terça-feira, 31 de julho de 2018

RELEMBRANDO APOLLO NATALI: "QUANDO NOSSOS CASTELOS DESABAM"

A caravana, lá vai ela, na curva da montanha...
O jornalismo é a paixão da minha vida. Minha praia, minha escola, minha luz.

Imprensa: deusa tutelar da espécie humana.

Jornalista: guardião da espécie humana.

Tenho 60 anos de exercício do jornalismo na imprensa escrita. 

No papel jornal, revistas e jornais, 40 anos. 

Outros 20 na imprensa escrita na blogosfera. Mais de meio século de manancial de aprendizado sobre jornalismo e a vida.

Minha casa em São Paulo construí com as próprias mãos. Comecei aos 16 anos. 

Ao longo dos anos, telhas pesadas, vigas pesadas, tijolos pesados. Mãos pequenas. Briga boa e longa.

Essa é toda a minha vida. Meu castelo. Bonito ele, não?
Lindos  sejam todos os castelos, todas as vidas.

Aos 82 anos, percebi agora há pouco,  minha vida passou. A caravana, lá vai ela, na curva da montanha. 

Sempre tive saúde perfeita. Nunca bebi, jamais fumei, em tempo algum me droguei.

Sem fazer barulho, ele me procurou.

Quimioterapias, susto, medo, choro, emoções desencontradas.

Como é triste morrer, dizem-me os pesadelos. 

Meu castelo é só escombros.

Na cama do hospital, uma picada ou outra de injeção, figuras silenciosas, médicos, enfermeiros, enfermeiras, cuidam dos que sofrem. Primeira pergunta: sente dor?

Agora eu deliro.
Pioneiros na descoberta dos antibióticos: Louis Pasteur...

Envia-nos o Criador, de tempos em tempos, almas especiais. Obtém meios em defesa da vida. Tarefa impossível nomear todos desde que mundo é mundo.

Pioneiros na descoberta dos salvadores antibióticos: Joseph Lister, em 1860. Pasteur, Joubert, Fleming em 1928,  Em 1869, Czech¸ Honi, Bukowsky, Paul Ehrkucem. Em 1935, Kolebookl. Em 1936, Keny.

A penicilina, o primeiro antibiótico da história, descoberta em placas contaminadas com bolor, é do médico escocês Alexander Fleming. Sua teoria foi festejada com êxito por Fleury e Chain, em 1940.  

Varíola:  Edward Jenner descobriu a vacina antivariólica em 1796. A primeira de que se tem registro. Jenner desenvolveu a vacina a partir de outra doença, a cowpox, tipo de varíola que acometia das vacas. Percebeu que as pessoas que ordenhavam as vacas adquiriam imunidade à varíola humana. 
...e Alexander Fleming.

A palavra vacina,  em latim significa de vaca. Por analogia passou a designar todo o inóculo com capacidade de produzir anticorpos. No século 18 a varíola era uma das doenças epidêmicas com  maior índice de mortalidade.

Raiva, do cientista francês Louis Pasteur.

Alguns brasileiros: Oswaldo Cruz, febre amarela. Miriam Tendler, de Manguinhos, desenvolveu a vacina contra a esquistomosse, causadora de morte de 300 milhões de cabeças de gado e outro tanto de seres humanos.

Manoel Dias de Abreu: raio-x. Leva seu nome, Abreugrafia.

Emílio Gonçalves Ribas. Combatente de endemias, criador de instituições meritórias, como o Instituto Butantã. 

A bem vinda anestesia: em 1844 dos dentistas estadunidenses Horace Weel e William Thomas Green Morton. Horace ficou conhecido por utilizar o gás nitroso, gás hilariante, como anestesia. Thomas protagonizou a primeira demonstração pública do uso do éter numa cirurgia. 

O gás hilariante foi descoberto em 1776 pelo cientista  e ministro presbiteriano inglês Joseph Priestley. 

O médico escocês James Simpson de Edimburgo foi o primeiro a usar o cloroformio em 1847. Sua teoria foi largamente aceita pela medicina em 1853.

E mil medicamentos para combater  mil outros males da saúde menos agressivos.

Uns e outros são do contra. Fernando Collor de Mello, ex-presidente, convidou para deixar o país, por suas críticas à vacinação o benfeitor da humanidade criador da vacina contra a poliomielite, Albert Sabin.

Muito agradecido por delirarem comigo.
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(este blog republicará a partir de hoje, sempre às terças-feiras, as melhores crônicas do seu inesquecível colaborador Apollo Natali)

O BLOG PERDE UM MAGNÍFICO CRONISTA. EU PERCO UM AMIGO DE 30 ANOS.

Meu ex-colega da Agência Estado, amigo de 30 anos e colaborador deste blog desde 2010, Apollo Natali morreu por volta das 13 horas de hoje (31), aos 82 anos, vítima de complicações de um câncer.

A notícia foi tão cruel, deixou-me de tal forma arrasado, que não conseguirei prestar-lhe o tributo que desejaria neste momento. Mas, certamente o farei nos próximos dias.

Suas melhores crônicas serão republicadas a partir de hoje, sempre às terças-feiras, começando pela dilacerante Quando nossos castelos desabam, que o Apollo escreveu já sem ilusões quanto ao seu destino.

O espaço deste blog está oferecido para todos os amigos do Apollo que queiram escrever algo sobre ele.

Não sei mais o que dizer. Nada estaria à altura. Paro por aqui. (Celso Lungaretti)

A LEI ÁUREA TEM 130 ANOS. BOLSONARO AINDA IGNORA SUA EXISTÊNCIA

"Acho que no campo a CLT tinha que ser diferente. 
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O homem do campo não pode parar no Carnaval, sábado, domingo e feriado. A planta vai estragar, ele tem que colher.
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E fica oneroso demais o homem do campo observar essas folgas nessas datas, como existe na área urbana" 
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(Jair Bolsonaro no programa Roda Viva, pregando a desigualdade de direitos entre trabalhadores da cidade e do campo)

"Nego tá moiado de suor/ As mãos do nego/ Tá que é calo só/ Ai, meu senhor/
Nego tá véio/ Não aguenta/ Esta terra tão dura/ Tão seca, poeirenta/
(Trabalha, trabalha, nego/ Trabalha, trabalha, nego)"

A CANDIDATURA FASCISTA JÁ DERRETE, AGORA PRECISAMOS DETER O AVANÇO DO AUTORITARISMO NA SOCIEDADE

nabil bonduki
COM DENÚNCIAS ANÔNIMAS E AÇÕES
 INTIMIDATÓRIAS, AUTORITARISMO AVANÇA
A reflexão acima é de Martin Niemöller (1892-1984), pastor da Igreja Protestante que lutou contra os nazistas. Deve servir de alerta para os brasileiros que acreditam na democracia, mas que estão indiferentes ao avanço do autoritarismo.

Na semana passada, três professores da Universidade Federal do ABC foram intimados por uma comissão de sindicância investigativa, criada pela corregedoria da universidade com base numa denúncia anônima, por terem participado de um debate no lançamento de um livro.

Uma das perguntas da comissão foi se “ocorreram manifestações de desapreço contra Temer e integrantes do Judiciário e Promotoria”. Para Gilberto Maringoni, um dos intimados, “trata-se de evidente tentativa de censura, algo que se julgava encerrado desde (...) a ditadura”.  
Velório de Cancellier, vítima da escalada fascista

Não é um fato isolado, mas um processo crescente de ameaça à liberdade de expressão. Na Universidade Federal de Santa Catarina, a Polícia Federal  agiu contra docentes que participaram de um evento que condenou o abuso de poder cometido por uma delegada e uma juíza contra o ex-reitor Luiz Carlos Cancellier [tal perseguição o levou ao suicídio].

Como afirmou a Folha de S. Paulo em editorial [leia-o na íntegra aqui], “esse gênero de protesto, legítimo em qualquer democracia, e ainda mais num ambiente de liberdade como é o de uma instituição acadêmica, motivou iniciativas de claro conteúdo intimidatório”.

Os arroubos autoritários seguem um perigoso roteiro: um grupo denuncia um evento, uma manifestação artística ou uma opinião. Em seguida, alguma autoridade —o Judiciário, a polícia ou um órgão de controle— proíbe, censura ou intimida os participantes. 

É um método típico dos regimes totalitários, de qualquer vertente. Denúncias anônimas ou ações violentas integram um modus operandi promovido por grupos paralelos à estrutura institucional que atuam de modo complementar a governos autoritários. 
Esta obra da Queermuseu amalgama Jesus Cristo e a deusa Shiva 

Não faltam exemplos, como o fechamento da exposição Queermuseu em Porto Alegre, após pressão de ativistas. Débora Diniz, professora da Universidade de Brasília, vem recebendo ameaças de violência de grupos contrários à sua defesa do direito reprodutivo das mulheres.

O Brasil vive momentos de obscurantismo. Por isso, o compromisso com a democracia precisa estar no centro do debate eleitoral. Uma frente democrática e progressista, que reafirme os princípios da liberdade e dos direitos individuais e sociais e coloque um dique aos retrocessos, é essencial. (por Nabil Bonduki)
Lluís Llach e sua canção-símbolo da resistência ao fascismo na Espanha

segunda-feira, 30 de julho de 2018

COM FALSO MEA CULPA, NEYMAR TOMBOU MAIS ALGUNS CENTÍMETROS

Toque do editor
Se há algo que jamais farei é comentar alguma peça publicitária em particular, pois considero-as todas nocivas: impingem produtos e serviços quase sempre desnecessários, insuflando o consumismo desenfreado, além de incutirem subliminarmente os valores de uma sociedade desumana e injusta ao extremo. 

Caso o Zé Celso Martinez Correa não tivesse afirmado que "os publicitários são filhos de Goebbels", é bem provável que eu mesmo criasse tal frase. Ela simplesmente esgota o assunto.

Mas, o comercial tentando limpar a barra do Neymar, no qual lê uma lenga-lenga piegas que jamais teria capacidade para escrever e que todos sabemos não representar seus reais sentimentos, foi um insulto à inteligência de quantos nos frustramos com o desempenho dele no último Mundial. Então decidi, excepcionalmente, não deixá-lo passar em branco. 

Como não me sentiria bem escrevendo tal crítica, decidi reproduzir a ferina catilinária do roteirista de cinema e TV Tony Goes, que matou a cobra e mostrou o pau....
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COMERCIAL EM QUE DESABAFA É MAIS UMA BOLA FORA DO NEYMAR
Chororô no sábado da eliminação...
Neymar virou um problema para seus patrocinadores. Contratado a peso de ouro por algumas das maiores marcas do mundo, o jogador saiu da Copa do Mundo da Rússia com a imagem chamuscada.

O que derrubou Neymar não foi a derrota da seleção brasileira. O egípcio Salah não conseguiu que seu time passasse da 1ª fase e, mesmo assim, entrou para o ranking dos dez melhores do mundo divulgado pela Fifa (o brasileiro ficou de fora). Cristiano Ronaldo caiu com Portugal nas oitavas de final e assinou um contrato milionário com a Juventus antes mesmo do final do torneio.

Neymar despencou por causa de seu comportamento de prima-dona, sem compensar esses chiliques com gols. À menor resvalada durante um jogo, o rapaz se atira ao chão, se contorce de dor, exagera na encenação. Virou piada a nível planetário.

Um professor de teatro entrevistado pelo jornal The New York Times avaliou a performance do jogador como pífia e não convincente. “Neymar faz o que todos os atores principiantes fazem", disse Jim Calder. "Eles exageram os eventos." 
...e uma alegre noitada de pôquer na 4ª feira seguinte. Serão só as faltas que ele simula?!
Assustada com a súbita queda no valor simbólico de seu garoto propaganda, a Gillette entrou em campo. Durante um intervalo do Fantástico neste domingo (29), o anunciante veiculou um comercial de um minuto e meio (uma duração três vezes maior do que a habitual), em dramático preto e branco, com Neymar recitando em off um texto em que admite alguns erros, mas não chega a pedir desculpas.

Tenho pena do redator que escreveu esse texto. Cada palavra deve ter sido repensada centenas de vezes e submetida ao crivo de muita gente – inclusive ao do próprio Neymar, é claro. Pena que, no final, a coisa descamba, piorando ainda mais a combalida reputação do jogador.

“Eu caí, mas só quem cai pode se levantar”, diz Neymar no fim do comercial. “Você pode continuar jogando pedra, ou pode jogar essas pedras fora e me ajudar a ficar de pé. E quando eu fico de pé, parça, o Brasil inteiro levanta comigo.”

Oi? Quer dizer então que a responsabilidade é nossa? Que temos que ajudar o coitadinho do Neymar a se reerguer, depois dele ter agido feito um moleque mimado durante anos a fio, dando muito pouco em troca aos torcedores de seus times?

O que Neymar tem feito para justificar a paixão dos brasileiros? Nem aqui ele joga mais. Largou o Santos de uma hora para a outra e foi para o Barcelona. Chutou o Barcelona para escanteio e se bandeou para o Paris Saint-Germain, onde ainda não disse a que veio.

Enquanto isso, não perde uma oportunidade de monetizar cada segundo de sua vida pessoal. Solta mal disfarçadas mensagens publicitárias em seus perfis nas redes sociais. Posa em trajes menores ao lado da namorada, a atriz Bruna Marquezine, para uma campanha de uma loja de roupas. E agora deu um jeito de faturar com o vexame que protagonizou no Mundial.

No filme da Gillette, Neymar insiste que ainda é um menino. Não é: é um homem de 26 anos, pai de um filho, que acumulou uma fortuna por seus próprios méritos.

Já passou da hora dele se comportar feito um adulto. Deixar de ser seduzido pelo canto de sereia da publicidade e assessorado por gente que não pensa a médio prazo. Basta conferir a reação largamente negativa dos internautas a esse falso mea culpa: Neymar tombou mais alguns centímetros.

Terá que fazer muito gol para conseguir se levantar. (por Tony Goes)
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Como a bola de ouro ele não vai mesmo ganhar, que tal o Profissionais do
Ano? Desde, claro, que haja prêmio para a peça publicitária mais cínica...

ESTADO BRASILEIRO DEVERÁ SER RESPONSABILIZADO PELAS TORTURAS E EXECUÇÃO DO GUERRILHEIRO 'BACURI'

Expira amanhã (3ª feira, 31) o prazo para o governo Temer se pronunciar sobre uma ação que pede a responsabilização do Estado brasileiro pelas torturas infringidas na ditadura militar ao guerrilheiro Eduardo Collen Leite, o Bacuri, seguidas de sua covarde execução. O caso tramita desde 2011 na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

A ação foi movida pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional, a mesma ONG que recentemente obteve a condenação do Estado brasileiro, por parte da Corte Interamericana de Direitos Humanos, pela tortura, prisão e morte do jornalista Vladimir Herzog. 

A Comissão (fundada em 1959) e a Corte (1979) são congêneres, ambas integrantes do sistema de proteção dos Direitos Humanos da OEA. Diferem em alguns detalhes de suas atribuições, mas não nos princípios norteadores, daí a tendência de que a Comissão chegue ao mesmo entendimento da Corte.
Da esq. p/ a dir., o Eduardo está na 7ª foto

Esta determinou ao Brasil que reiniciasse, com a devida diligência, a investigação e o processo penal cabíveis no caso do assassinato de Herzog, acrescentando serem inadmissíveis quaisquer alegações de prescrição, por se tratar de crimes contra a humanidade e internacionais. 

O Ministério dos Direitos Humanos do Brasil informou que dará "cumprimento integral à sentença", comprometendo-se a enviar à Corte, no prazo de um ano, um relatório sobre as medidas adotadas.

O xis da questão é: identificados os assassinos de Herzog, a instauração de processo penal contra eles continuará esbarrando na anistia de 1979 (inaceitável à luz do Direito civilizado, que não admite anistias decididas durante regimes de exceção, ainda mais quando vêm beneficiar os agentes do Estado responsáveis por chacinas e atrocidades de todo tipo).

Como o STF lavou as mãos com relação a tal simulacro de anistia em 2010, decidindo que cabe ao Congresso Nacional alterar ou não o que decidiu em 1979, o que o Governo brasileiro realmente tem de fazer, para dar cumprimento integral à sentença, é propor ao Congresso Nacional a rediscussão do assunto, com a revogação da Lei de Anistia ou a mudança de algumas de suas disposições. Alguém acredita que o fará?

De todo modo, se vier uma segunda sentença no mesmo sentido, certamente fará aumentar a pressão no sentido de que finalmente haja verdadeira justiça.
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RECORDANDO O COMPANHEIRO MARTIRIZADO  — É como  Basílio  que eu me lembro do Eduardo Leite, cuja execução, depois do verdadeiro calvário ao qual as bestas-feras da repressão ditatorial o submeteram durante mais de 15 semanas, se deu em 8 de dezembro de 1970, quando ele estava com 25 anos de idade.

Bacuri  era um codinome já descartado, que ele usara antes de abril/1969, quando o conheci no Congresso de Mongaguá da VPR.

Deve tê-lo mudado porque era revelador em demasia, mais próximo de um apelido: um tanto gordo, ele lembrava mesmo um porquinho. E, claro, assim o nome de guerra descumpria a finalidade de dificultar a identificação do companheiro que o utilizava.

Eu era um secundarista de 18 anos, um tanto deslumbrado por ter sido repentinamente admitido no círculo dos revolucionários mais procurados do Brasil. Queria entrosar-me o quanto antes com os novos companheiros. 

E, sem me dar conta, já era com olhar de jornalista que eu observava a tudo e a todos, fazendo  minhas avaliações, tentando entender como haviam sido forjados combatentes daquela têmpera. Sentia-me, como o antigo Repórter Esso, uma testemunha ocular da História...

Basílio não parecia o combatente  da pesada  que depois fiquei sabendo ser. Nem de longe. Fiquei surpreso quando o  Moisés  (José Raimundo da Costa) me contou algo de sua história.

Estava com o cabelo curto e um farto bigode, que o deixava com um jeitão de português, além de envelhecê-lo um pouco. Nunca adivinharia que ele, àquela altura, tinha tão somente 23 anos.

Era simples, afável, simpático. Quando se alterava, gaguejava um pouco. Foi o que aconteceu ao comunicar que deixaria a Organização.

Minhas recordações, quase meio século depois, são nebulosas. Lembro-me de que ficou muito emocionado, talvez tenha até chorado.

Desentendera-se com outros companheiros a respeito do encaminhamento dado a operação(ões) armada(s); devido às regras de segurança, fiquei sabendo disso muito superficialmente, então não pude (nem posso agora) estabelecer quem tinha razão.
Notícia fraudulenta: ele foi, isto sim, executado a sangue-frio!

Montou uma pequena organização, a Rede Democrática, que se manteve bem próxima da VPR, sendo nossa parceira em várias ações.

Quando o Moisés e eu vimo-nos ameaçados de expulsão da VAR-Palmares, no curso da luta interna que desembocaria na recriação da VPR, ele consultou o Basílio a respeito do nosso ingresso na Rede, recebendo sinal verde.

Bem ao seu estilo – conservava sempre uma carta escondida na manga –, o Moisés só me falou dessa sondagem quando o racha estava consumado e nós, os precursores, reabilitados.

É minha última reminiscência envolvendo o Basílio, até ficar sabendo de sua prisão e martírio – um dos episódios mais chocantes dos anos de chumbo. "Nenhum tormento conseguiu arrancar qualquer informação do Bacuri", afirmou Jacob Gorander.

Até hoje não me passa pela garganta que a vítima de tão terríveis e prolongados suplícios tenha sido aquele gordinho boa gente que batia bola comigo na praia de Mongaguá, nos intervalos do congresso da VPR. As duas imagens não casam.
O destino foi cruel demais com ele.
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Obs. – ainda sobre o Bacuri, leia aqui (clique p/ abrir) a descrição do seu martírio no relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

"BOLSONARO SERIA VAGABUNDO O SUFICIENTE PARA OFERECER UM CARGO IMPORTANTE A MAGNO MALTA"

celso rocha de barros
NÃO HÁ MAIS COMO BOLSONARO
VENCER COMO TRUMP VENCEU
Planos de Bolsonaro começaram a ruir...
O risco Bolsonaro mudou de cara na última semana. Não há mais como Bolsonaro vencer como Trump venceu.

Na onda global de radicalismo político que se seguiu à crise de 2008, um padrão parece claro: os radicais que venceram conseguiram colocar um pé dentro do sistema político tradicional. 

Trump foi candidato do partido republicano, uma das maiores máquinas políticas do mundo.

O pé dentro do sistema que Bolsonaro pretendia colocar era o centrão. Nunca teve chance de atrair o PSDB ou o PMDB. Oferecia, entretanto, a possibilidade de promoção do baixo clero à primeira divisão. Diga o que quiser, nenhum presidente brasileiro até hoje foi vagabundo o suficiente para oferecer um cargo importante a Magno Malta. Bolsonaro seria.

Não deu certo. O centrão foi para Alckmin. Desde então, Bolsonaro xinga muito o centrão, mas isso é como na fábula com uva e raposa. Bolsonaro tentou conquistar Valdemar Costa Neto, mas o PSDB foi mais raposa.
...quando Costa Neto preferiu fechar negócio com Alckmin.
Sem um pé no sistema partidário, não dá mais para Bolsonaro ser Trump.

No fundo, o candidato mais forte a Trump brasileiro seria João Doria, outra mediocridade política que, entretanto, conseguiu se infiltrar em um grande partido. 

Mas Doria cometeu um erro que Trump evitou: expôs sua pouca disposição para governar se elegendo prefeito antes de concorrer à Presidência.

Agora resta a Bolsonaro apostar todas as fichas no discurso antissistema. Não é mais importante saber o que Bolsonaro vai dizer ou propor. 

Seus aliados, até outubro, são novas revelações da Lava Jato contra seus concorrentes, a discussão no STF sobre o fim da prisão em segunda instância e a ênfase no discurso pró-militar, que pode transformar todo quartel pelo Brasil afora em um comitê de campanha. De agora em diante, todo discurso de Bolsonaro deve ser uma promessa velada de golpe para acabar com a corrupção.

Ou Bolsonaro cairá como Trump deveria ter caído, ou vencerá sendo muito mais nocivo à democracia brasileira do que Trump vem sendo para a democracia americana.
(principais trechos de artigo de Celso Rocha
de Barros divulgado nesta 2ª feira, 30)

domingo, 29 de julho de 2018

AMARGANDO O DESALENTO DE UMA DÉCADA PERDIDA, FERIDO PELAS PESSOAS OCAS QUE O CAPITALISMO ENGENDRA

"Às vezes eu me sinto tão sem inspiração/ Às vezes eu sinto vontade de desistir / Às vezes me sinto tão cansado/ Às vezes me sinto como se já houvesse tido o suficiente/ Às vezes você sente-se como se tivesse sido contratado/ Às vezes você sente-se como se tivesse sido comprado/ Às vezes você sente que seu quarto foi mudado/ Às vezes você sente como se tivesse sido apanhado..."

É como um dia sentiu-se Steve Winwood, o brilhante tecladista e letrista do conjunto inglês Traffic. E é como me sinto neste domingo em que mais uma vez saí ferido na convivência inescapável com as pessoas ocas que a sociedade de consumo engendra, incapazes de superar o narcisismo infantil, tentando encontrar no que o dinheiro compra a felicidade que só a complementação amorosa, despojada e desinteressada com outros seres humanos proporciona.   

Mas, a 10 dias de completar 10 anos de existência, este blog deveria manter a tradição de trazer pelo menos um post novo a cada novo dia. E, por acaso, dei de cara com o texto abaixo, do início da campanha eleitoral de 2010, que dá uma boa noção de que estamos numa década perdida: tirando detalhes factuais, serve perfeitamente para a campanha eleitoral atual e a mídia atual. Leiam e constatem.
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O INFERNO PAMONHA E O MAFUÁ DA MÍDIA
O capitalismo putrefato consegue ser o pior dos mundos possíveis: à imoral desigualdade, às muitas injustiças e ao criminoso desperdício do potencial hoje existente para assegurar-se uma existência digna a cada habitante do planeta acrescenta a crassa boçalidade induzida pela indústria cultural.

Daí o rótulo definitivo, antológico, que Paulo Francis lhe pespegou.

Pois é mesmo num inferno pamonha que nos debatemos, sem encontrarmos a saída.

E fica mais pamonha ainda nas campanhas eleitorais.

Assim, leio que a Folha de S. Paulo considera informação pertinente os comentários de costureiros (é o que são, embora a mídia os trate pernosticamente como estilistas) sobre como se vestem Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva.

Que importância tem isso para o desempenho do cargo a que aspiram? Nenhuma.

Mas, derrubam-se árvores para a impressão de tolices como a de que não há expressão nos trajes de Serra e Dilma.

Lula teria orientado Dilma a "adotar a sobriedade dos looks clássicos e das cores neutras". Melhor faria orientando-a a informar-se melhor sobre política internacional, antes de deitar falação sobre as armas nucleares que o Irã possuiria.

Serra ficaria melhor com "ombros estruturados" como os de Obama, diz um Walter Rodrigues qualquer. Eu acho que seus ombros continuarão encurvados enquanto carregarem o peso da aliança com os demoníacos herdeiros da Arena, o partido que dizia amém aos genocídios e atrocidades da ditadura militar.

Dilma também se viu obrigada a reformular suas declarações a respeito de credo. Antes da campanha se dizia em dúvida sobre a existência de Deus e negava ter uma religião específica, agora se apresenta como "antes de tudo, cristã" e "num segundo momento, católica".

Trata-se, claro, de uma questão de foro íntimo, que jamais deveria ser exposta à bisbilhotice alheia.
Só que, quando Boris Casoy colocou tal casca de banana no caminho de Fernando Henrique Cardoso, este deu uma resposta digna e perdeu a eleição para prefeito de São Paulo.

Resultado: desde então, nenhum candidato se atreveu mais a replicar que esta questão simplesmente não vem ao caso.

Há que se querer muito a Presidência da República para sujeitar-se ao assédio da mediocridade agressiva.

O mafuá da mídia está cada dia mais repulsivo.

sábado, 28 de julho de 2018

QUEM SE PROPÕE A GOVERNAR O ESTADO BURGUÊS EM BENEFÍCIO DO POVO, OU É INGÊNUO OU MAL INTENCIONADO...

dalton rosado
O PODER POLÍTICO SOB O CAPITAL
Nada é mais negativamente impositivo do que a lógica do capital sobre as ações do poder político de Estado, esse último seu servo obediente e fiel.   

Qualquer governante com sensibilidade social inabalável e conhecendo a dinâmica da mediação social sob a forma-valor (dinheiro e mercadorias) compreenderá que é impossível continuar o exercício do poder político sob o capital em substancial benefício social sem deixá-lo, e voltando-se contra ele próprio, e passando a combatê-lo. 

A outra opção, própria a quem antes combatia o capital e agora se aferra aos encantos do poder político capitalista privado ou estatal (sendo laçado pela gravata, como diria o Tom Zé) é negar todos os postulados pró-povo que antes defendera. 

Essa foi a conclusão a que cheguei quando exerci função pública estatal de comando e pude constatar a incoerência do exercício do poder político sob o capital por alguém com sensibilidade para o drama social vivido pelos trabalhadores assalariados de renda média e baixa (a grande maioria) e que seja conhecedor da crítica da economia política marxiana.

O barro que molda a gestão política de Estado numa sociedade mediada sob a forma-valor não dá liga com a razão emancipacionista. São matérias comportamentais incompatíveis, e a razão desta incompatibilidade reside no caráter fetichista da forma-mercadoria.

Ora, a forma-mercadoria tem uma dinâmica própria de reprodução do valor que é, antes de tudo, segregacionista e cumulativa, na medida em que o valor, para existir, necessita de retenção constante e crescente, sem a qual ele perece irremediavelmente. 
Esta é uma prova do caráter meramente abstrato da forma-valor, ademais insensível à questão social, da qual faz mero uso utilitário. O valor econômico é um fantasma que se torna real, inebria e mata.

O processo de acumulação constante do capital implica um fim autotélico interminável no qual, quanto mais se acumula, mais se necessita acumular, deixando para as calendas gregas a ideia de sua distribuição, ainda que uma determinada fatia do bolo beneficie quem o administra (capitalistas privados ou estatais) e alguns beneficiários indiretos (a chamada aristocracia operária, burocratas de alto escalão do poder do Estado e alguns profissionais de nível superior). 

Tal processo dura somente até o momento em que a concorrência mundial de mercado impõe a redução de custos de produção mediante a dispensa do trabalho abstrato produtor de valor pela via da tecnologia aplicada à produção, bem como promove a concentração de riqueza daí derivada, tornando-se cada vez mais elitista.  

Por sua vez o Estado, cujo acesso se dá pela via política, tem limitações econômico-administrativas cada vez mais acentuadas, decorrentes do alto custo da máquina institucional (salários, gastos militares e manutenção), além dos investimentos na conservação e criação de obras públicas de infraestrutura para o funcionamento da vida mercantil, pagamento dos juros da dívida pública e, atualmente, do complemento financeiro do déficit previdenciário.

Torna-se quase impossível o atendimento das demandas sociais, até porque, além dos custos da máquina estatal acima referidos, existem as amarras constitucionais que impossibilitam o exercício pleno de uma administração pública compatível com os interesses maiores da coletividade. 

O Estado burguês, qualquer que seja a inclinação ideológica do governante, termina sempre por se evidenciar no longo prazo como um algoz do povo, mesmo que a propaganda e as ações populistas mascarem a verdadeira essência do poder. 

Quem se propõe a governar o Estado burguês em benefício do povo, ou é ingênuo e acaba sendo por ele governado; ou está, desde o início, mal intencionado.

É evidente que, nos países de economia desenvolvida (e que assim o são na inversa e inevitável proporção do empobrecimento dos demais países), o Estado pode proporcionar um relativo bem-estar social, criando a falsa expectativa de que todos possam ter o mesmo destino. 

A busca de imitação do chamado 1º mundo pelos países pobres corresponde a uma ilusão derivada da incompreensão da dinâmica do capital, segundo a qual, a cada ilha de riqueza, corresponde sempre um mar de pobreza. 

Por sua vez, também a busca do chamado desenvolvimento econômico dos países periféricos ao capitalismo corresponde a uma busca impossível de se realizar; algo assim como se querer que um time de futebol de várzea consiga tornar-se campeão do Brasileirão. 
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CONSEQUÊNCIAS DO APEGO AO ESTADO BURGUÊS — O que está acontecendo na Nicarágua, sob a presidência continuada de Daniel Ortega (o antigo líder da revolução sandinista que derrubou o ditador Anastácio Somoza), é o mesmo que aconteceu a Dilma Rousseff e tantos outros governantes da América Latina que, eleitos com um discurso de redenção dos seculares sofrimentos do povo, passaram a oprimi-lo.

Todos os governantes que se apegam ao poder, ainda que bem intencionados, terminam sempre por se ajustarem aos ditames do limite da governabilidade capitalista, negando bandeiras anteriormente defendidas por força da lógica capitalista lhes é imposta; ou terminam por fazer uma vergonhosa e inaceitável concessão de favores ao capital como forma de manutenção do poder, além de firmarem alianças políticas que garantam a governabilidade. 

O poder corrompe e a perpetuidade no poder corrompe muito mais, diz a oposição, mas apenas quando fora do poder. 

A ebulição da insatisfação popular contra Daniel Ortega explodiu sob a forma de repúdio à reforma da previdência social, que mais não é do que a restrição à concessão de direitos adquiridos. Mas, este foi apenas um ponto dentro da insatisfação generalizada que eclodiu socialmente.

Diante disto, e do apego ao poder, reproduz-se na Nicarágua (e noutros países latinos cujos governos são tidos como de esquerda) a repressão popular sangrenta que apenas denuncia como é mesquinho e manipulador das mentes humanas o exercício do poder político estatal burguês. É sempre bom lembrar que estão presentes e em pleno funcionamento na Nicarágua todas as categorias fundantes do capitalismo).

A questão que se coloca não é o combate à forma de poder ou a qualidade do seu exercício, mas a negação do próprio poder. O exercício do poder pró-povo é algo assim tão irrealizável como se querer a justa distribuição do dinheiro. Aliás, uma coisa está indissoluvelmente ligada à outra.

Não se pode distribuir o dinheiro de forma justa exatamente porque ele somente existe a partir de sua acumulação injusta e permanente. A questão que se coloca não é tentar distribui-lo de forma justa, mas superá-lo; esta é a forma eficaz de combatê-lo.
Querer um Estado pró-povo é querer que o próprio direito sob o qual se assenta toda a estrutura jurídica que dá legalidade à exploração do capital seja abolido; é querer inverter a sua natureza, ou seja, é querer que o pé de caju dê manga.   

Ora, se almejamos uma nova estrutura de vida social, a primeira coisa que devemos fazer é abolir o próprio Estado. Resultará sempre inútil a tentativa de bom exercício, estando ele como está subjugado ao poder econômico (que é o responsável último por nossas agruras). 

O Estado moderno, a política e o poder econômico são tão indissociáveis quanto elementos químicos que somente juntos formam um terceiro elemento. A falta de um deles pressupõe as suas extinções mútuas. 

Agora, no Brasil, vamos assistir nos próximos meses ao mais enfadonho discurso televisivo da governabilidade pró-povo, que corresponde a um estelionato eleitoral – a propaganda gratuita dos partidos políticos e dos seus candidatos.

Tal propaganda oficial, pretensamente apartidária, institucional, que se pretende voz da sociedade civil e que chama para o exercício do voto, vai nos ensinar que devemos avaliar os candidatos para vermos aquele que tem propostas governamentais exequíveis e confiáveis, como se fosse possível, tanto para a direita como para a esquerda, pela via político-eleitoral, determinar a soberania comportamental de uma lógica econômica previamente definida e que agora vive os seus estertores. 

Aviso aos navegantes: o próximo governo, seja qual for o seu matiz ideológico, vai ter de resolver o problema de déficit da previdência social, que no ano passado totalizou R$ 268,8 bilhões (e está aumentando em 2018), além dos juros da dívida pública, e não se aceita que se jogue o direito às pensões previdenciárias para além da expectativa de vida saudável.

Este é um exemplo significativo do que será governar nesse momento de debacle do capital. 

Diante disso, pergunta-se: por que alguém que diz almejar uma sociedade saudável e livre das injustiças se disporia a governar o ingovernável, remediar o irremediável e sofrer para salvar o capitalismo na sua fase de derrocada irreversível? 

Tal empreitada somente se justifica para aqueles que querem o poder para se locupletarem, darem azo às suas vaidades, ou, ainda, para os paus mandados do capital. 

Francamente, como diz o Celso Lungaretti, "não me engana que eu não gosto". (por Dalton Rosado).
"A gravata já me laçou/ A gravata já me enforcou/ Amém!"      
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