segunda-feira, 29 de maio de 2017

O LADO NEGRO DOS CONTOS DE FADA...

...é enfocado numa excelente série do blogue Rebobinando Memória, pertencente ao compositor, sonoplasta e
operador de áudio Marcos Mariano (a íntegra
pode ser acessada aqui e aqui). 

Como a reportagem do Mariano praticamente complementa esta crônica do Apollo Natali e se trata de assunto 
muito interessante,  decidi reproduzir aqui
 os trechos principais:
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...se repararmos bem nessas histórias ditas infantis percebemos que, na verdade, elas não são tão infantis assim. Mortes, vingança, bruxaria, traição, inveja, é possível encontrar nessas histórias o lado mais sórdido dos sentimentos humanos, tudo bem colorido... 

Me aprofundando um pouco mais no assunto, cheguei até a professora Karin Volobuef, da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp em Araraquara (SP), que é referência na pesquisa desse gênero literário no Brasil.

Karin explica que as versões mais antigas desses clássicos infantis pouco podiam tranquilizar as crianças inquietas com a hora de dormir. “Claro que os contos apresentavam castelos, príncipes, princesas e fadas, pois estes elementos faziam parte do imaginário”, diz.

Mas esses personagens viviam tramas entremeadas por vinganças, assassinatos, traições e até canibalismo e incesto. “Na forma mais antiga da história de Chapeuzinho Vermelho, ela era devorada pelo lobo. Não havia o final feliz gerado pelo caçador", conta Karin.

A pesquisadora tenta entender os motivos pelos quais o gênero, no passado, incorporava elementos tão violentos. 

Uma explicação possível é proposta pelo historiador americano Robert Darnton, que enxerga neles o reflexo das vidas dos camponeses medievais, marcadas pelo trabalho árduo, pela alimentação insuficiente e pela alta mortalidade, especialmente de mulheres durante o parto. 

Por isso o grande número de madrastas e o tratamento desigual e impiedoso que elas dispensam aos enteados, que não seria “invenção da carochinha, mas uma estratégia de sobrevivência para aumentar a chance de seus próprios filhos”, escreve Karin, numa das análises que produziu sobre o tema.

Outra característica interessante é que, nessas formas mais antigas das histórias, os protagonistas não são todos virtuosos. O Gato de Botas, p. ex., mente e se apropria da riqueza alheia. O herói do conto O junípero vinga-se da madrasta, matando-a.
E, pensando bem, muitos heróis e heroínas não podem ser tomados por modelos de virtudes por serem demasiado passivos e acomodados. O que fazem Bela Adormecida ou Chapeuzinho Vermelho para merecer um final feliz?

As versões mais conhecidas dos contos de fadas são as adaptações produzidas pelos estúdios Disney na primeira metade do século 20. 

O filtro da cultura americana preservou o caráter de aventura e as lindas histórias de amor, mas acrescentou um viés ideológico, aumentou a polarização entre o bem e o mal e limou a rebeldia: Cinderela espera pelo príncipe encantado, a Bela Adormecida dorme até que ele chegue e a salve da maldição. Por isso, Karin vê as princesas modernas e batalhadoras que estão surgindo no cinema como mais próximas das figuras femininas que povoavam as versões mais antigas dessas histórias.

...Os contos de fadas começaram a ser visto como infantis a partir dos Irmãos Grimm, que colecionaram vários contos alemães sob o nome de Contos de fadas para crianças. Mesmo assim, mantiveram a maioria dos detalhes sórdidos. Por que? Bom, precisamos lembrar que as crianças daquele tempo viviam em um mundo em que estavam muito mais expostas, convivendo mais diariamente e de forma direta com violência e morte. Ser devorado por um lobo, por exemplo, era um risco real.

Então, sem mais delongas, vamos ao que interessa.
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BELA ADORMECIDA
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O conto original de A Bela Adormecida (Belle au bois Dormant) foi escrito pelo francês Charles Perrault 1697 e depois ganhou uma versão dos alemães Irmãos Grimm (com o nome Little Brier-Rose). Mas antes disso, em 1634, o italiano Giambattista Basile havia publicado um conto muito semelhante chamado Sol, Lua e Tália (Sun, Moon, and Talia) que foi a inspiração de Perrault e do conto que conhecemos.

A história: uma farpa de linho entra sob a unha da princesa Tália e ela imediatamente cai morta. O rei coloca sua filha em uma cadeira de veludo do palácio, tranca e parte para sempre, pra apagar a lembrança de sua dor. Algum tempo depois, outro rei estava por ali caçando e encontra Tália. Ele apaixona-se por sua beleza mas como não consegue acordá-la, a estupra e vai embora. Nove meses depois Tália dá a luz a gêmeos, Sol e Lua, mas continua adormecida. Um dia um dos bebês não encontra seu seio para mamar e coloca a boca no dedo da mãe e suga. Suga com tanta força, que extrai a farpa e a faz despertar.

Um dia, o rei que estrupou Tália, lembra-se de “sua aventura” com a bela adormecida e resolve ir visitá-la. A esposa desse rei descobre o caso e manda cozinhar as duas crianças e serví-las para o rei. Mas o cozinheiro prepara cabritos no lugar. Depois a rainha manda buscar Tália para lançá-la ao fogo, mas o rei chega e lança a própria esposa no lugar de Tália. Ele casa-se com Tália e vive com ela e seus filhos.
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BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES

O conto da Branca de Neve ficou popular através da versão dos Irmãos Grimm (com o nome Little Snow-White), que haviam ouvido a história de duas irmãs chamadas Jeannette e Amali Hassenpflug.

A história: Branca de Neve tinha 7 anos quando provocou a ira da rainha-madrasta por causa de sua beleza. Então a rainha convoca um caçador e pede que leve Branca de Neve para a floresta e a mate, trazendo seus pulmões e seu fígado para provar a morte. O caçador tem pena de Branca de Neve e a deixa fugir, levando pra rainha os órgãos de um javali. Então a rainha come os órgãos.

Enquanto isso, Branca de Neve acha a casa dos anões e em troca de lavar, passar, costurar, limpar e arrumar a casa, eles a deixam ficar.

Ao descobrir que Branca de Neve ainda está viva, a rainha vai até a casa dos anões 3 vezes. Primeiro, ela leva um corpete de seda, e tenta matar a garota apertando o corpete bem forte. Não funciona, então ela volta com um pente envenenado e tenta a matar penteando seus cabelos. Na terceira vez ela vai com a maçã envenenada.

Dessa vez os sete anões chegaram tarde demais e nada fez a Branca de Neve acordar. Como sua aparência ainda era boa e ela tinha bochechas coradas, eles não tiveram coragem de a enterrar e fizeram uma cripta de vidro para ela.

Um dia um príncipe viu a cripta com a princesa e quis comprá-la dos anões. Os anões se recusaram a vendê-la, mas acabaram dando para o príncipe com pena, pois ele pediu muito. O príncipe tinha empregados para carregarem a cripta, mas um deles tropeçou e caiu, derrubando o caixão de vidro. Com a queda, Branca de Neve cuspiu o pedaço de maçã envenenada e voltou à vida.

O príncipe e Branca de Neve planejam então uma festa de casamento e convidam a madrasta má (que não sabe que Branca é a noiva). Enquanto a madrasta se arruma para o casamento, pergunta ao seu espelho quem era a noiva, e o espelho revela Branca estava viva. Ela decide ir ao casamento mesmo assim e fica apavorada quando vê que a noiva realmente era Branca de Neve.

Então, Branca de Neve e o  príncipe colocam um par de sapatos de ferro na brasa e vestem os sapatos na madrasta má, a fazendo dançar até cair morta.
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CINDERELA
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Cinderela é um conto bem antigo, com versão grega antes de Cristo e registros na China nos anos 800. Acredita-se que é a história com mais versões, centenas! Em muitas delas, Cinderela foge de seu pai, que quer casar-se com a própria filha pois esta lhe lembra sua falecida esposa.

Assim como A Bela Adormecida, as duas versões mais conhecidas da história foram de Charles Perrault e dos Irmãos Grimm. A versão que conhecemos e que a Disney usou tem mais a ver com a de Perrault, que possui uma fada madrinha que transforma uma abóbora em carruagem. Abaixo a versão dos irmãos Grimm.

A história: A mãe de Cinderela veio a ficar doente e a falecer, mas antes de sua morte disse para a filha para plantar uma árvore em seu túmulo, e sempre que precisasse de algo, fosse lá chacoalhar a árvore. 

Algum tempo depois o pai se casou com outra mulher, que já tinha duas filhas más que logo apelidaram a menina de Cinderela. Um dia, o rei anunciou 3 bailes e Cinderela foi obrigada a ajudar as irmãs a se arrumar para o primeiro baile. 

Ela não tinha vestido e tinha que separar lentilhas antes que as irmãs voltassem. Depois que elas saíram para o baile, dois pássaros bateram na janela e se ofereceram pra ajudar Cinderela com as lentilhas.

No segundo baile, novamente Cinderela ficou em casa separando sementes, os pássaros após ajudá-la novamente, disseram para ela ir ao túmulo da mãe sacudir a arvore e fazer um pedido, ela foi, sacudiu a árvore e ganhou um esplêndido vestido prata com acessórios uma carruagem com serventes e cavalos para levá-la ao baile, mas tinha que voltar a meia noite, no baile, dançou com o príncipe que logo se apaixonou por ela.

No terceiro baile, novamente Cinderela é obrigada a ficar em casa separando ervilhas e com a ajuda dos pássaros ela termina a tarefa e faz mais um pedido na arvore plantada no tumulo de sua mãe.

Dessa vez, Cinderela ganhou um vestido dourado com pedras preciosas e sapatilhas feitas de ouro. O príncipe já a esperava na escadaria e dessa vez fez muitas perguntas à seu respeito. Cinderela quase perdeu o horário e teve que sair correndo, perdeu um dos sapatinhos e ainda perdeu a carona, ficando no meio da rua com suas roupas velhas. O príncipe encontrou seu sapatinho de ouro e proclamou que se casaria com a pessoa cujo pé coubesse nele.

A madrasta de Cinderela sabendo do que o príncipe havia proclamado, chamou suas duas filhas e disse que se o sapatinho não coubesse, elas deveriam usar uma faca e cortar um pedaço de seus pés. 

A irmã mais velha experimentou e não serviu, então cortou seu calcanhar e o sapatinho serviu. O príncipe já estava a levando para o castelo quando os pássaros amigos de Cinderela cantaram ao príncipe que havia sangue em seus sapatos.

Então a segunda irmã experimentou os sapatos e precisou cortar os dedinhos para servir. Novamente o príncipe enganado quase a levou para seu castelo, mas os pássaros a deduraram também, mostrando ao príncipe o sangue em seus sapatos. O príncipe voltou para a casa da madrasta e perguntou se havia outra garota. A madrasta não queria dizer, mas ele a pressionou até que ela falasse e fez chamar Cinderela. O sapatinho serviu e ele a pediu em casamento. No dia do casório, quando as irmãs de Cinderela tomavam o caminho da igreja, os pássaros bicaram seus olhos e elas ficaram cegas.
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A PEQUENA SEREIA
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A grande diferença nesse conto está em seu final. Ao invés de se casar com o príncipe e viver feliz para sempre, a pequena sereia na verdade é abandonada por ele logo após ela beber a poção mágica que lhe transforma em mulher. 

Mas, como tudo tem seu preço, a poção tem um pequeno efeito colateral: durante o resto de sua vida a pequena ex-sereia iria sentir uma dor tremenda nos pés, como se estivesse pisando constantemente em facas. 

Vendo a traição, alguém oferece um punhal para que ela tenha sua vingança. Mas, ao invés disso, ela pula no mar e morre.
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CHAPEUZINHO VERMELHO
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Na versão de Charles Perrault, Chapeuzinho Vermelho – uma moça bem criada – pede instruções para o Lobo Mau para chegar à casa da Vovó. Ele ensina o caminho errado, segue a moça e a devora. Moral da história? Não fale com estranhos
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Mas, em versões ainda mais antigas, o Lobo Mau chega antes na casa da Vovó, a mata e prepara a sua carne, para depois convidar a Chapeuzinho para um delicioso jantar, e, claro, depois dessa nutritiva refeição ele também devora a moça.

Já na versão de 1884, dos Irmãos Grimm, o caçador vai à casa da vovó, vê o lobo dormindo e então usa uma tesoura para abrir a barriga dele e tirar as duas de dentro. Antes que o lobo acorde, a Chapeuzinho enche sua barriga com pedras pesadas. Assim que ele acorda, tenta correr mas o peso impede, então cai morto.
JOÃO E MARIA
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Essa por si só já é assustadora, afinal, um pai que larga os filhos na floresta para morrer de fome não é lá o tipo de coisa que se lê para crianças certo!? Mas, numa versão mais antiga, a madrasta má, que pressiona o marido a lagar seus filhos na floresta, e a bruxa má são a mesma pessoa. 

Achei isso bem esquisito, mas as duas personagens tem personalidade bem similar. Outra alteração feita durante os anos foi com relação à própria bruxa que, em certa versão da história, na verdade é um casal de demônios, e ao invés de cozinhar João, eles querem estripá-lo num cavalete de madeira.

Quando o demônio macho sai para uma caminhada, o demônio fêmea manda Maria ajudar João a subir no cavalete, assim, quando seu marido voltar, tudo já estaria preparado. 

A esperta Maria finge não saber como colocar João deitado e pede para o demônio fêmea mostrar como se faz. Quando ela deita no cavalete, João e Maria a amarram e rapidamente cortam sua garganta. Depois fogem levando o dinheiro e a carroça do pobre casal de demônios.
O FLAUTISTA DE HAMELIN
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Nessa historia, um tocador de flautas mágico é contratado por uma cidade para livrá-la de uma infestação de ratos. Ele cumpre seu papel, mas quando volta para receber seu tão suado dinheirinho, a cidade se recusa a pagar. Daí, como vingança, ele usa os poderes de sua flauta para raptar todas as crianças da cidade e só as devolve após receber seu pagamento.

Até aqui tudo bonito, mensagem positiva e uma moral no fim da historia. Mas, o conto original não é bem assim, nele, o encantador não devolve as crianças depois de receber da relutante cidade. Na verdade ele faz com que elas todas se afoguem num rio. E, em algumas versões ainda mais antigas, há referencias a pedofilia em massa dentro de uma caverna escura..
TRÊS PORQUINHOS
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Na versão de 1890, de Joseph Jacobs, os dois primeiros porquinhos são comidos pelo Lobo Mau.

Quando o lobo invade a terceira casa pela chaminé, ele cai num caldeirão de água fervente e morre.


O terceiro porquinho aproveita, faz um ensopado, e come o lobo.

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A BELA E A FERA
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A história de Andrew Lang de 1889 se difere bem pouco da história que nós conhecemos. Nela, não há objetos mágicos nem inimigo da Fera. Em uma outra versão, a Fera é descrita como alguém que se parece com uma cobra.

Nessa história o mercador tem outras duas filhas interesseiras e três filhos além de Bela. Quando o mercador viaja, elas pedem coisas caras e Bela pede apenas uma rosa vermelha.

No meio da jornada o mercador encontra um castelo, lá dentro ele tem tudo que precisa, como comida e lareira pra se aquecer. Mas quando vai embora, rouba uma rosa para sua filha.


Então a Fera aparece e fica furiosa e diz que só o perdoa se ele lhe trouxer uma de suas filhas.


O mercador volta para casa e Bela é a filha que se oferece para ficar com Fera. Chega no castelo pensando que vai ser devorada mas ele a trata como uma princesa. Além disso, Fera deixa o mercador encher dois baús com riquezas e levar para sua casa.

Toda noite a Fera pede Bela em casamento e ela recusa. Um dia Bela pede para ir visitar seu pai, pois está preocupada e com saudade. A Fera deixa, mas a Bela deve voltar em dois meses, do contrário a Fera morrerá.

Um dia Bela sonha com a Fera morrendo e se assusta e resolve voltar na mesma hora. Quando chega no castelo a Fera está realmente morrendo e Bela percebe o quanto o ama e diz. Então ele acorda e a pede novamente em casamento. Quando ela aceita, ele se transforma em um lindo príncipe.

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