, que libertou o negro do cativeiro da
escravidão física.
Cem anos depois, no entanto, o negro nos Estados Unidos da
América ainda não é livre, vive isolado numa ilha de pobreza em meio a um vasto
oceano de prosperidade material, abandonado nos recantos da
sociedade na América, exilado em sua própria terra.
E vocês sabem, meus amigos,
que chega a hora em que as pessoas se cansam de ser pisoteadas pelo pé de ferro
da opressão. Chega a hora, meus amigos, em que as pessoas se cansam de ser
lançadas no abismo da humilhação, onde vivenciam a desolação de um pungente
desespero. Chega a hora em que as pessoas se cansam de ser alijadas do
brilhante e vívido sol de julho e abandonadas ao frio cortante de um novembro
alpino. Assinado, Martin Luther King (*).
Proclamamos com
orgulho que ¾ da população mundial são formados por pessoas de cor. Nosso
objetivo não deve ser derrotar ou humilhar o branco. Não devemos nos tornar
vítimas de uma filosofia da supremacia negra. Deus não está interessado em
libertar apenas o negro, o pardo e o amarelo, pois Deus está interessado em
libertar toda a raça humana.
Luther King discursa na Marcha sobre Washington (1963) |
Devemos agir de maneira tal a tornar possível a
união de brancos e negros num alicerce de verdadeira harmonia de interesses e
compreensão. Devemos buscar a integração com base no respeito mútuo. À medida
que lutamos por justiça e liberdade temos a companhia cósmica. Cada homem, do
negro mais grave ao branco mais agudo, é importante no teclado do Senhor. Assinado, Martin Luther King
Atentado a bomba
cometido pela Klux Klu Klan à igreja Batista em Birmingham, em 1954, matou
quatro meninas negras durante um culto – Addie Mãe Collins, Carol Denise McNair
, Cyntia Diane Wesley e Carole Robertson. A morte dessas meninas possivelmente
conduzirá todo o nosso Sul da mais baixa estrada da desumanidade do homem à
mais elevada estrada de paz e da fraternidade. Estas mortes trágicas
possivelmente conduzirão a nossa nação de uma aristocracia da cor a uma
aristocracia do caráter.
Não devemos perder a fé em nossos irmãos brancos. De
algum modo, precisamos acreditar que os mais desnorteados dentre eles podem
aprender a respeitar a dignidade e o valor de cada personalidade humana.
Cheguei à conclusão de que esta premiação, o Prêmio Nobel, que recebo em nome
desse movimento, representa um profundo reconhecimento de que a não-violência é
a resposta à crucial questão política e moral de nosso tempo – a necessidade de
o homem transcender a opressão e a violência sem recorrer à violência e à
opressão. Assinado, Martin Luther King.
Em 7 de março
de 1965, seiscentos negros foram brutalmente atacados na cidade de Selma. A
polícia estadual avançou sobre os manifestantes, espancou-os com chicotes e
pisoteou-os com cavalos. Foi o chamado Domingo Sangrento. No dia seguinte, Luther King fez apelo a
lideres religiosos de toda a nação para que percorressem o mesmo caminho do Domingo Sangrento. Mais de mil padres, rabinos, freiras e pastores atenderam a
seu apelo.
A chuva nos deixou encharcados. Nossos corpos estão fatigados,
nossos pés, doloridos. Nossos pés estão cansados, mas nossas almas, não - disse
Luther King em seu discurso – nunca houve um momento na história americana mais
digno e mais inspirador do que a peregrinação de religiosos e leigos de todas
as raças e de todas as crenças que afluíram a Selma para enfrentar o perigo ao
lado dos negros oprimidos.
A segregação
entre raças foi uma estratégia dos emergentes conservadores sulistas para
dividir as massas e baratear a mão-de-obra. Era simples manter as massas de
brancos pobres trabalhando por um salário de fome nos anos que se seguiram à
Guerra Civil, pois, se os humildes trabalhadores rurais brancos ficassem
insatisfeitos com os seus baixos salários, os poderosos fazendeiros
simplesmente ameaçavam demiti-los e contratar, por um salário ainda menor, um
ex-escravo.
Segregaram o dinheiro sulista dos brancos pobres, segregaram os
costumes sulistas dos brancos ricos, segregaram as igrejas sulistas do cristianismo, segregaram as mentes sulistas do senso de justiça, segregaram o
negro de tudo o mais. Assinado,
historiador C. Vann Woodward.
O assassinato impune de Eric Garner |
Perguntou Martin
Luther King: por quanto tempo mais o preconceito cegará a visão do homem,
escurecerá o seu entendimento, afastará a iluminada sabedoria do seu trono
sagrado? Quando a justiça ferida, prostrada nas ruas de Selma, de Birmingham e
de todas as comunidades do Sul, levantar-se-á da poeira da vergonha para reinar
suprema entre os filhos dos homens? Quando a radiante estrela da esperança será
arremessada contra o escuro seio dessa noite solitária, extraída das almas
fatigadas pelos grilhões do medo e pelas algemas da morte? Por quanto tempo
mais será a justiça sacrificada diante da tolerância da verdade?
Sim, quando? O cenário nos Estados Unidos atual ainda são os velhos protestos de negros por todo o país e a repressão dos brancos contra eles, como nos velhos tempos de Luther King. Ainda agora, nos meses finais de 2014, Michael Brown, 18 anos, foi morto a tiros pela polícia em Ferguson; Akair Gurley, 28 anos, a polícia o matou com um tiro no peito na descida de uma escada em Brooklin; Eric Garner, 43 anos, asmático, obeso, desarmado, foi esganado por um policial em Nova Iorque. Este episódio, o mundo inteiro, pateticamente entristecido, assistiu pela televisão e redes sociais e viu que o ódio pelo negro na terra do Tio Sam ainda está vivo.
Quanto à enorme quantidade de negros que os Estados Unidos enviaram para a morte no Vietnã, é uma das nossas maiores vergonhas. Assinado, Martin Luther King.
Grande parte da abrangente e poderosa mensagem de Luther King corre o risco de ser abandonada à medida que novas gerações entram em contato com ele apenas por meio da história e o vêem mais como um mito do que como um homem. A vida e a obra de Luther King ainda são relevantes para compreender a complexa realidade dos problemas atuais e se permitirmos que a riqueza de seu exemplo se apague, perderemos a oportunidade de continuar aprendendo com ele. Assinado, Edward Kennedy.
* todas as citações de Luther King foram extraídas do livro Um apelo à consciência – Os melhores discursos de Martin Luther King (Jorge Zahar Editor, 2006, 184 p.)
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