Era um sonho para ele voltar a ser campeão de Wimbledon, seu torneio preferido... |
Tive até vontade de chorar junto com Roger Federer quando ele, ao enxugar-se depois da conquista de sua 19ª taça de um torneio de Grand Slam e do seu oitavo título no templo mais tradicional do tênis (o All England Club), ocultou durante um tempinho a face com a toalha, mas, percebendo que o artifício não enganaria ninguém, pôs à mostra, para o público e as câmeras, os previsíveis olhos avermelhados.
Campeão de Wimbledon sem perder nenhum set, a três semanas de completar 36 anos, ele é capaz de dar exibições primorosas mesmo enfrentando tenistas de duas gerações posteriores à sua (seus filhos e seus netos, digamos). Já superou todos os desafios possíveis e imagináveis na carreira. É um pulverizador de recordes e não se vislumbra ninguém em quadra hoje com possibilidade de alcançá-lo nos dois principais do tênis, os 19 Grand Slam e as 302 semanas como nº 1 do mundo.
Merece ser chamado de rei, como o é nas redes sociais. Merece ter a torcida do mundo inteiro a seu favor ou dividida entre ele e o esportista da casa, como sempre acontece (mesmo os que torcem contra, fazem-no com o respeito que se deve a uma lenda viva).
...o primeiro da categoria Grand Slam que ele conquistou, há longínquos 14 anos. |
Começou como pegador de bola e passou o resto da vida no universo do tênis, esporte que, para ele, é muito mais do que um ganha-pão ou uma satisfação de ego: está mais para uma religião à qual se devota com a singeleza de uma criança em dia de festa.
Depois de estabelecer um domínio avassalador na década passada, começou a encontrar dificuldades cada vez maiores à medida que os adversários passaram a contrapor, à sua técnica esmerada, a potência nos golpes, a disposição física e a determinação titânica. Parecia que, como em outros esportes, a arte seria sobrepujada pela força.
Desconcertado, ele passou tempos ruins e parecia a caminho da decadência. Mas, em qualquer momento decidiu que, ao invés de se conformar, ralaria como um principiante até reconquistar a hegemonia perdida.
Ignoro como ele se reconstruiu em termos mentais, para voltar a ter uma atitude vencedora nos momentos decisivos das principais partidas, após passar vários torneios morrendo na praia e se desesperando com isto.
Em termos técnicos, trabalhou duro. Mudou raquete, mudou técnico, mudou estilo de jogo, mudou o critério de escolha dos torneios de que participaria. Para não ficar em grande desvantagem contra os mais jovens em partidas longas, o jeito era atuar de forma tão agressiva que vencesse o máximo delas por 2x0 ou 3x0, sempre poupando forças para o confronto seguinte.
E, para manter-se competitivo face às exigências físicas cada vez maiores, cortou vários torneios do seu calendário, inclusive a temporada inteira de saibro (no corrente ano), por ser aquela na qual corre mais risco de sofrer ou agravar contusões. Enquanto isto, os efeitos dos esforços excessivos estão castigando impiedosamente campeões como Novak Djokovic (30 anos) e Andy Murray (30 anos).
Resumo da opereta: mantendo a excelência quando já deveria ter pendurado a raquete há um bom tempo, Federer está conseguindo vencer todos os torneios importantes que disputa em 2017. Um fenômeno. Deixou sem remorsos Roland Garros para o rei do saibro Rafael Nadal, foi brilhante na Austrália e simplesmente implacável na Inglaterra.
Curiosamente, nas entrevistas dos últimos dias, ele comentou que, dos quatro semifinalistas de Wimbledon, os outros três eram mais fortes e mais altos do que ele, "talvez logo venha a ser necessário aumentar a altura da rede".
Aí foi para a quadra e provou que juventude, força e altura não bastam contra o melhor de todos os tempos.
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