Ao criar sua majestosa Noite Estrelada, Van Gogh teve de buscá-la na memória, pois no sanatório em que estava internado não lhe permitiam pintar no quarto de dormir. |
A DITADURA DO FETICHISMO DA MERCADORIA
Não há ditadura maior do que o fetichismo da mercadoria. Isto porque se processa na mente, ainda que seja auxiliada pelas armas e por estas imposta desde o seu surgimento.
Mesmo diante da intensificação das alterações climáticas causadas pelo aquecimento global, para o qual concorrem principalmente as duas locomotivas capitalistas do mundo (Estados Unidos e China) e a omissão dos fóruns internacionais que deveriam priorizar a salvação da espécie humana, o capital segue em frente na sua faina autofágica.
Assim é que o Rio Grande do Sul padece sob tempestades de chuva e vento que matam e desabrigam dezenas de milhares de pessoas.
Paralelamente, intensificam-se as guerras com poderio bélico, com poderio bélico cada vez mais avassalador; e também podemos sucumbir como espécie graças a uma guerra nuclear que volta a nos assombrar como nas décadas de 1950 e 1960, quando os cidadãos chegavam a adaptar os porões de suas casas para servirem de abrigos atômicos quando acontecesse o pior.
A que se deve o flagelo da guerra, senão à ambição de poder e riqueza decorrente do fetiche da mercadoria, embrutecendo o ser humano e tangendo-o de forma inexorável para a morte?
Por que se gastam milhões na produção de armamentos:
— senão para gerar o lucro da venda de tal produção e possibilitar que algumas nações armadas até os dentes submetam os países com menor poder de fogo?
— senão em razão dessa coisa absurda que é a coisificação da vida pelo processo de mercado, com a morte sendo celebrada no altar do fetichismo da mercadoria, o santo graal da modernidade decadente?
O jovem estadunidense que deixou sua vida e seu sangue derramado nas terras vietnamitas, ou voltou mutilado no corpo e/ou na alma por matar pessoas que desconhecia, é igual aos russos e ucranianos que deixam seus sonhos de amores e realizações nos campos de trigo do país invadido.
Entretanto, Lyndon Johnson e Vladimir Putin, títeres da tirania política do capital, justificaram e justificam a morte em nome de uma hipotética vida coletiva que eles afirma(ra)m estar ameaçada, sem explicar que eram/são movidos por uma engrenagem política a serviço do capital, do qual são obedientes representantes teleguiados por uma esquizofrenia demoníaca que lhes dá ordens repulsivas, e que consiste no fetichismo da mercadoria.
A vida sob o regime de produção de mercadorias ilude a todos como o sonho do apostador em loterias que faz planos para gastar a dinheirama que pretende ganhar graças àquele bilhete e que, assim, continua a jogar mais para manter viva sua esperança, ainda que as possibilidades estejam esmagadoramente contra ele.
O êxodo de jovens russos avessos a arriscarem suas vidas numa mera guerra de conquista atesta o fracasso da propaganda oficial que tenta convencê-los da existência de objetivos nobres como a defesa da pátria. Cresce cada vez mais o número dos convictos da iniquidade dessa guerra.
Heróis são os que têm a coragem de dizer não à matança bestial, ainda que isto lhes custe as piores perseguições.
Os protestos contra os massacres israelenses aos palestinos em Gaza, nos campi das universidades estadunidenses de Columbia e Nova York, foram reprimidos por policiais obedecendo ordens políticas que justificaram (falaciosamente) tais atos como sendo necessários para retomada do campus, que sofreu atos perturbadores de violência, formas de intimidação e destruição de propriedade.
Certo estava Bertold Brecht: Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.
Há uma violência intrínseca à forma-mercadoria que é pouco percebida em razão da sua aparente neutralidade, ou seja, por apresentar-se como um fato social aparentemente ingênuo e benfeitor: a produção de objeto que, transformado em mercadoria, atende ao consumo e satisfação de uma necessidade social, humana. Só que, ao fazê-lo de modo meramente oportunista, encobre a essência de seu conteúdo de segregação social.
Assim, a necessidade humana de tais ou quais produtos é utilizada para se obter a escravização indireta pelo trabalho abstrato produtor de mercadoria e mais-valia. que concentra a riqueza material transformada em riqueza abstrata e assim viabiliza a acumulação excludente do capital.
Tem, portanto, sua essência configurada como um vírus corrompedor de toda a sociedade, responsável pela decomposição da alma humana.
A mercadoria tem valor de uso e valor de troca, que se consubstanciam como acumulação excludente de valor do tempo-trabalho nela hipostasiado, daí decorrendo a acumulação de capital num processo de necessária reprodução continua que tende ao infinito, mas que termina por esbarrar na finitude do consumo humano e nas contradições que lhes são imanentes, tornando-se socialmente destrutiva e, por fim, autodestrutiva de sua forma fantasmagórica.
É a segregação social da forma-mercadoria e seus paradoxos existenciais que se manifestam nas disputas de mercado, com cada capitalista produtor e detentor da sua mercadoria tentando excluir os seus concorrentes, após explorar o trabalho abstrato e o tempo-valor de quem a produz. Ou seja, trata-se do eterno motor da guerra entre os homens teleguiados pela ditadura da riqueza abstrata nela contida e à qual os homens servem politicamente.
É inaceitável falar-se em democracia como sinônimo de expressão da livre vontade coletiva, se nas tais eleições livres são escolhidos governantes que nada governam, mas que são, isto sim, governados a priori por uma relação social ditada pelo fetichismo da mercadoria, que a tudo corrompe socialmente.
Quando um governante se corrompe, apropriando-se indebitamente dos impostos estatais do aparelho de estado que serve à grande e abrangente corrupção da forma-mercadoria (leia-se capitalismo), seja para si ou para a manutenção política do seu partido, ele está estabelecendo uma concorrência com o Deus a que serve politicamente (o aparelho de estado nada mais é do que um serviçal do capital).
Daí existir um constante frisson entre a necessidade de reprodução do capital e a debilidade de sua cidadela protetora, o estado, quando subtraída pela corrupção política.
Sergio Moro e seus amigos do Ministério Público, manipulando o processo criminal pelo uso de arbitrariedades na instrução processual, pareceram falsa e equivocadamente ser benfeitores sociais, pois o grande público era induzido por um processo midiático político-judicial parcial e faccioso a crer que se combatia realmente a corrupção com o dinheiro dito público (o qual não pertencia ao público público e, para piorar, a corrupção jamais deixou de existir e ainda existe).
O episódio da Lava-Jato deixará como legado, para os historiadores futuros, a conclusão de que enquanto perdurar a forma-mercadoria como sistema social de produção, existirão:
— o facciosismo judicial hipócrita;
— a corrupção sistêmica inerente ao próprio capital; e,
— de quebra, a corrupção política e do crime organizado, que se confundem por objetivos comuns, quais sejam o poder do dinheiro e seu poder derivado sem soberania de vontade, a política.
O dinheiro, única mercadoria sem valor de uso, é a representação numérica da abstração valor que comanda negativamente a vida social real e que somente se reproduz pela fórmula da crítica marxista: dinheiro que se transforma em mercadoria, que se transforma em mais dinheiro.
Trata-se de um processo que tende ao infinito, até esbarrar na ilogia de sua própria essência destrutiva e autodestrutiva. Tal crítica, vale dizer, jamais foi observada pelos maus intérpretes, ditos marxistas, dos ensinamentos de Karl Marx, o sábio barbudo judeu-alemão antissionista (tal qual Albert Einstein).
Mas, ainda há esperança. Afinal, é na escuridão da noite sombria que melhor podemos ver brilharem as estrelas! (por Dalton Rosado)
Um comentário:
La gran victoria del capitalismo es resignificar la idea de libertad legitimando relaciones de dominación
https://www.elsaltodiario.com/movimiento-obrero/alex-gourevitch-gran-victoria-del-capitalismo-es-resignificar-idea-libertad-legitimando-relaciones-dominacion
Municípios que tiveram mais mortes por covid mantiveram voto em Bolsonaro em 2022
https://www.ihu.unisinos.br/639559-municipios-que-tiveram-mais-mortes-por-covid-mantiveram-voto-em-bolsonaro-em-2022?utm_campaign=newsletter_ihu__20-05-2024&utm_medium=email&utm_source=RD+Station
Municípios que tiveram mais mortes por covid mantiveram voto em Bolsonaro em 2022
https://www.ihu.unisinos.br/639521-extensao-territorial-e-numero-de-afetados-tornam-tragedia-no-rs-inedita-no-brasil?utm_campaign=newsletter_ihu__20-05-2024&utm_medium=email&utm_source=RD+Station
Postar um comentário