sábado, 31 de maio de 2014

"FRACASSAMOS MISERAVELMENTE EM PUNIR TORTURADORES"

Em sua coluna deste sábado (31) na Folha de S. Paulo (clique aqui para lê-la na íntegra), o articulista Hélio Schwartsman tocou em aspectos importantes sobre os crimes impunes da ditadura militar:
"...trancafiamos criminosos na cadeia para impedir fisicamente que repitam suas malfeitorias e para dissuadir outras pessoas de imitá-los. Quando o tempo transcorrido entre delito e castigo é muito grande, nenhum desses propósitos se aplica mais aos réus. Eles não poderiam sair por aí perseguindo e torturando opositores do regime nem que quisessem, porque a história seguiu seu curso e já não há mais nem regime a defender nem opositores a ameaçá-lo. Também parecem irrisórias as chances de alguém emplacar aqui uma nova ditadura militar.
Mesmo para os que creem em noções mais metafísicas de justiça, é complicado defender punições com mais de 40 anos de atraso. Elas já não atingem os autores dos delitos, mas pessoas totalmente distintas. A essa altura, todos os átomos que compunham o criminoso foram reciclados. As ideias também, espera-se.
A constatação, algo sombria, é que nós, como sociedade, fracassamos miseravelmente em punir torturadores..." 
Schwartsman veio ao encontro de uma posição que sustento desde meados de 2008: o momento da punição dos verdugos da ditadura militar era o da redemocratização, mas a tibieza de sucessivos governos permitiu que a justiça não se fizesse de 1985 até hoje, quando encarcerar ou empobrecer anciães acabaria sendo apenas uma retaliação impiedosa, igualando-nos àqueles que tanto desprezamos. 

Já lá se vão quase seis anos que passei a reivindicar, ao invés da justiça punitiva que deixou de fazer sentido em função de incontáveis omissões e pusilanimidades, a justiça histórica: que o Estado brasileiro desse uma palavra definitiva sobre quem foi criminoso e quais os crimes que cometeu, condenando tais vilões ao opróbrio eterno, além de consagrar categorica e definitivamente o direito que todo cidadão tem de pegar em armas contra tiranias.

Foi o caminho que o saudoso Nelson Mandela apontou: os ogros do apartheid foram perdoados, mas tiveram de admitir seus dantescos crimes diante de toda a nação sul-africana, ficando com o estigma da monstruosidade impresso em suas faces e acrescentado para sempre a seus nomes. Jamais puderam, como fazem os ogros daqui, celebrar efemérides infames, nem tentar justificar para as novas gerações as atrocidades que cometeram. No fundo, tornaram-se párias pelo restante de suas existências e além, até o fim dos tempos. Como nos fez falta um Mandela! 

Com enorme e indesculpável atraso, estamos tentando agora fazer algo nesta linha. Resta saber se o relatório final da Comissão Nacional da Verdade estará à altura da missão histórica de que está incumbida. Há motivos para temermos o contrário:
  • os veteranos da luta armada, que representam o contingente amplamente majoritário de vítimas fatais dos torturadores, ficaram de fora da Comissão porque foi engolida a chantagem da bancada evangélica no Congresso (ameaçou embargar a aprovação da lei que instituía o colegiado);  
  • os guardiães da mentira conduziram até agora as investigações e escavações no Araguaia para onde nada será encontrado, debochando tanto da CNV quanto da decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos;
  • duas testemunhas-chave foram assassinadas sob as barbas da Comissão;
  • a própria decisão governamental de adiar a divulgação do relatório do colegiado para depois da eleição mostra a preponderância das conveniências políticas sobre a justiça histórica (desperdiçou-se a oportunidade única de colocar o festival de horrores dos anos de chumbo em evidência no exato instante em que se completavam os 50 anos da quartelada!!!).
Por último, Schwartsman parece-me estar superestimando uma mera escaramuça: aceitação da denúncia contra os assassinos de Rubens Paiva não assegura que eles venham a ser condenados. Enquanto não for revogada a anistia imposta de 1979, que igualou os carrascos a suas vítimas, a tendência é de as instâncias superiores continuarem rezando por tal cartilha. Nada indica que vá ser este o primeiro processo criminal contra torturadores a transpor a linha de chegada.

Chances reais tem outro, o dos terroristas do Riocentro, porque quase produziram em morticínio em larga escala depois da promulgação da Lei da Anistia, não estando, portanto, cobertos por seu guarda-chuva protetor.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

MALUF DIZ QUE ALIANÇA ENTRE O PT E O PP TEM A BENÇÃO DIVINA

O desprezo pelas convicções e ações dos reacionários não me impede de admirar a verve de uns poucos deles, principalmente quando me fazem dar boas risadas.

Caso do finado corvo Carlos Lacerda, o rei das respostas demolidoras. Quando ele foi propagandear o golpe de 1964 (que os milicos intitularam mentirosamente de revolução) na França, um jornalista de lá, zombeteiro, perguntou: "Por que as revoluções sul-americanas são sempre sem sangue?".

De bate-pronto, Lacerda disse que isto se devia a elas serem idênticas às luas-de-mel francesas. A piada lhe valeu um convite para se escafeder de lá o quanto antes.

Na mesma linha foi a resposta que ele deu a uma deputada populista, em plena Assembléia Legislativa. Ela o atacou: "V. Ex.ª é um purgante!". E ele devolveu: "E V. Ex.ª é o resultado!".

Já o ex-governador Paulo Maluf tem um prazer todo especial em constranger os petistas que, depois de tanto criticarem-no nas últimas décadas, agora vão beijar-lhe a mão em troca de apoio eleitoral e consequente minutinho a mais no horário gratuito. 

Na eleição de 2012, o então candidato Fernando Haddad parecia estar, durante todo o tempo, procurando um buraco no chão para se enfiar.

Já o ex-ministro Alexandre Padilha, aspirante a governador, mostrou-se agora muito mais à vontade. No quesito cara de pau, ele foi aprovado com louvor. 

Talvez por isto Maluf tenha exagera, ao afirmar que a aliança entre o seu PP e o PT "será do tamanho do Corcovado" e "abençoada por Deus".

Cuidado com o castigo divino!

OS TORCEDORES DEVERIAM TER BAIXADO O CACETE NO RONALDO EM 1998?

"A partir do momento em que há vândalos no meio disso, mascarados... A segurança pública tem de conter esses vândalos. Parece que as pessoas acordaram [para os problemas do país], mas acordou todo mundo junto. Ninguém sabe como fazer ou por onde ir. A população tem de protestar sem violência. Nos vândalos, mascarados, tem de baixar o cacete mesmo."

A frase é do ex-jogador Ronaldo Fenômeno, em fase de cabeça de bagre

Já chutara uma bola para fora do estádio ao se dizer envergonhado com a forma como o Brasil se preparou para sediar o Mundial da Fifa... numa montagem de cenário para romper espetacularmente com a presidenta Dilma Rousseff e anunciar apoio ao seu adversário Aécio Neves. Aí o jornalista Juca Kfouri antecipou que era esta a jogada e Ronaldo ficou com cara de bobo. 

Ninguém precisa de pretextos menores para justificar intenção de voto. Deveria escolher candidato levando em conta o que importa: os benefícios e malefícios que cada candidatura trará para o sofrido povo brasileiro.

A nova declaração, além de imbecil (Paulo Coelho acertou na mosca...), foi fascistoide e repulsiva. Equivaleu a um chute tão errado que foi não só para longe do estádio. Foi para fora do Estado. Deve estar chegando em Minas Gerais...

Quando se começa a falar em agredir pessoas ao arrepio da lei, não se pára mais. Lembro-me do meu inconsolável pai em 1998, recomendando o mesmo tratamento para pipoqueiros que, com um ataque de tremedeira, fizessem o Brasil perder uma decisão de Copa do Mundo. 

Hoje se sabe que o alvo de seu desabafo não sofreu a suposta crise de paúra; foi, isto sim, vítima de uma injeção mal aplicada, tendo mesmo entrado em convulsão.

O que não poderemos jamais desculpar é sua atitude de, voltando meio sonado do atendimento médico, ter insistido em entrar em campo sem as mínimas condições para disputar uma partida daquela importância, tão obcecado estava em encher-se de glória.

Como o elenco se dividiu entre a turma do Dunga (que, corretamente, defendia a decisão inicial do técnico Zagallo, de escalar Edmundo) e a patota do Bebeto (que sempre adotava posição contrária à do Dunga), a Seleção começou o jogo com os atletas ruminando rancores e uns não olhando a cara dos outros. Deu no que deu.

Neste sentido, de haver sido o pomo da discórdia que derrotou psicologicamente o escrete antes mesmo de Zidaine fazer o primeiro gol da França, Ronaldo foi, sim, o principal culpado pela goleada humilhante que o Brasil sofreu, um vexame inédito para nós numa final de Copa do Mundo.

Mesmo assim, eu nunca defendi que lhe baixassem o cacete. O coitado do papai estava tão errado então quanto o Ronaldo está agora.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

COMPANHEIRO PEDE AJUDA. E PRECISA!!!

O advogado e blogueiro Fernando Claro Dias, um estimado companheiro que trava o bom combate nas redes sociais, foi levado a situação crítica em função de doença que o incapacitou temporariamente para o exercício da profissão e da intransigência com que seu caso foi tratado pela seção do RJ da Ordem dos Advogados do Brasil, ao não isentá-lo do pagamento das anuidades referentes ao período de inatividade compulsória, o que acabaria inviabilizando a retomada de sua carreira.

Pede ajuda aos cidadãos solidários e compassivos, mediante depósitos na seguinte conta:


Caixa Econômica Federal (banco 104)
Agência 0167
Conta poupança nº 18420-0
Favorecido: Fernando Claro Dias
CPF: 335.237.707-34

Relata sua via crucis nesta longa mensagem, que é bem eloquente quanto aos motivos pelos quais merece, sim, todo apoio que lhe possamos oferecer. 

Fiel ao estilo deste blogue, publicarei apenas os trechos principais, recomendando aos interessados no texto integral que cliquem no link em vermelho do parágrafo acima. 

"Caros amigos, amigas e companheiros,

...sou advogado, formado em 1982, pela UFRJ/Caco. Porém, devido a grave enfermidade em 2004, que se estendeu até 2007, com recidiva em 2009, acabei perdendo a capacidade de trabalhar nos vários escritórios em que prestava meus serviços no estado do Rio de Janeiro.

Escrevi vários e-mails para o presidente da OAB-RJ, de 2007 até 2011, mas o referido presidente não se dispôs a me prestar a solidariedade devida conforme determina o Estatuto da Advocacia, pois cabe à OAB (...) também oferecer defesa jurídica gratuita para os advogados sempre que for necessário, e também cuidar, assistir, aconselhar, orientar, e oferecer ajuda pecuniária, via CAARJ, durante seis meses ou mais, se necessário, além de outras providências tal como providenciar tratamento médico e odontológico adequados para tratamento de depressão, síndrome do pânico, síndrome do cólon irritado, fibromialgia e dor crônica...

...Eu, que durante 20 anos tinha pagado todas as anuidades, senti-me envergonhado e indignado com toda esta situação. Felizmente quitei todo o débito, mas com enorme dificuldade, vendendo sanduíches e doces de porta em porta no Centro de Vitória.

...o nefasto Provimento n. 42/78 da OAB (...) impede o advogado de inscrever-se em qualquer seccional da OAB se não quitar todo seu débito. Detalhe inimaginável e autoritário: se houver parcelamento em 24 vezes somente a partir do pagamento da última parcela, ou seja dois anos, poderá o advogado inscrever-se... Como eu estava com 51 anos só pude me inscrever na OAB-ES em 2011 quando eu tinha 58 anos. Portanto foi quase uma década fora do mercado de trabalho, por obra e graça de uma instituição... que tem... obrigação de prestar auxílio em momentos trágicos como este, ainda mais por eu não ter dado causa, pois não escolhi nem planejei sofrer de depressão e dor crônica.

...Desta forma o advogado em débito, como se estivesse em Roma Clássica, torna-se escravo da credora, no caso a OAB, que existe e se mantêm em razão das anuidades pagas por cerca de 770 mil advogados que (...) conduzem seus escritórios com muitos sacrifícios.

O Provimento n. 42/78 agride frontalmente a Constituição Federal, fere legislações infraconstitucionais, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e fere normas da Organização Internacional do Trabalho eis que o advogado é um trabalhador e o direito ao trabalho não pode ser cerceado sem que haja condenação transitada em julgado.

...Jamais deixei de querer quitar este pequeno débito [R$ 3,5 mil!!!], mesmo enfermo, e assim eu fui pagando minha obrigação até liquidá-la somente em 2011. Portanto fiquei refém da OAB/RJ durante longos 8 anos.

...Qual não foi minha surpresa, terror, pânico e desespero quando tomei conhecimento (...) de que minha inscrição definitiva tinha sido cancelada, mesmo tendo quase 27 anos de regular inscrição, e sem nenhuma anotação que desabonasse minha conduta durante quase três décadas. 

...Diante do cancelamento tornaram-me um não-advogado sem que me notificassem, nem me proporcionassem ampla defesa, contraditório, devido procedimento administrativo, nem foi nomeado advogado para me prestar defesa.

...Assim tive minha vida profissional inviabilizada por este ato bárbaro e inimaginável praticado pela OAB-RJ, sem ter dado justa causa para tal e fiquei proibido de exercer a profissão de advogado, sob pena de (...) incorrer em exercício ilegal da profissão.

...Não vislumbrando outra alternativa para sobreviver aceitei as sinceras sugestões de solidários amigos para criar este movimento que pode me auxiliar a reconstruir minha vida.

...o objetivo da generosa vaquinha seria [a] arrecadação de um mínimo de valor em reais, objetivando me proporcionar acesso a empreendimento próprio no ramo da internet ligado a causas humanitárias, criando um blog profissional, e/ou biblioteca e livraria móvel, e/ou pequeno comércio de alimentos com grande teor de nutrientes bons para a saúde." (Fernando Claro Dias)

segunda-feira, 26 de maio de 2014

CARTA ABERTA À PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF

Sra. Presidenta,

é por acreditar que não seja sua intenção omitir-se diante da grave injustiça perpetrada contra mim que tomo a liberdade de mais uma vez endereçar-lhe um apelo.

A resposta ao anterior, transmitida por um membro do seu Gabinete pessoal, foi a de que a de que a Sra. "lamenta não poder atender seu [meu] pedido por ser o assunto apresentado de competência do Poder Judiciário".

Ora, passei minha vida adulta inteira defendendo os ideais revolucionários e os direitos humanos, o que várias vezes me colocou em contato com as leis e os tribunais, começando pelos quatro processos a que respondi em auditorias militares na última ditadura. E, em termos profissionais, a carreira jornalística também me trouxe razoável familiaridade com os assuntos jurídicos.

Assim, jamais recorreria a uma presidenta da República, mesmo sendo ela ex-companheira de militância, se dar um fim às minhas aflições não fosse plenamente justificável face à gravidade do abuso de poder que estou sofrendo e se isto não estivesse na sua (dela) esfera de competência. Sei muito bem que "conforme determina a Constituição, o chefe do Executivo não pode intervir nas questões de outro poder", não precisando de que ninguém me lembre disto.

Mas, num episódio recente, a Sra. admitiu ao povo brasileiro ter tomado uma decisão questionável por não haver recebido todas as informações pertinentes.  Ouso supor que isto esteja novamente ocorrendo, em meu desfavor.

Ao contrário do que assessores lhe possam ter dito, não é o Poder Judiciário o principal culpado pela aberrante e inaceitável morosidade do meu mandado de segurança  (nº 0022638-94.2007.3.00.0000) --sete anos e três meses de tramitação, sendo que já se passaram três anos e três meses desde que, no julgamento do mérito da questão, todos os oito ministro reconheceram meu direito.

Aliás, chega a ser paradoxal que companheiros petistas se queixem com tamanha indignação e tanta veemência de decisões monocráticas bizarras tomadas no STF,  nas quais eles vislumbram velados intuitos persecutórios, mas nada tenham a dizer da decisão monocrática igualmente bizarra que o novo relator do meu processo no STJ tomou, anulando com uma penada a decisão unânime de seus colegas que julgaram o caso.

Mas, mesmo que fosse também um intuito persecutório o motivo subjacente de tal decisão, ainda assim ela teria sido propiciada por (mais) uma claríssima manobra protelatória da Advocacia Geral da União que, como a Sra. não ignora, faz parte do Poder Executivo.

Ou seja, já lá se vão 39 meses que o cumprimento da sentença do STJ está sendo retardado porque a AGU, obrigada a bater em retirada quanto ao mérito da questão, saiu pela tangente, arguindo uma filigrana jurídica para causar mais delongas, qual seja a de que mandado de segurança não seria o instrumento jurídico adequado. E o novo relator, surpreendentemente, aceitou:
"... analisando-se melhor os autos, percebe-se que o julgado ora embargado, ao contrário do que se registrou, olvidou-se da existência de consolidado entendimento nesta Corte Superior, com arrimo no enunciado 269 da Súmula de Jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal, no sentido de que o Mandado de Segurança não pode ser utilizado como mero substitutivo de Ação de Cobrança" (decisão monocrática do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em 15/08/2012).
Com isto, ele não só desautorizou os oito ministros que tiveram entendimento diferente, como cometeu a incorreção de alegar que havia sido olvidada uma questiúncula que, na verdade, a AGU já havia submetido ao relator anterior, Luis Fux, sendo por este fulminada em 19/10/2007:
"A determinação para que a autoridade coatora, in casu, o Ministro de Estado do Planejamento e Gestão, cumpra a requisição do Ministro da Justiça no sentido de efetuar o pagamento dos retroativos a anistiado político, não atrai a incidência das Sumulas n.ºs 269 e 271, do STF, porquanto, aqui, não se trata de utilizar-se do mandado de segurança como substituto da ação de cobrança, mas, tão-somente, de determinar o cumprimento de ato administrativo legal e legítimo".
E por que a AGU, na sua inexplicável insistência em postergar indefinidamente o pagamento do que é justo e devido para mim, recorre a alegações periféricas e evasivas, inclusive reapresentando-as depois de já terem sido categoricamente rechaçadas? Simplesmente porque, quanto ao fulcro da questão, não tem nada, absolutamente nada, para contrapor à sentença de 23/02/2011.

A Lei nº 10.559, de 13/11/2002, estabelecera o seguinte:
Art. 18.  Caberá ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão efetuar, com referência às anistias concedidas a civis, mediante comunicação do Ministério da Justiça, no prazo de sessenta dias a contar dessa comunicação, o pagamento das reparações econômicas, desde que atendida a ressalva do § 4o do art. 12 desta Lei.
§ 4o  As requisições e decisões proferidas pelo Ministro de Estado da Justiça nos processos de anistia política serão obrigatoriamente cumpridas no prazo de sessenta dias, por todos os órgãos da Administração Pública e quaisquer outras entidades a que estejam dirigidas, ressalvada a disponibilidade orçamentária.
A decisão do ministro da Justiça, em 30/09/2005, foi:
"Declarar Celso Lungaretti anistiado político, concedendo-lhe reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada (...), com efeitos retroativos da data do julgamento em 27.07.2005 a 29.10.1996, totalizando 104 (cento e quatro) meses e 28 (vinte e oito) dias, perfazendo um total indenizável de..."
No início de 2007, 16 meses depois, eu ainda não havia recebido a indenização retroativa que deveria ter sido paga em 60 dias, daí minha decisão de impetrar mandado de segurança para que fosse cumprida a lei e a decisão ministerial.

Logo em seguida, a União enviou carta convidando-me a abdicar voluntariamente do direito ao pagamento imediato dos atrasados, aceitando voluntariamente seu parcelamento até o final de 2014. Como o meu mandado já tramitava e como este direito não fora esmola nenhuma, mas sim o justo ressarcimento do sangue que me derramaram, dos terríveis tormentos físicos e psicológicos que sofri, da lesão permanente que me causaram e da honra que me atingiram, eu optei por não desistir voluntariamente do processo já aberto.

É óbvio que, como a legislação não fora alterada, a Justiça necessariamente teria de mandar que a Lei fosse cumprida, como mandou.

E é chocante que a AGU use todo seu poder de fogo, infinitamente superior, contra mim, para evitar que uma decisão judicial seja cumprida. Pois ela tem um compromisso com a Justiça no sentido maior da palavra; não existe apenas para vencer a qualquer preço ou protelar o cumprimento de sentenças desfavoráveis arguindo ninharias, como fazem os advogados de porta de xadrez.

Então, Sra. presidenta, sua intervenção se impõe para pôr fim a esta nova via crucis, quando sou novamente vítima das burocracias arrogantes, arbitrárias e insensíveis, como já o fora quando requeri minha anistia na década passada e, embora o critério primeiro da priorização dos processos (desemprego) me beneficiasse, só comecei a receber minha pensão depois de exatos 50 meses, tendo de mover céus e terras para tanto, enquanto os amigos do rei e os famosos, mesmo não preenchendo as condições necessárias para terem seus casos priorizados, eram atendidos em menos de um ano.

Será vergonhoso para a União e contraditório com a política de direitos humanos dos últimos quatro governos se eu morrer sem ter sido ressarcido das violências cometidas por agentes do Estado em 1970 (!!!). Quarenta e quatro anos estão se completando. Quantos mais precisarei esperar? Terei de ser eterno para ver honrarem o crédito pendente desde 2005? 

Confiante em que o espírito de Justiça inspirará vossa decisão, subscrevo-me,

atenciosamente,

CELSO LUNGARETTI

domingo, 25 de maio de 2014

O EPISÓDIO 'PASTOR x XUXA' FOI COMO UM SPAGHETTI-WESTERN: SÓ TEVE VILÕES.

Xuxa promovendo o filme que, mais tarde, ela moveria céus e terras para tirar de circulação... 
O episódio pastor x Xuxa não vale grande coisa em si, mas a reação de analistas e comentaristas nas redes sociais me chamou a atenção para um problema recorrente: o maniqueísmo com que, cada vez mais, as pessoas se posicionam sobre qualquer assunto. 

Já não existe avaliação crítica, mas sim torcida. Numa pendenga dessas, reagem como se estivessem assistindo a um filme de mocinho e bandido, só variando o entendimento de quem seja o herói e quem seja o vilão. Quanto simplismo! Quanto primarismo!

Tirando os evangélicos, com sua fé cega em valores morais que refletem outro estágio de civilização (há quase dois milênios superado!!!), pouquíssimos embarcaram na cruzada rancorosa do pastor. 

Fiquei pasmo, contudo, ao constatar que a rejeição ao óbvio espantalho implicou aprovação do vale tudo para subir na vida característico de Xuxa Meneghel.

Quando aceitou aparecer pelada num filme no qual sua personagem seduzia um menor, Xuxa não era nenhuma miserável roubando pão para saciar a fome, mas sim uma jovem aspirante ao estrelato. As filmagens ocorreram em 1979, quando ainda não iniciara o namoro com Pelé, que lhe deu notoriedade instantânea; tanto que, naquele ano de 1980, suas fotos apareceriam na capa de mais de 80 revistas.

A partir daí ela poderia, claro, ter feito uma carreira recatada, mas optou por exibir sua anatomia também em revistas masculinas, com destaque para a Playboy de dezembro de 1982 (!).

Donde se conclui que, tanto em 1979 como em 1982, ela fê-lo porque qui-lo, como diria o folclórico político Jânio Quadros. 

Mas, sua carreira tomou outra direção e, ao invés de sexy star, ela se tornou rainha dos baixinhos. Aí, temendo o estrago que o lançamento de Amor Estranho Amor em VHS poderia causar em sua nova imagem, Xuxa não hesitou um segundo: correu aos tribunais para esconder debaixo do tapete o que havia de potencialmente perigoso no seu passado. 

ESTA, SIM, FOI UMA POSTURA PRA LÁ DE CONDENÁVEL! Ou nada havia de errado em ela ter aparecido nua e mantendo relações sexuais com um menor no filme de Walter Hugo Khouri, não se justificando, portanto, que se esforçasse tanto para evitar sua comercialização em vídeo (poderia, isto sim, pleitear uma participação na receita auferida, já que se tornara chamariz de vendas); ou se tratava mesmo de algo degradante, e aí o pastor estaria certo na sua catilinária. 

Enfim, entre o moralismo rançoso de um e a moral de conveniência da outra, fico com nenhum(a). Para mim, ao invés de um filme estadunidense de mocinho e bandido, o que vimos foi um bangue-bangue à italiana, daqueles em que todos são vilões.

A minha posição é outra. Sou totalmente contra qualquer tipo de censura, tanto a exercida pelo Estado quanto a que particulares tentam exercer. Ainda mais quando o fazem por motivos menores, egoístas e calculistas. 

Para terminar, um detalhe pitoresco: apesar (ou por causa) de todos os esforços da Xuxa para tirar Amor Estranho Amor das prateleiras de lojas e locadoras, as cópias piratas jamais deixaram de circular e trata-se hoje de um dos filmes mais baixados na internet, tanto na sua versão light para o mercado brasileiro, quanto na bem mais pesada (embora ainda softcore) destinada aos espectadores dos EUA, com o acréscimo de 23 minutos. Vários blogues brasileiros de filmes a disponibilizam.

Ela tentou embargar o filme também no mercado de vídeo estadunidense, mas a Justiça de lá mandou-a passear...
Obs.: sobre o mesmo assunto, leia também XUXA É: a) PORNÓGRAFA; b) PEDÓFILA; c) AMBOS; d) NEM UMA COISA, NEM OUTRA (clique p/ abrir).

sábado, 24 de maio de 2014

JUSTIÇA DECIDE QUE HAVIA "FUNDAMENTO DE FATO" PARA MARIN SER CHAMADO DE DEDO DURO E LADRÃO DE MEDALHA

O juiz José Zoéga Coelho, do Fórum da Barra Fimda, decidiu que o jornalista Juca Kfouri, neste artigo de julho de 2013, não cometeu crime contra a honra do presidente da CBF, José Maria Marin, ao atribuir ao dito cujo "os cabelos brancos manchados pelo dedo duro, pelo elogio ao torturador, pela medalha surrupiada, o gato disfarçado e o terreno público apropriado sem cerimônia".

Segundo o magistrado, "nenhuma das críticas desferidas contra o querelante [Marin] estava destituída de um mínimo fundamento de fato".

O dedo duro se refere ao fato de ter sido Marin um dos deputados que criticaram a orientação supostamente esquerdista do Departamento de Jornalismo da TV Cultura às vésperas da incursão do DOI-Codi contra os profissionais da emissora, da qual resultou o assassinato de Vladimir Herzog.

O torturador repulsivamente elogiado em pronunciamento na Câmara Federal foi o delegado Sérgio Paranhos Fleury, tocaieiro de Carlos Marighella.

A medalha surrupiada pertencia a um garoto que venceu a Copa São Paulo de Futebol Júnior. E por aí vai.

Um sapo que Marin vai ter de engolir é o juiz haver passado recibo de que inexistiu, por parte de Kfouri, "deliberado propósito de falsear ou distorcer qualquer fato". O meritíssimo matou a cobra e mostrou o pau:
"A questão da medalha foi fartamente divulgada pela mídia em geral, inclusive televisiva. A proximidade do querelante com o regime militar é fato absolutamente notório. Mais não seria necessário dizer que o querelante exerceu mandato parlamentar por partido político governista ao tempo do mencionado regime. E desde sempre se soube que o referido regime empregou violência contra seus opositores. Isto é fato mais que notório. É fato histórico.
A existência da errada instalação elétrica em apartamento de propriedade do querelante, em prejuízo do vizinho, foi confirmada por testemunhas idôneas. E, finalmente, a apropriação de área pública, ainda que indiretamente, estava relacionada de alguma forma com terreno de propriedade do querelante".

Ora, se tudo isto é verdade, como poderá o sr. José Maria Marin posar de autoridade máxima do futebol brasileiro ao longo de um Mundial da Fifa?

Ele vai, isto sim, matar de vergonha os brasileiros decentes. Vai nos fazer passar por desmemoriados e despudorados. Vai nos tornar motivo de opróbrio aos olhos do mundo inteiro. Por conta da pusilanimidade de quem, em tempo hábil, não moveu uma palha para evitar que tal tal ignomínia se consumasse.

Valha quanto valer, eu deixo aqui registrado meu mais veemente e indignado protesto.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

VEJA "PINK FLOYD - THE WALL", O MELHOR FILME INSPIRADO POR ÁLBUNS ROQUEIROS

Álbuns de rock que vão relatando uma história ao longo de todas as suas faixas existem vários, o melhor deles sendo Tommy, do conjunto britânico The Who. Mas, o superestimado diretor Ken Russell não foi feliz ao transpô-lo para as telas, excedendo-se em extravagâncias bizarras e perdendo de goleada para a versão cinematográfica de The Wall, do Pink Floyd, criada por Alan Parker em 1982, com destaque para o excelente uso complementar de animações: é o filme para ver no blogue desta 6ª feira, integral e legendado.

As canções mostram a via crucis pessoal de um órfão de guerra (Bob Geldof), cuja mãe é superprotetora e o predispõe a relacionar-se com mulheres castradoras pela vida adentro. Na construção de sua personalidade domesticada, destaque para a influência massacrante da educação, enfocada na melhor de todas as canções "Another brick in the wall".

Finalmente, o personagem problemático se torna ídolo de rock -só que a indústria cultural se apropriou do ritmo, com a música passando a cumprir uma função cada vez mais fascistoide, tanto que o concerto mostrado assemelha-se propositalmente a uma concentração do Partido Nacional-Socialista. 

Recomendo a leitura de uma excelente exegese do disco e do filme, de autoria de Fábio S. Ribeiro, que pode ser acessada aqui. Recupera a profundidade na análise interpretativa de obras de arte, que era habitual nos idos de 1968 e ahora, no más. Hoje, o que passa por crítica não vai além de um press-release um pouco menos óbvio.

O álbum duplo de The Wall teve um significado especial para mim: foi enfocado na primeira análise que escrevi para a revista Música, abrindo caminho para uma carreira de cinco anos como crítico de rock e editor de publicações a ele referentes. Já naquela época eu o considerei um trabalho muito forte, mas com excesso de autocomiseração por parte do baixista, compositor e co-vocalista Roger Waters. 

Particularmente, não gosto da postura de "esse mundo cruel não me entende"; parece-me coisa de adulto mal resolvido, com infantilidade encruada. Mas, as letras levantam questões realmente importantes do nosso tempo e o filme tem muito impacto. Recomendo.

A versão legendada em português não está mais no
Youtube, só restou esta com legendas em espanhol.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

XUXA É: a) PORNÓGRAFA; b) PEDÓFILA; c) AMBOS; d) NEM UMA COISA, NEM OUTRA

deputado Pastor Eurico bateu pesado na apresentadora Xuxa Meneghel nesta 4ª feira (21), quando se discutia na Câmara Federal a chamada Lei da Palmada, que estabelece punições para os pais que espancarem filhos.

Acusou-a de ter protagonizado em 1982 "a maior violência contra as crianças, quando fez um filme pornô". E acabou sendo destituído da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara pelo próprio partido, o PSB.

Tecnicamente, filme pornô é aquele que tem cenas de sexo explícito, o que não é o caso desta fita erótica do diretor Walter Hugo Khouri. Em Amor estranho amor, Xuxa, antes de virar a rainha dos baixinhos, fez o papel de sedutora de um menor -e, com a mesma hipocrisia dos defensores da censura de biografias (que acabam de sofrer derrota acachapante e definitiva), adiante moveu céus e terras para impedir que fosse comercializado em VHS, pois não condizia com a imagem que a TV dela fabricou.

O hoje quarentão Marcelo Ribeiro, que tinha 12 anos ao contracenar com Xuxa, trombeteou depois que tinha ereções durante tais filmagens (vide aqui), a ponto de a atriz Kate Lyra haver se queixado. É difícil de acreditar, parece mais declaração sob medida para produzir sucesso de escândalo.

Nessa mesma época, eu fui contratado por uma revista masculina para cobrir exatamente uma noitada de trabalho do Khouri filmando cenas eróticas (em Convite ao prazer, 1980). O que constatei foi labuta estafante e nada excitante, com um monte de gente olhando e a repetição obsessiva dos mesmos gestos, captados de diferentes ângulos, pois Khouri sempre foi pra lá de perfeccionista. Ninguém se assanhou, em momento nenhum. E, numa situação dessas, o mais provável é que um garoto sentisse constrangimento, não tesão.

De qualquer forma, a violência de que hoje ele se queixa é bem outra: o de que a polêmica em torno do processo que a Xuxa abriu contra a produtora ter-lhe fechado todas as portas como ator e modelo.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

IMPERDÍVEL: VÍDEO E LETRA DE UMA OBRA-PRIMA DA MÚSICA DE PROTESTO CHILENA

A Cantata Santa Maria de Iquique foi uma das culminâncias da Nueva Canción Chilena -movimento musical inspirado por Violeta Parra, que aglutinou artistas como Víctor Jara, Patricio Manns, Isabel Parra, Ángel Parra, Osvaldo Gitano Rodríguez, Tito Fernández e os grupos Quilapayún, Inti-Illimani, Illapu e Cuncumén. 

Lançado na segunda metade da década de 1960, durou até o pinochetazo de setembro de 1973. Tinha como características básicas a opção pelas raízes musicais chilenas e o engajamento político. 

Composta em 1969 pelo músico Luis Advis, esta cantata popular (que reconstitui o bestial massacre de 3,6 mil trabalhadores por parte do exército chileno, em 1907) correu mundo, na primorosa interpretação do conjunto Quilapayún.

Lembro-me da emoção com que a ouvi pela primeira vez, em meados dos '70, na rádio Cultura FM. Não parei mais de tocar a gravação meio tosca que fiz, ligeiro no gatilho, ao perceber do que se tratava pela introdução do locutor. 

No início dos '80, quando a nossa ditadura entrava na fase de despotismo esclarecido, a gravadora Copacabana pôde, finalmente, lançar as principais obras dessa corrente, inclusive a cantata. Foi um prato cheio para mim, que simpatizara muito com o governo de Allende, horrorizara-me com o golpe sanguinário de Pinochet e tinha (tenho) um bom amigo chileno, que me contava mil detalhes sobre os artistas e a política do seu país.

Victor Jara sempre me pareceu o Geraldo Vandré chileno, seja pelo estilo das composições, pela empostação de voz que nos deixava uma impressão de total sinceridade, e também pelo fim trágico de ambos (um morto fisicamente, o outro espiritualmente).

Já o Angel Parra me decepcionou, mas não por culpa dele. Como só tomei conhecimento do seu dilacerante disco de 1976, Angel Parra de Chile, (ouça-o aqui) quando a Copacabana o lançou (uns cinco anos depois), fiquei com a imagem dele como um homem sofredor e amargurado.

Aí ele veio ao Brasil e eu o conheci numa festa. Brincalhão, pândego, dava em cima de todas as meninas. Perguntei-lhe sobre seu disco do exílio e ele respondeu que eram águas passadas, não adiantava ficar remoendo aqueles dramas para sempre.  No momento, fiquei chocado. Depois, refletindo melhor, dei-lhe razão.

É enorme a minha satisfação em disponibilizar este vídeo e a belíssima letra integral da Cantata Santa Maria de Iquique.


1. Pregão: Señoras y señores
Señoras y señores,
venimos a contar,
aquello que la historia
no quiere recordar.

Paso en el norte grande,
fue Iquique la ciudad,
1907 marco fatalidad,
aya al pampino pobre
mataron por matar,
aya al pampino pobre
mataron por matar.

Seremos los hablantes,
diremos la verdad,
verdad que es muerte amarga
de obreros del salar.

Recuerden nuestra historia
de duelo sin perdón,
por mas que el tiempo pase
no hay nunca que olvidar.

Ahora les pedimos que pongan atención,
ahora les pedimos que pongan atención.

2. Prelúdio instrumental

3. Relato: Si contemplan la pampa y sus rincones
Si contemplan la pampa y sus rincones verán las sequedades del silencio, el suelo sin milagro y oficinas vacías como el último desierto. Y si observan la pampa y la imaginan en tiempos de la industria del salitre, verán a la mujer y al figón mustio, al obrero sin cara, al niño triste. También verán la choza mortecina, la vela que alumbraba su carencia, algunas calaminas por paredes y por lecho los sacos y la tierra. También verán castigos humillantes, un cepo en que fijaban al obrero por días y por días contra el sol, no importa si al final se iba muriendo. La culpa del obrero muchas veces era el dolor ambiguo que mostraba rebelión impotente, una insolencia! La ley del patrón rico es ley sagrada. También verán el pago que les daban; dinero no veían, solo fichas, una por cada día trabajado y aquella era cambiada por comida. Cuidado con comprar en otras partes! De ninguna manera se podía, aunque las cosas fuesen mas baratas; lo había prohibido la oficina. El poder comprador de aquella ficha había ido cambiando con el tiempo, pero el mismo jornal seguían pagando. Ni por nada del mundo un aumento! Si contemplan la pampa y sus rincones, verán las sequedades del silencio. Y si observan la pampa como fuera, sentirán destrozados los lamentos.

4. Canção: El sol en desierto grande
El sol en desierto grande
y la sal que nos quemaba,
el frió en las soledades,
camanchaca y noche larga,
el hambre de piedra seca
y quejidos que escuchaban,
la vida de muerte lenta
y la lagrima soldada,
las casas desposeídas
y el obrero que esperaba,
al sueño que era el olvido,
solo espina postergaba,
el viento en la pampa inmensa
nunca mas se terminara,
dureza de sequedades,
para siempre sequedades,
salitre lluvia bendita,
se volvía la palpada,
la pampa pan de los días,
cementerio y tierra amarga.

Seguía pasando el tiempo
y seguía historia mala
de sequedades,
para siempre, sequedades,
El sol en desierto grande
y la sal que nos quemaba,
el frió en las soledades,
camanchaca y noche larga,
el hambre de piedra seca
y quejidos que escuchaban,
la vida de muerte lenta
y la lagrima soldada.

5. Interlúdio instrumental

6. Relato: Se había acumulado mucho daño
Se había acumulado mucho daño, mucha pobreza, muchas injusticias. Ya no podían mas y las palabras tuvieron que pedir lo que pedían. A fines de 1907 se gestaba la huelga en San Lorenzo y, al mismo tiempo, todos escuchaban un grito que volaba en el desierto. De una a otra oficina, como ráfagas, se oían las protestas del obrero. De una a ora oficina los señores, el rostro indiferente o el desprecio. Que les puede importar la rebeldía de los desposeídos, de los parias? Ya pronto volverán arrepentidos; el hambre los traerá, cabeza agacha. Que hacer entonces, si nadie escucha? Hermano con hermano preguntaban. Es justo lo pedido y es tan poco. Tendremos que perder las esperanzas? Así, con el amor y el sufrimiento, se fueron aunando voluntades. En un solo lugar comprenderían: habia que bajar al puerto grande.

7. Canción: Vamos mujer
Vamos mujer, partamos a la ciudad.
Todo será distinto, no hay que dudar.
No hay que dudar, ya vas a ver,
porque en Iquique todos van a entender.

Toma mujer, mi manta te abrigara,
ponte al niñito en brazos no llorara.
No llorara, confía, va a sonreír.
Le cantaras un canto, se va a dormir.

Que es lo que pasa? Dime, no calles mas.

Largo camino tienes que recorrer,
atravesando cerros, vamos mujer.
Vamos mujer, confía, que hay que llegar,
en la ciudad podremos ver todo el mar.

Dicen que Iquique es grande como un salar,
que hay muchas casas lindas, te gustaran.
Te gustaran, confía, como que hay Dios.
Haya en el puerto todo va a ser mejor.

Que es lo que pasa? Dime, no calles mas.

Vamos mujer, partamos a la ciudad.
Todo será distinto, no hay que dudar.
No hay que dudar, ya vas a ver,
porque en Iquique todos van a entender.

8. Interlúdio instrumental

9. Relato: Del quince al veintiuno
Del 15 al 21 mes de diciembre se hizo el largo viaje por las pendientes. 26.000 bajaron, o tal vez mas, silencios gastados en el salar. Iban bajando ansiosos. Iban llegando los miles de la pampa, los postergados. No mendigaban nada, solo querían respuesta a lo pedido, respuesta limpia. Algunos en Iquique los comprendieron y se unieron a ellos: eran los gremios. Y solidarizaron los carpinteros, los de la maestranza, los carreteros, los pintores y sastres, los jornaleros, lancheros y albañiles, los panaderos, gasfiteros y abasto los cargadores. Gremios de apoyo justo, de gente pobre. Los señores de Iquique tenían miedo. Era mucho pedir ver tanto obrero! El pampino no era hombre cabal, podía ser ladrón, asesinar. Mientras tanto las casas eran cerradas, miraban solamente tras las ventanas. El comercio cerro también sus puertas. Había que cuidarse de tanta bestia! Mejor que los juntaran en algún sitio, si andaban por las calles era un peligro.

10. Interlúdio cantado: se han unido com nosotros
Se han unido con nosotros 
compañeros de esperanza 
y los otros, los mas ricos, 
no nos quieren dar la cara. 

Hasta Iquique nos hemos venido, 
pero Iquique nos ve como extraños, 
nos comprenden algunos amigos 
y los otros nos quitan la mano. 

Se han unido con nosotros 
compañeros de esperanza 
y los otros, los mas ricos, 
no nos quieren dar la cara, 
no nos quieren dar la cara.

11. Relato: El sitio al que los llevaban
El sitio al que los llevaban era una escuela vacía y la escuela se llamaba Santa Maria. Dejaron a los obreros, les dijero con sonrisa que esperarán solo unos días. Los hombres se confiaron, no les faltaba paciencia, ya que habían esperado la vida entera. 7 días esperaron, pero que infierno se vuelven cuando el pan se esta jugando con la muerte! Obrero siempre es peligro, precaverse es necesario. Así, el estado de sitio fue declarado. El aire trajo un anuncio, se oía tambor ausente. Era el día 21 de diciembre.

12. Canção: Soy obrero pampino y soy
Soy obre, soy obrero pampino y soy
tan revie, tan reviejo como el que mas
y comien y comienza a cantar mi voz
con temo, con temores de algo fatal.

Lo que sien,lo que siento en esta ocasión,
lo tendré, lo tendré que comunicar,
algo tri, algo triste va a suceder,
algo horri, algo horrible nos pasara.

El desie, el desierto me ha sido infiel,
solo tie, solo tierra cascada y sal,
tierra amar, tierra amarga de mi dolor,
roca tris, roca triste de sequedad.

Ya no sien, ya no siento mas que mudez
y agoni y agonía de soledad,
solo rui, solo ruinas de ingratitud
y recue, y recuerdos que hacen llorar.

En la vi, en la vida no hay que temer,
lo aprendí, lo aprendido ya con la edad,
pero aden, pero adentro siento un clamor
y que aho, y que ahora me hacen temblar.

Es la mue, es la muerte que surgirá,
galopan, galopando en la oscuridad,
por el mar, por el mar aparecerá,
ya soy vie, ya soy viejo y se que vendrá.

13. Interlúdio instrumental

14. Relato: Nadie diga palabra que llegará
Nadie diga palabra, que llegara un noble militar, un general! El sabrá como hablarles, con el cuidado que trata el caballero a sus lacayos. El general ya llega con mucho boato y muy bien precavido con sus soldados. Las ametralladoras están dispuestas y estratégicamente rodean la escuela. Desde el balcón, les habla con dignidad. Esto es lo que les dice el general: que no sirve de nada tanta comedia; que dejen de inventar tanta miseria; que no entienden deberes, son ignorantes; que perturban el orden, son maleantes; que están contra el país, son traidores; que roban a la patria, son ladrones; que han violado a mujeres, son indignos; que han matado a soldados, son asesinos. Que es mejor que se vayan sin protestar, que aunque pidan y pidan, nada obtendrán. Vayan saliendo entonces de ese lugar, que, si no acatan ordenes, lo sentirán! Desde la escuela, el rucio, obrero ardiente, responde sin vacilar, con voz valiente: "Usted, señor general, no nos entiende. Seguiremos esperando, así nos cueste. Ya no somos animales, ya no rebaños. Levantaremos la mano, el puño en alto, vamos a dar nuevas fuerzas con nuestro ejemplo y el futuro lo sabrá, se lo prometo. Y si quiere amenazar, aquí estoy yo. Dispárele a este obrero al corazón!" El general, que lo escucha, no ha vacilado: con rabia y gesto altanero, le ha disparado. Y el primer disparo es orden para matanza y así comienza el infierno con las descargas.

15. Canção-litânia: Murieron tres mil seiscientos
Murieron 3.600, uno tras otro.
3.600 mataron, uno tras otro.

La escuela Santa Maria vio sangre obrera,
la sangre que conocía solo miseria.
Serian 3.600 ensordecidos
y fueron 3.600 enmudecidos.

La escuela Santa Maria fue el exterminio
de vida que se moría solo alaridos,
3.600 miradas que se apagaron,
3.600 obreros ¡asesinados!

Un niño juega en la escuela Santa Maria,
si juega a buscar tesoros ¡que encontraría!

16. Canção: A los hombres de la pampa
A los hombres de la pampa, que quisieron protestar,
los mataron como perros, porque había que matar.
No hay que ser pobre, amigo, es peligroso.
Ser pobre amigo, es peligroso.
No hay ni que hablar, amigo, es peligroso.
No hay ni que hablar, amigo, es peligroso.

Las mujeres de la pampa se pusieron a llorar
y también las matarían, porque había que matar.
No hay que ser pobre, amiga, es peligroso.
Ser pobre amiga, es peligroso.
No hay que llorar, amiga, es peligroso.
No hay que llorar, amiga, es peligroso.

Y a los niños de la pampa, que miraban, nada mas.
También a ellos los mataron, porque había que matar.
No hay que ser pobre, hijito, es peligroso.
Ser pobre, hijito, es peligroso.
No hay ni que nacer, hijito, es peligroso.
No hay ni que nacer, hijito, es peligroso.

Donde están los asesinos, que mataron por matar?
Lo juramos por la tierra, los tendremos que encontrar!
Lo juramos por la vida, los tendremos que encontrar!
Lo juramos por la muerte, los tendremos que encontrar!
Lo juramos, compañeros, ese día llegara!

17. Pregão: Señoras y señores
Señoras y señores, aquí termina 
la historia de la escuela Santa Maria. 

E ahora, con respeto, les pediría 
que escuchen la canción de despedida.

18. Canção final: Ustedes que ya escucharon
Ustedes que ya escucharon 
la historia que se contó,
no sigan allí sentados, 
pensando que ya paso.

No basta solo el recuerdo, 
el canto no bastara.
No basta solo el lamento, 
miremos la realidad.

Quizás mañana o pasado 
o bien en un tiempo,
la historia que han escuchado
de nuevo sucederá.

Es chile un país tan largo, 
mil cosas pueden pasar
si es que no nos preparamos, 
resueltos para luchar.

Tenemos razones puras, 
tenemos porque pelear,
tenemos las manos duras, 
tenemos porque ganar.

Unámonos como hermanos, 
que nadie nos vencerá.
Si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr!

La tierra será de todos, 
también será nuestro el mar,
justicia habrá para todos 
y habrá también libertad.

Luchemos por los derechos 
que todos deben tener.
Luchemos por lo que es nuestro, 
que nadie vas a ceder.

No hay que ser pobre, amigo, es peligroso. 
Ser pobre, amigo, es peligroso. 
No hay ni que hablar, amigo, es peligroso.
Hablar, amigo, es peligroso.

Unámonos como hermanos, 
que nadie nos vencerá.
Si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr!

La tierra será de todos, 
también será nuestro el mar,
justicia habrá para todos 
y habrá también libertad.

Luchemos por los derechos 
que todos deben tener,
luchemos por lo que es nuestro,
que nadie vas a de ser.

Unámonos como hermanos, 
que nadie nos vencerá.
Si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr!

La tierra será de todos, 
también será nuestro el mar,
justicia habrá para todos 
y habrá también libertad.

Luchemos por los derechos 
que todos deben tener,
luchemos por lo que es nuestro,
que nadie vas a de ser.

Unámonos como hermanos, 
que nadie nos vencerá.
Si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr!

Si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr!
si quieren esclavizarnos, 
jamás lo podrán lograr! 
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