terça-feira, 6 de janeiro de 2015

MINISTRA QUER BANIR LIVRO DE MONTEIRO LOBATO. BRADBURY EXPLICA.

distopia Fahreinheit 451, que Ray Bradbury escreveu em 1953 e François Truffaut levou às telas em 1966, poderá se tornar realidade no Brasil de hoje: uma alta otoridade pretende banir um livro importante. Daí para começarmos a queimá-los será um passo.

Uma tal Nilma Gomes, que acaba de assumir a estapafúrdia pasta da Políticas de Promoção da Igualdade Racial (algo assim ainda faz sentido no Brasil, em pleno século 21?!), quer obrigar Cid Gomes a se comportar como o pior dos seus antecessores: o coronel Jarbas Passarinho, que, espantosamente, foi ministro da Educação (!!!) durante a ditadura militar.

Como uma Torquemada extemporânea, a tal Nilma exige que o livro Caçadas de Pedrinho, uma das pérolas da nossa literatura infanto-juvenil, seja colocado no index do Programa Nacional Biblioteca na Escola. Ou seja, reivindica, explicitamente, seu banimento. A última vez que eu ouvira esta palavra odiosa foi quando o regime militar considerou banidos os presos políticos trocados por diplomatas.

Na verdade, trata-se de uma espécie de acerto de contas: a tal Nilma foi a integrante do Conselho Nacional de Educação que, em 2010, produziu o famigerado parecer a partir do qual se desencadeou a virulenta campanha de desqualificação de Monteiro Lobato. Então ela pedia, apenas, a inclusão de notas explicativas no livro --o que, claro, emascularia grosseiramente a obra. Agora radicalizou. As derrotas subiram-lhe à cabeça.
Nazistas queimando livros em 1933, na Alemanha.

Seu erro, de um primarismo atroz, é responsabilizar um escritor pelas frases que este colocou na boca de um personagem com o qual não se identifica.

Ou seja, a Emília realmente esculhamba a Tia Nastácia, disparando-lhe pejorativos que o povo sempre usou, mas em nenhum momento Monteiro Lobato lhe dá razão.

Quem quer que tenha lido as aventuras do Sítio do Picapau Amarelo, está careca de saber que Lobato falava pela boca da Dona Benta e do Visconde de Sabugosa, não pela da pirracenta e malcriada boneca de pano.

Espera-se que Cid Gomes se mostre à altura do cargo, rechaçando esta nova investida inquisitorial. Desde que tal questiúncula foi levantada, o então ministro da Educação Fernando Haddad e o ministro do STF Luiz Fux já botaram os patrulheiros cricris pra correr. Mas, como hidras, parece que será preciso cortar-lhes várias cabeças, até que desistam de afrontar nossa Carta Magna.

Pois, lembro mais uma vez, o art. 5º da Constituição Federal estabelece com máxima clareza que "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença". 

Quem tenta introduzir qualquer forma velada de censura está, portanto, na contramão da nossa Lei Maior. Começa muito mal a tal Nilma.

Quanto aos diligentes garimpeiros de pelo em ovo que se autointitulam politicamente corretos, recomendo-lhes que doravante escolham alvos melhores na sua busca sôfrega por holofotes, esquecendo os gigantes como Lobato --não só um escritor notável, mas também um cidadão imbuído dos melhores ideais, que amargou prisão no Estado Novo, perseguições e prejuízos de toda ordem ao defender de peito aberto os valores nacionalistas e revolucionários.

Se tivessem um mínimo de simancol, iriam aporrinhar outros scholars, deixando os combatentes das causas nobres em paz.

Atiro-lhes de novo na cara a 11ª tese de Marx sobre Feuerbach: "Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo".

Ou seja, quando pararem de desperdiçar esforços tentando mudar a forma como as pessoas se referem às coisas do mundo, talvez lhes sobre tempo para fazerem o que realmente importa: mudar o mundo.

9 comentários:

Anônimo disse...

Não entendi o problema na inclusão de notas explicativas no livro. É muito comum notas do tradutor ou do editor, e não descaracteriza a obra, apenas ajuda a contextualizar.

Unknown disse...

Outra coisa, Celso, qual a fonte dessa informação? Dei uma pesquisadinha de 10 minutos e já vi que é furada.

Valmir disse...

quem chama Monteiro Lobato de racista nunca o leu nem tem a menor ideia do que seja racismo...
Negrinha, seu conto mais famoso, é o maior peça antirracista em língua portuguesa. A questão é outra; "a sinistra" o odeia pq o José Bento, justamente por conhece-los muito bem, durante a campanha do petróleo é nosso que culminou com a criação da Petrobrás nunca engoliu suas lorotas. Ele é o melhor conhecedor das mazelas brasileiras e de seus "salvadores"..
por isso nunca embarcou em sua canoa furadíssima..

celsolungaretti disse...

Leonardo,

o que ela queria era imputar racismo a Monteiro Lobato, daí a reação indignada que provocou em nossos melhores intelectuais.

Se não tivesse tal visão distorcida e propusesse notas de rodapé apenas explicando que era comum, naquele tempo, o povão se referir de forma pejorativa aos negros, estaria tudo certo. O problema foi ela não entender que a intenção de Lobato jamais foi a de concordar com as bobagens da Emília.

Quanto à fonte da informação, é esta, que foi destacada na página inicial do UOL: http://www.revoltabrasil.com.br/politica/5571-nova-ministra-da-igualdade-racial-de-dilma-quer-banir-obra-de-monteiro-lobato-por-entender-ser-racista.html

Unknown disse...

Oi, Celso.

Existe uma discussão sobre Monteiro Lobato ter sido racista ou não, com defesa dos 2 lados. Se você pesquisar no Google "Monteiro Lobato Racista", irá encontrar vários resultados sobre isso. Já fiz essa pesquisa há alguns anos. Acho que se você fizer hoje vai ter muito resultado sobre essa ministra poluindo a pesquisa, mas ainda assim vai encontrar fatos sobre a discussão, que é bem antiga.

Agora, temos que ter cuidado com as "notícias" que vemos por aí. O site que você citou, assim como TODOS os outros, deve ter se baseado numa nota da Veja: http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/governo/nova-ministra-foi-autora-de-parecer-que-classificou-obra-de-monteiro-lobato-como-racista/

A notícia quer provocar essas interpretações exageradas. A atual ministra nem sonhava em ser ministra quando foi autora do tal parecer, que é de 2010! Ou seja, não é o caso de uma ministra solicitar o banimento de um livro. No parecer, ela RECOMENDA a retirada (de um livro, não da obra completa), quem fez o pedido não foi ela. E já foi recusado, EM 2012!

É só um caso de "vamos mostrar o que essa mulher já fez na vida dela para conhecê-la melhor". Agora quem lê, como você, acha que ela assumiu esse ministériozinho e já quer promover a censura nas escolas - que é o objetivo dessa notinha da Veja.

celsolungaretti disse...

Leonardo,

sobre autores cuja obra eu cheguei a ler inteirinha, não preciso de nada mais para chegar às minhas conclusões. É o caso dos livros da série do Sítio do Picapau Amarelo.

Neles aprendi que preconceitos raciais e sociais são a maior besteira, e que os homens valem pelo que SÃO não pelo que TÊM.

Foram uma influência poderosa para que eu me tornasse revolucionário. Lá pelos 10 anos, eu já não projetava minha vida apenas em bases materiais. Queria muito mais.

E foi o Lobato que abriu minha cabeça para o fato de que dinheiro, poder, prestígio e fama não são tudo. Preparou-me para o encontro com Marx, adiante.

Então, absolutamente não discuto os livros adultos dele, mas também não admito uma discussão tão tola como esta a respeito dos livros infanto-juvenis. NÃO TÊM NADA, ABSOLUTAMENTE NADA, DE RACISTAS, ponto final.

"Recomendar" o banimento de livros é, sim, obscurantismo e censura. Não estou nem aí para se isto é feito de forma velada ou explícita. O que conta é o ATO em si.

Não me baseei na Veja, mas sim num site menor, cujo post foi reproduzido e destacado pelo UOL. Se a tal Nilma declarar que esta pretensão censória são águas passadas, humildemente eu lhe pedirei desculpas. Até lá manterei tudo o que escrevi.

Abs.

Eduardo Rodrigues Vianna disse...

DE NOVO, ESSA PORRA?!

Lobato é daqueles caras gigantescos que fornecem alpiste à mediocridade mesmo 70 anos após a sua morte. A mediocridade em questão se servirá do fato de isto aqui permanecer um maldito país de analfabeto, exatamente ao contrário do que queria Lobato. Para saber se Lobato era racista ou não, basta ler a sua obra.

Desgraçadamente, isto seria, na maioria dos casos, equivalente a esperar que um elefante voasse, ou que um burro de carteirinha começasse a pensar por conta própria, por exemplo lendo livros, e sem que ninguém dissesse que partido tomar a respeito desse ou daquele autor, ou desse ou daquele texto. Impossível, não é mesmo?

Monteiro Lobato tinha razão: "Gente com alma de sabugo é assim mesmo."

Unknown disse...

Eu não posso acreditar, é incrível, a profecia de Ray Bradbury está sendo cumprida pouco a pouco. Eu li o livro faz um pouco e acho que nos faz refletir. Por certo, faz pouco eu vi que Fahrenheit 451 vai ser lançado como filme na TV. Li que HBO foi o responsável, e acho que seria bom se muitos no Brasil pudessem ver, para perceber que este é o mundo que vamos no futuro. Acho que será um bom filme para refletir. Espero que seja umas das melhores adaptações para ver, a historia é interessante e parece levar um bom ritmo. Se vocês são amantes do livro este é um filme que não devem deixar de ver.

celsolungaretti disse...

Andrea,

esse lado de crítica à sociedade atual deve estar muito mais destacado na versão francesa de 1966, dirigida pelo François Truffaut, do que na atual, que deve puxar mais para o lado da aventura.

Se você souber baixar filme e legenda para assisti-los no computador, eis um bom blog que tem o filme de 1966: http://filmescult.com.br/fahrenheit-451-1966/

Abs.

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