O pedaço da sociedade leal a Jair Bolsonaro (vide ao lado) voltou às ruas neste domingo. O país vai se habituando a um fenômeno novo: o protesto a favor.
Dessa vez, a favor de Sergio Moro, da Lava Jato e de pautas que interessam ao governo no Legislativo –sobretudo a reforma da Previdência e o pacote anti-crime.
Foi o segundo ato organizado por simpatizantes do governo em 35 dias. O primeiro, em 26 de maio, veio em resposta a um protesto de estudantes e opositores do governo contra o congelamento de verbas para a Educação.
Agora, a mola propulsora foi a divulgação de mensagens tóxicas atribuídas a Moro e aos procuradores da Lava Jato. O temor da anulação da condenação de Lula enviou ao asfalto os defensores do combate à corrupção.
Vão abaixo quatro conclusões que ajudam a compreender as consequências da nova manifestação:
1) A base social de Bolsonaro: Em termos nacionais, a manifestação deste domingo foi equiparável à de 26 de maio, talvez ligeiramente menor. Nenhuma das duas foi monumental. Nada comparável aos atos pró-impeachment de Dilma Rousseff. Mas ambas estão longe de ser inexpressivas. Ao contrário, revelam que Bolsonaro mantém uma base social sólida e fiel, a despeito da queda dos seus índices de popularidade.
2) As instituições sob pressão: Os refrões, os figurinos e as alegorias do ato não deixam dúvida. O Congresso e o Supremo Tribunal Federal continuarão enfrentando uma pressão de fora para dentro. Hostilizaram-se congressistas, entre eles o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Foram atacados também ministros do Supremo. Gilmar Mendes foi o alvo mais evidente.
Faixa contra o MBL no RJ. Em SP seus ativistas só não foram agredidos graças à ação da PM... |
Embora congressistas e magistrados neguem a influência do asfalto nas suas decisões, é improvável que Brasília ignore o tamanho do meio-fio ao programar os seus passos. Isso já está acontecendo. O fenômeno ajuda a explicar a disposição do Congresso para entregar uma reforma da Previdência tão indispensável quanto impopular. Deputados e senadores não querem ser responsabilizados pela crise.
Compreende-se melhor também por que a 2ª Turma do Supremo adiou para depois das férias o julgamento do pedido de suspeição de Moro, indeferindo por 3 a 2 a abertura antecipada da cela do presidiário petista. Uma das bandeiras do asfalto é justamente a ressurreição da CPI da Lava Toga, arquivada no Senado apesar de dispor de apoiadores na quantidade exigida pelo regimento.
3) O presidencialismo de trincheira: Bolsonaro enxerga nas ruas respaldo para manter a corda esticada nas suas relações com o Legislativo. No Twitter, o capitão anotou neste domingo: "A população brasileira mostrou novamente que tem legitimidade, consciência e responsabilidade para estar incluída cada vez mais nas decisões políticas do nosso Brasil".
Há na ótica do presidente uma distorção e um quê de miopia. Não foi a população brasileira que saiu às ruas, mas um pedaço dela, eis a distorção.
...que foi parabenizada por prender os adversários. |
Bolsonaro foi eleito porque os votos das pessoas que pensam como ele foram reforçados pelo apoio dos eleitores que não queriam de jeito nenhum a volta do PT ao poder.
Esse pedaço do eleitorado antipetista mudou de faixa. Está no acostamento. Já não existe unidade nem mesmo no bloco bolsonarista.
Esse pedaço do eleitorado antipetista mudou de faixa. Está no acostamento. Já não existe unidade nem mesmo no bloco bolsonarista.
De resto, o déficit de interlocução política empurra o Legislativo para uma pauta própria, nem sempre coincidente com a do Executivo. A queda de braço já começou e será intensificada depois da aprovação da reforma previdenciária. Nessa briga, o interesse público só está presente até certo ponto. O ponto de interrogação.
4) Os limites da tática do confronto: Quando os partidários de Bolsonaro foram às ruas em 26 de maio, a previsão de crescimento da economia captada no mercado pela pesquisa Focus, do Banco Central, era de 1,24% para o ano de 2019. Na última 2ª feira, a mesma enquete resultou numa estimativa de evolução do PIB de ridículos 0,87%.
O flerte com a volta da recessão e a presença de 13 milhões de desempregados no olho da rua intima o governo de Bolsonaro a apresentar resultados. Sob pena de levar às ruas não os apologistas do governo, mas os brasileiros que estão de saco cheio da polarização eterna.