E a manhã tropical se inicia
Resplendente, cadente, fagueira
Num calor girassol com alegria
Na geléia geral brasileira
Que o Jornal do Brasil anuncia"
(Gilberto Gil)
Só que, desde ontem (31/08), o Jornal do Brasil nada mais anuncia -- pelo menos da forma como anunciou durante 119 anos.
Vou ser sincero: nunca tive grande apreço pelo JB, que me parecia o Estadão carioca. O jornal da elite que levava a sério o seu papel de elite.
[O Globo, por sua vez, estaria mais próximo da cupidez amoral da Folha de S. Paulo que, com exceção dos poucos anos em que teve um diretor de redação de verdade -- Claudio Abramo --, foi sempre um jornal feito por comerciantes com critérios de comerciantes, como candidamente reconheceu certa vez Carlos Caldeira, sócio do Frias pai.]
Lamentei mesmo foi o fim do Correio da Manhã, sufocado pela ditadura militar -- a mesma que o JB saudara como instalação da "verdadeira legalidade".
E do Pasquim, com o qual aprendi pra sempre a ser desafinado.
E da Tribuna da Imprensa, que preenchia sua capa inteira com os mais caudalosos e veementes desabafos contra o regime dos gorilas (os editoriais assinados por Hélio Fernandes), quando, jovem, eu tentava manter viva a resistência à tirania na Cidade Maravilhosa.
E do Jornal da Tarde, que rejuvenescia e sofisticava o jornalismo paulistano durante a primavera de 1968, mas feneceu irremediavelmente nas décadas seguintes, até chegar à existência vegetativa de hoje em dia. Para quem o conheceu no apogeu, o JT atual mais parece zumbi de filme do George Romero...
Os grande jornais em papel, aliás, estão todos na mesma situação: já morreram e estão à espera de quem os enterre.
Abdicaram das boas práticas jornalísticas, passando a subjugar notícia, interpretação e opinião, indistintamente, aos interesses, valores e jogadas sujas do capitalismo, passando como motoniveladoras sobre o outro lado, o direito de resposta, a isenção, o equilíbrio, etc.
Hoje estão mais para house organs do sistema, com editoriais explícitos no espaço de Opinião e implícitos no restante das páginas.
Na geléia geral brasileira, neste país que já não sonha com uma existência humanizada e só quer maquilar o pesadelo capitalista com cosméticos reformistas, os afetos vão se encerrando um a um, até que nada mais sobre exceto a necessidade de redimirmos e reconstruírmos tudo.
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